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domingo, 1 de março de 2015

Dr Rosinha sobre a integração latino-americana: Tudo tem história

DR. ROSINHA*


Em 2003, ao começar o segundo mandato como deputado federal, tomei uma decisão: dedicar-me à política internacional, com ênfase na América do Sul e foco no Mercado Comum do Sul (Mercosul).

Foi, para a época, uma decisão arriscada. E continuaria sendo, ainda hoje. Arriscada porque, no Brasil, apesar de o artigo 4.º da Constituição estabelecer a integração latino-americana como um objetivo nacional, esse tipo de atuação parlamentar não é bem compreendido pela maioria da população e, às vezes, nem sequer pela maioria dos partidos.

Torna-se, assim, uma ação quase que solitária e muito atacada, especialmente por setores da mídia. Ataques muitas vezes injustos. Alguns deles, até agressivos.

Em 2003, com a ascensão de Lula à Presidência do Brasil, o Mercosul foi alçado à condição de um bloco estratégico para enfrentar não somente a Alca, mas também para dar aos países do bloco maior soberania política, econômica e comercial em suas relações com o resto do mundo.

Para garantir uma maior institucionalidade do bloco, foi instalado, por exemplo, o Tribunal Permanente de Revisão do Mercosul (TPR), em 2004. No ano seguinte foi estabelecido o Fundo para a Convergência Estrutural do Mercosul (Focem). Em 2007, começou a funcionar o Parlamento do Mercosul, cujo acordo ajudei a construir.

Os Estados-partes do Mercosul reconheceriam também, em 2010, a necessidade de criar um órgão que ampliasse a capacidade de gestão do bloco em diversos temas fundamentais. Sentia-se também a necessidade de uma autoridade que falasse em nome do Mercosul. Decidiu-se, então, criar o cargo de alto representante-geral do Mercosul (ARGM).

Essa função, que passo a exercer nesta semana, vai desde a articulação política à formulação de propostas e representação das posições comuns do bloco. Vou coordenar, por exemplo, a implementação das metas previstas no plano de ação do Estatuto da Cidadania do Mercosul, aprovado em 2010.

Entre os avanços previstos no estatuto estão a unificação e ampliação dos programas de bolsas de intercâmbio para estudantes, professores e pesquisadores de instituições de ensino superior da região.

Outro avanço é a criação da placa comum de identificação veicular do Mercosul, que será obrigatória para os carros novos a partir de 2016. Com um registro comum de veículos, haverá integração de dados, o que permite maior controle e dificulta fraudes como a clonagem de placas.

Criado em 1991, o Mercosul vive um período de expansão. A entrada da Venezuela, concluída em dezembro de 2012, fez o bloco passar a responder por 72% do território sul-americano, 70% da população e 80% do Produto Interno Bruto (PIB).

Além dos cinco membros (Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e Venezuela) e da Bolívia, que está em processo de adesão ao Mercosul, todos os demais países sul-americanos já estão associados ao bloco.

Dentro do Mercosul não há países menores. Cada país tem, individualmente, um papel importante para a consolidação do bloco.

Como alto representante do Mercosul, trabalharei por uma integração cada vez maior nas áreas social, política e econômica. Por uma livre circulação de trabalhadores, por instituições supranacionais sólidas, pelo enfrentamento das assimetrias e, fundamentalmente, pela instituição de uma cidadania comum.

Tudo tem história, todos temos história. Desde 2003, venho contribuindo com a construção do Mercosul. Em reconhecimento a essa história, passo a exercer esta importante função, com a concordância unânime dos países do bloco.

DOUTOR ROSINHA, médico pediatra, servidor público, ex-deputado federal e ex-presidente do Parlamento do Mercosul, é alto representante-geral do Mercosul.

[*] Artigo publicado no jornal 'Gazeta do Povo', em sua edição de 28.fev.2015

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