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terça-feira, 10 de novembro de 2015

Em busca do parto normal


Deborah Secco quer um parto normal. Grávida de Maria Flor, a previsão é que a garotinha venha ao mundo em dezembro. Em entrevista ao programa de Serginho Groisman, a atriz frisou a importância de a mulher estar bem informada para que possa valer a sua vontade. Isso porque, no Brasil, ainda é preciso lutar para que os bebês não nasçam de uma cirurgia. Ela não é a primeira famosa a se manifestar publicamente sobre a escolha da via de parto e sua declaração evidencia a importância de mulheres apoiarem mulheres quando o assunto é parir.

A cesariana está tão intrincada à cultura do nascimento no país que se esquecem os riscos que esse procedimento cirúrgico representa para a mãe e para o bebê. Além de triplicar o risco de morte materna, temos uma taxa de prematuridade de 12,5% que, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), coloca o Brasil no mesmo patamar dos países de baixa renda.

A cesárea é tão banalizada por aqui que se associa a cirurgia à ideia de parto moderno e controlado. Em contrapartida, o parto normal é visto como uma experiência dolorosa e primitiva. E, no país campeão mundial de cesarianas, vemos esse contrassenso representado em um produto cultural de grande audiência e penetração nos lares das brasileiras. Pesquisa de autoria de Claire Stanton, uma parceria entre a Universidade de São Paulo (USP) e a Princeton University, nos Estados Unidos, analisou 33 cenas de parto de novelas exibidas no período de 1990 a 2014 e constatou exatamente isso: enquanto as mulheres que dão à luz de parto normal sofrem de dor com a experiência, aquelas que têm sete camadas do abdômen cortadas e o bebê retirado do útero por um médico aparecem em cena tranquilas e sorridentes.

Diante desse cenário, palavras como autonomia e empoderamento nunca fizeram tanto parte do vocabulário feminino quando a pauta é parto no Brasil. Sejam elas usadas por famosas, em emissoras de televisão de grande audiência, blogueiras influentes ou anônimas nas redes sociais, a luta é para que cada mulher tenha o direito de escolha da via de parto e que essa escolha esteja sustentada por evidências científicas.

A presidente da Associação Artemis, Raquel Marques, que esteve em Belo Horizonte para o 1º Seminário Humanização do Nascimento – Diálogos sobre a Assistência ao Parto, promovido pelo Instituto Pauline Reichstul, afirma que “a ignorância deixa a mulher completamente vulnerável” e que “a informação é a arma que a mulher pode ter para garantir que sua vontade seja respeitada”. No Brasil, uma em cada quatro brasileiras é vítima de violência obstétrica e 70% das mulheres iniciam a gestação desejando um parto normal, segundo a pesquisa Nascer no Brasil, da Fiocruz. No entanto, ranking da OMS mostra que somos o único país a ter mais da metade de todos os nascimentos feitos por essa cirurgia. A taxa de 53,7% é três vezes maior do que a recomendada pela entidade, de 15%.

Em pauta - O movimento pela humanização do parto e nascimento não é novo, já são quase 40 anos de engajamento de mulheres e profissionais de saúde, mas o assunto nunca esteve tão em pauta na sociedade brasileira. No entanto, para Raquel Marques, a mensagem ainda circula predominantemente na classe média e as soluções propostas vêm sempre via consumo, com mulheres, mesmo com plano de saúde, contratando por fora médico, enfermeira obstetra ou ambos, além de doula, para tentar garantir um parto normal.

A luta para a redução da taxa de cesariana tem o apoio do Ministério da Saúde, com o projeto Rede Cegonha e, mais recentemente, com as novas diretrizes da Agência Nacional de Saúde (ANS), como a obrigatoriedade do preenchimento do partograma, que mostra a evolução do trabalho de parto e a assinatura da gestante com o consentimento para a cesariana eletiva (sem indicação médica). Mas para melhorar a experiência do parto e nascimento no país é necessário também discutir o excesso de intervenções no parto normal, muitas vezes desnecessárias e sem respaldo científico.

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