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Hospital Colônia Adauto Botelho (HCAB) do Estado do Paraná: manicômio ineficiente?
Único hospital psiquiátrico da Secretaria
Estadual de Saúde do Estado do Paraná (89
leitos disponíveis (habilitados 160
no CNES/DATASUS?), trata-se hoje de uma estrutura que tem sido cada vez mais priorizado
com aporte de pessoal, equipamentos e recursos em geral, mas é bastante
questionável o efeito disso em assistência à população do Estado. Considerando a ocupação desses leitos, a máxima taxa de ocupação, seg. o MS, a relação percentual entre o número
de pacientes-dia, em determinado período, e o número de leitos-dia no mesmo
período, não passaria de 50 %.
Atualmente conta com 280 funcionários, 76 terceirizados e
204 concursados. Na última gestão local criou-se 2 novos cargos: um de diretoria e um de apoio
administrativo. O hospital recebeu recentemente um grande número de
funcionários, exceto médicos. Quanto a estes últimos, os novos, que chegaram
nos últimos anos, já saíram; e os médicos mais antigos estão se aposentando.
Portanto o atendimento médico é uma fragilidade evidente.
Atualmente o HCAB conta com 4 unidades:
Unidades
|
Público alvo
|
Leitos
|
Observações
|
Assistida
|
Pacientes crônicos
e idosos
|
19
|
só atende
uma população que vem diminuindo gradativamente.
|
1M
|
Pacientes masculinos
com transtornos mentais
|
30
|
Aberta a
internamentos.
|
2F
|
Pacientes femininas
com transtornos mentais
|
30
|
Aberta a
internamentos.
|
“Flor de Liz”
|
Álcool e
drogas feminina
|
10
|
· Nova, representa a
“novidade” desta gestão;
· Sempre com 5 a 7 leitos ocupados, não internando-se
mais, pois suas vagas são reguladas pela Direção Geral do HCAB;
|
TOTAL
|
|
89
|
· Habilitados 160 no CNES/DATASUS?
|
O hospital conta com cobertura de plantão médico de 24 horas, com duas
escalas independentes: uma equipe diurna e outra noturna, que dão conta de
internamentos e precisam cobrir, também, intercorrências nas unidades, mesmo no
período diurno e durante a semana. Com a falta de médicos os psiquiatras responsáveis
por cada unidade também fazem alguns plantões noturnos, e com isso complementam
sua carga horária em atividades não dirigidas à assistência integral em suas
respectivas unidades, pois tal modelo restringe sua permanência nas mesmas. A
título de exemplo, um dos psiquiatras atende hoje, ao mesmo tempo, em 2 unidades,
acumulando também um cargo diretivo no Centro
Psiquiátrico Metropolitano (CPM) do Estado, comparecendo ao hospital
somente 2 vezes por semana (mediante acordo com a direção local).
Portanto não há longitudinalidade no modelo assistencial do HCAB, se é que se
pode falar em “modelo assistencial”, pois a gestão não cria condições para um
trabalho multiprofissional efetivo, continuado e com elaboração de projetos
terapêuticos, o que reafirma o antigo modelo manicomial advindo da tradição do
hospital (houveram iniciativas de renovação assistencial no passado, com
resignificação deste equipamento na RAPS paranaense, como a saudosa “casa de
passagem”, mas atualmente não há movimentos nesse sentido).
A unidade “Flor de Liz”, de risível
capacidade para um equipamento estadual e além disso baixíssima taxa de
ocupação, tem a equipe numericamente mais completa do hospital e que hoje conta
com regras especiais de trabalho: há nítida discriminação dos outros servidores
do hospital, mais antigos, e também proibição para o acionamento dos técnicos
dessa unidade para cobertura de intercorrências das demais unidades. A hipótese
de tal “blindagem” da nova equipe parece estar relacionada a uma aparente
insegurança da mesma nas ações assistenciais. É óbvio que ninguém concorda com
a perpetuação de antigas práticas manicomiais, mas desprezar a experiência
técnica e de vida de servidores que trabalharam tantos anos com álcool e drogas
é, no mínimo, um erro, e tem gerado importante descontentamento interno.
É importante lembrar que unidade “Flor
de Liz” foi a resposta governamental para a inexistência de assistência em
álcool e drogas no hospital por 2 anos, após a extinção da histórica Unidade de Recuperação de Alcoolismo (URA),
que ofertava 40 leitos, existia há
mais de 30 anos e tinha boa reputação por todo o Estado do PR. A URA teve suas
portas fechadas em dezembro de 2012 sem aviso prévio, sequer foi comunicada a
equipe de enfermagem que lá atendia. Bom registrar que a URA tinha fila de
espera para internamento, nunca havia leito vago, nem por falta de demanda e
muito menos por despreparo da equipe.
Qualquer pessoa minimamente informada
sobre saúde sabe que tal demanda (álcool e drogas) é grande e urgente. Quanto
às mulheres, vimos como foi reduzido o acesso. No que se refere aos usuários
masculinos, não há mais acesso organizado, e o hospital por vezes é obrigado a
admiti-los na única unidade destinada a portadores de transtornos mentais não
relacionados a substâncias, a 1M, até mesmo por ordem judicial. Mais um exemplo
do “modelo assistencial”, ou do “projeto terapêutico” em vigor: combinação de
usuários de diferentes transtornos.
Outros fatos inexplicáveis que podem ser
constatados atualmente no HCAB:
- Foi realizada uma reforma elétrica de quase R$ 800.000,00, mas está incompleta, mesmo depois de entregue;
- Uma unidade desativada foi transformada num depósito de misteriosos equipamentos (há notícias da existência de muitas máquinas de costura, autoclaves modernos etc, mas não há acesso livre aos servidores em geral e usuários, porque foi instalado um portão externo direto para aquele espaço, e o equipamento nem passa por dentro do hospital, sendo lá colocado em sigilo...);
- Foram instaladas inúmeras câmeras de segurança nos corredores e pátio, a maioria delas o tempo todo ociosas;
- Está sendo realizado um novo orçando de pintura para o hospital (a aparência externa tem recebido manutenções frequentes, mas é de se entrar nas unidades...);
- Foi instalada uma academia da terceira idade no pátio do hospital, porém tem restrição de uso até para os trabalhadores, sendo liberada somente para os pacientes da nova unidade e com supervisão de Fisioterapeuta.
Mesmo sem o levantamento completo das
variáveis envolvidas, o HCAB é provavelmente
um hospital deficitário, e somente com o aumento de leitos e ocupação de 100%
seria possível melhorar isso. Ora, baixas taxas de ocupação por si só apontam para deseconomia de escala. Segundo
a Portaria 4.279/2010 do MS, economia de
escala ocorre quando os custos médios de longo prazo diminuem, à medida que
aumenta o volume das atividades (consultas, internações, procedimentos). No
caso do Adauto, como ele concentra serviços para o Estado em um único local,
isso deveria facilitar a racionalização de custos e otimização de resultados. Porém
o mesmo tem reduzido suas internações, até mesmo em função da Política Nacional
de Saúde Mental, que aponta para o cuidado em liberdade, e o investimento
curiosamente pareceu aumentar, exceto no que se refere ao pessoal médico.
Também é provável que haja baixa produtividade, ineficiência e ineficiência técnica. Para tanto,
deveriam ser solicitados à SESA-PR alguns dados e variáveis a fim de se poder
calcular os indicadores hospitalares
(BITTAR, 1996): parâmetros de custos (pacientes-dia, consultas) e consumo (recepção, farmácia,
administração, nutrição, limpeza, etc); produção (nº de pacientes internados,
nº pacientes-dia, média de permanência, faixa etária, procedimentos realizados
na internação; nº de profissionais por categoria, nº de horas trabalhadas por
eles, tipos de turnos e plantões; serviços de terceiros (manutenção, limpeza,
vigilância, laboratórios e outros), incluindo área de atuação, quantificação e
qualificacão dos profissionais, horas trabalhadas e tipo de contrato.
Resumindo, o HCAB, embora um equipamento
ultrapassado no que se refere ao cuidado em saúde mental, inegavelmente integra
a história da saúde do Paraná, e conta com muitos e bons profissionais. Hoje a
política para o hospital não está alinhada com discussões e projetos referentes
à agenda atual da saúde mental no Brasil e no mundo: vê-se que não conta com
projeto terapêutico, e opera sob modelos assistencial e gerencial arcaicos e
verticalizados. Mantém, portanto, o desenho manicomial, no entanto com baixa
capacidade de resposta. Por que então tantos e tão incoerentes investimentos,
em épocas de restrição orçamentária no Estado do PR?
A falta de democracia infelizmente não é de hoje. A
implantação do Sistema de Informação no Adauto já havia sido feita sem o
envolvimento dos usuários do sistema, desconsiderando suas necessidades e as
características da instituição, e sem apoio da direção local (SCHWIDERSKI,
2011). Também nunca foi implantada a supervisão
clínico-institucional em saúde mental. Hoje, na contra mão do que hoje se
faz no SUS, definitivamente deixou de valorizar as equipes e os profissionais. Para
se ter uma idéia, em 2013 a Direção Geral do HCAB inscreveu o hospital em um
evento, para o qual elaborou um banner,
no qual excluiu o serviço médico da carteira de serviços (há fotos do mesmo).
Por tudo o que foi aqui
relatado, é de se perguntar o que pretende a SESA com o HCAB: manter esse
modelo manicomial com autoritarismo, porém sem planejamento, com desperdícios
financeiros e ineficiência? Ou haveria alguma intenção de modernizar o modelo
assistencial na direção do multiprofissionalismo e do cuidado em liberdade,
garantindo aos municípíos paranaenses assistência relevante em álcool e drogas?
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