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terça-feira, 5 de abril de 2016

Jorge Solla denuncia o desmonte da saúde proposto pela 'Ponte' do Temer

O que Temer*


Está prevista para hoje a votação do segundo turno da PEC 01/2015 na Câmara de Deputados, proposta que eleva gradualmente o orçamento da Saúde para 19,4% da Receita Corrente Líquida ao final de sete anos – neste 2016 são 14,8%. Cumprida a fórmula, em 2023 teremos um orçamento 50% maior que o atual.

É o avanço mais significativo em décadas na batalha contra o subfinanciamento do setor e será aprovado na semana do Dia Mundial da Saúde, 7 de abril. Debatemos este projeto por anos com o Saúde+10 e com a sociedade organizada em conselhos e entidades de classe; ajustamos o texto na minúcia todo o ano passado na comissão especial, o que permitiu um raro acordo entre governo e oposição.

É o suficiente para resolver os problemas da saúde? Certamente não. De 2003 a 2014, nos governos Lula e Dilma, o orçamento da Saúde teve um ganho real de 60%. Deu para fazer muita coisa, mas ainda estamos longe de entregar à população o SUS universal e integral que concebemos na Constituição de 1988.

Enquanto mantemos o nosso sistema de saúde com US$ 380 per capita/ano, no Reino Unido são destinados US$3 mil e na nossa vizinha Argentina, US$ 1,2 mil. De desvantagem sobre estes dois países, temos ainda a enorme pressão sobre o SUS da violência: em 2014, 58 mil pessoas morreram no Brasil vítimas de crimes contra a vida; outros 40 mil morreram em acidentes de trânsito. Além do socorro emergencial, custeamos o tratamento dos outros milhares de pacientes que sobreviveram.

Para além de buscar o acesso universal à saúde de qualidade, o crescimento dos gastos com saúde também ajuda a superar a crise econômica. De acordo com o IPEA, mais 1% do PIB em gastos com saúde pública elevaria a renda das famílias em 1,44% e o PIB em 1,7%. Em meio à recessão, nos últimos doze meses o setor saúde gerou 48 mil novas vagas de emprego, crescimento de 2,5% — o maior do país – ante uma redução global de 4,1%. Mais saúde à população, obviamente, também significa mais eficiência de nossa mão de obra e menores gastos previdenciários.

Apesar da evidente necessidade estratégica de investir mais em saúde, a PEC O1/2015 corre o risco de ser derrubada antes mesmo de começar a vigorar. Sem disfarçar a conspiração que comanda para tomar o poder, o vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB), formulou até um programa de governo, feito na medida para agradar banqueiros e grandes empresários. Entre as promessas, está a entrega do pré-sal, a retomada da era das privatizações, a inviabilização do Minha Casa, Minha Vida e do Prouni, o fim das verbas carimbadas para educação e saúde.

O que Temer promete é exatamente o oposto do que institui a PEC 01/2015. Enquanto asseguramos a expansão dos recursos para a saúde ampliando a vinculação das receitas com as despesas, Temer garantiu aos empresários que, com o golpe, poderá cortar à vontade para produzir superávits e encher ainda mais os bolsos dos banqueiros. Está tudo escrito no chamado “Ponte para o Futuro”.

Com este programa, Temer conseguiu transformar o impeachment num golpe duplo à democracia. É golpe porque a presidente Dilma não praticou nenhum crime; é golpe porque Temer abandonou a posição de vice-presidente eleito numa chapa que tinha um projeto popular, para apresentar um programa de governo antagônico ao que lhe deu seu mandato. Propostas que jamais elegeriam um presidente no Brasil pelo voto direto, que não representam a vontade popular.

Transformar um processo de impeachment numa eleição indireta – com propostas e repartição de ministérios para aliados, inserindo, portanto, fatores de convencimento a parlamentares para além da análise jurídica da acusação – foi um erro fatal do PMDB e de Temer. A população percebeu o golpe a tempo e não vai permitir que aconteça. Não vai ter Golpe!

*ARTIGO ORIGINALMENTE PUBLICADO NO JORNAL A TARDE – DIA 05/04/2015

**Jorge Solla é deputado federal pelo PT-BA, graduado em Medicina (1984), Mestre em Saúde Coletiva (1993) pela Universidade Federal da Bahia e Doutor pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2009). Foi Secretário Municipal de Saúde de Vitória da Conquista (1999 a 2002), Secretário de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde (2003 a 2005), Secretário da Saúde do Estado da Bahia (2007 a janeiro de 2014) e é médico pesquisador da Universidade Federal da Bahia.

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