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segunda-feira, 25 de maio de 2015

Governo do Paraná [que está falido] gastou R$ 6,3 milhões com empresa fabricante de armas

Somente as bombas de gás lacrimogêneo do dia 29 de abril podem ter custado R$ 360 mil

por Gibran Mendes na página da CUT


Em meio a uma crise financeira o Governo do Paraná gastou, somente em 2014, R$ 6,3 milhões com a Condor S/A Indústria Química. A empresa é responsável pela produção de “munição e artigos de baixa letalidade”, conforme registro no ofício 581/2014 da Secretaria de Estado da Segurança Pública. As informações estão no Diário Oficial do Estado de 15 de maio daquele ano.

A compra ocorreu por inexigibilidade de licitação. Na prática isso significa que não há outro fornecedor disponível e com isso a empresa produtora não tem concorrência. Um especialista em licitações ouvido pela reportagem e que prefere não ser identificar por questões políticas explica. "O fato da compra ser feita por inexigibilidade faz com que não haja concorrência e assim a empresa não precisa diminuir o custo para conseguir o contrato. Desta forma ela fecha com o valor que bem entender. Uma inexigibilidade não precisa de outros orçamentos, pois é uma compra de notório saber ou exclusividade. Assim a empresa pode ter um grande lucro na venda, embora seja necessário ressaltar que não há ilegalidade alguma", relata. No Brasil apenas a ANL produz armas não-letais, contudo, sua produção está limitada aos sprays de pimenta.

Os materiais comprados neste processo foram utilizados na repressão aos servidores públicos, notadamente os professores e funcionários de escola. Modelos como o GL-202, que tem um alcance de até 150 metros, foram largamente utilizados pela polícia durante a tarde do dia 29 abril por aproximadamente duas horas de ataque.

Na Praça Nossa Senhora de Salette, que fica em frente à Assembleia Legislativa do Paraná, o senador Roberto Requião (PMDB-PR) denunciou que havia um veículo com 1.500 bombas armazenadas prontas para o uso. Contudo, o próprio Requião avalia que é possível que mais de 1.800 unidades estivessem no local à disposição das forças de repressão.

Um orçamento enviado pela Condor S/A à Secretaria Extraordinária de Segurança para Grandes Eventos em 2012, demonstra o valor unitário de alguns produtos. O chamado “Kit Operacional Especial Não Letal II – Longa distância”, por exemplo, custa R$ 14 mil a unidade. Ele contém um lançador de munições não-letais de calibres 40mm, cartuchos de balas de borracha e bombas de gás lacrimogêneo do modelo GL 203/T, também utilizado na repressão ao protesto dos servidores públicos.

De forma separada é possível estimar um valor aproximado do uso das 1.800 bombas apontadas por Requião em R$ 360 mil. A referencia é a nota fiscal de número 000007490 emitida em maio de 2014 para a mesma secretaria. Naquele momento foram vendidas spray de pimentas, balas de borracha e bombas dos modelos GL 202, GL 203-T e GL 203-L. O valor total da nota foi de R$ 5 mil. A cotação unitária das bombas vai de R$ 198,00 até R$ 246,00, variando de acordo com o modelo.

O valor de R$ 6,3 milhões gasto pelo Governo do Estado em 2014 é superior, por exemplo, a compra realizada com a empresa no início do primeiro mandato do governador Beto Richa. O diário oficial de 12 de maio de 2011 aponta que o poder executivo estadual fez uso de uma ata de Registro de Preço de 2010. Naquela data a Secretaria de Estado da Segurança solicitava a compra de R$ 1,1 milhão junto à Condor S.A Indústrias Química. Isto representa ampliação de 470%, um percentual expressivo, o que poderia ser justificado pela realização da Copa do Mundo de 2014 se o Governo Federal não tivesse repassado equipamentos para os estados das cidades-sede.

Copa – Em 2012 o Ministério da Justiça firmou um contrato com a Condor S/A para o fornecimento de equipamentos para a segurança do campeonato mundial de futebol que o Brasil sediou em 2014. O documento de número 11/2012 tinha como objetivo a “aquisição de armamentos não letais a serem destinados aos Estados sedes dos jogos da Copa das Confederações, da Copa do Mundo de 2014 e grandes eventos”.


Trecho do contrato da empresa com a Sec. Especial de Grandes Eventos
O valor total do acordo firmado com o Governo Federal para atender 12 estados foi de R$ 49 milhões. O Paraná constava no documento com equipamentos avaliados em R$ 3,7 milhões com entrega prevista até o dia 10 de abril. O Estado foi o sexto a mais receber recursos previstos no pacto a frente de estados como Rio Grande do Sul, Pernambuco, Minas Gerais e Distrito Federal.

No caso da compra isolada, o Paraná gastou com a empresa 12% de tudo que a União investiu para atender 12 estados, Do total de recursos federais, 7,5% foram destinados ao Estado neste primeiro momento. De acordo com a Assessoria de Imprensa do Ministério da Justiça, além disso, o Governo Federal também destinou ao Estado outros equipamentos de segurança, como centro integrado de comando e controle móvel, centro integrado de comando e controle regional, plataforma de observação elevada, imageador aéreo, entre outros.

Comparativos – Uma reportagem publicada em um portal do Mato Grosso do Sul dava conta que seis meses antes da compra realizada pelo Governo do Paraná, a Secretaria de Justiça e Segurança Pública daquele estado também firmou um contrato com a Condor para compra de munições não-letais. O valor era de R$ 179 mil, quantia significativamente inferior ao montante gasto no Paraná.

Os R$ 6,3 milhões do erário paranaense destinados à empresa carioca, por exemplo, seriam suficientes para construir oito unidades básicas de saúde semelhantes a anunciada por Richa em Pato Branco no dia 23 de agosto de 2013. O investimento de R$ 722 mil, neste caso, foi destaque em matéria publicada na Agência Estadual de Notícias, órgão oficial de comunicação do Governo do Paraná.

A empresa - A Condor Tecnologias Não-Letais está situada na baixada Fluminense, no Rio de Janeiro e vem ganhando destaque nacional e internacional a produção de seus artefatos. Fundada em 1985, a Condor vende armas não-letais, ou de baixa letalidade, para 41 países com o objetivo de reprimir manifestações públicas. Turquia, Grécia, Índia, Bahrein e o próprio Brasil são alguns dos exemplos.

SESP - A reportagem também entrou em contato com a Assessoria de Imprensa da Secretaria de Estado da Segurança Pública do Paraná. O objetivo era saber se há uma estimativa de quais e quantos materiais não-letais ou de baixa letalidade foram utilizados no dia 29 de abril. Também foram enviados questionamentos sobre quem adquiriu os equipamentos, sobre a instauração do inquérito para investigar a atuação da Polícia Militar, se o órgão entendia que os procedimentos de segurança que constam nos manuais de orientação foram seguidos e se o Governo do Estado adotou algum tipo de mudança na orientação para a tropa em casos de manifestações públicas.

Por e-mail a secretaria respondeu que "o caso está sendo investigado pelo Ministério Público, Polícia Civil e Polícia Militar. Após o ocorrido, o governador Beto Richa assinou um decreto para disciplinar, aprimorar, normatizar e padronizar o uso de munição não letal em manifestações públicas, situações com reféns, motins e rebeliões de presos. As medidas são voltadas às operações de segurança pública, que incluem a participação de policiais militares, civis, agentes penitenciários ou qualquer outro agente que utilize esses materiais".

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