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sábado, 7 de maio de 2016

"Mercadoria de luxo" - O custo da assistência farmacêutica

via Correio da Saúde da CAOP-Saúde do MP-PR

A mercantilização da saúde é um dos principais aspectos que elevam (e muito) o custo da atenção à saúde em todo mundo. O exemplo característico é o da indústria farmacêutica que cobra valores exorbitantes por tratamentos que são capazes de salvar milhões de vidas, mas que ficam restritos a uma pequena parcela da população mundial.

Essa é a tônica da matéria divulgada na última edição da Revista Radis 1, “Mercadoria de luxo”, que apresenta o caso do fármaco sofosbuvir (nome comercial sovaldi), para o combate a hepatite C e cirrose hepática. O medicamento, conhecido como a “pílula de mil dólares” em alusão ao valor cobrado pelo laboratório nos Estados Unidos, obsta o acesso de milhões a um tratamento que proporciona uma taxa de cura em até 90% dos casos

De acordo com a reportagem, no SUS, o tratamento para 12 semanas custa 7.500 dólares (aproximadamente R$ 27 mil 2). O valor está longe do custo real. Para se ter uma ideia da distorção no preço, a indústria farmacêutica autorizou a produção excepcional de genéricos em sete laboratórios na Índia, os quais são vendidos, em média, por 900 dólares (cerca de R$ 3.200) para o mesmo período da terapêutica. O benefício, entretanto, se destina a alguns poucos países definidos pelo próprio laboratório. Outro dado importante é o de que o custo da produção do medicamento é de apenas 100 dólares, ou seja, R$ 360,00 para o combate às doenças.

Não se desconsidera o custo envolvido para o desenvolvimento de novos medicamentos, tratamentos e técnicas para o combate à doenças, mas o que se verifica, na atualidade, é o mercado decidindo livremente quais insumos serão produzidos (medicamentos necessários, mas considerados baratos tornam-se escassos) e quem tem direito ao acesso.

A questão é: como garantir o acesso universal a tratamentos de alto custo, principalmente em um período de crescente escassez de recursos?

Uma das alternativas é a previsão contida no “Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio 3”, assinado por todos os países integrantes da Organização Mundial do Comércio (OMC), que prevê o instituto do licenciamento compulsório. A lei nacional de patentes (Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996) tem previsão semelhante e permite o licenciamento nos casos de exercício abusivo de direito, abuso do poder econômico, não exploração local, comercialização insatisfatória, emergência nacional e interesse público.

O licenciamento compulsório é, em síntese, uma flexibilização das patentes, mesmo sem a autorização do seu detentor, em casos em que deve prevalecer o interesse público. No Brasil, o mecanismo foi utilizado em 2007 para determinar o licenciamento compulsório do medicamento efavirenz, que faz parte do coquetel antirretroviral para a Aids, gerando, em 5 anos, uma economia de 100 milhões de dólares aos cofres públicos.

A despeito do evidente problema de desfinanciamento do SUS, a reportagem da Radis sinaliza que o equilíbrio financeiro do sistema público (especialmente no que concerne à assistência farmacêutica) atrela-se, também, à tomada de decisões políticas firmes em face de um mercado no qual interagem diversos atores (laboratórios, distribuidores, profissionais da medicina, complexos hospitalares, etc) e que produz impacto direto sobre a qualidade da assistência que se proporcionará à população.


1Revista Radis, edição nº163, de abril de 2016. ENSP, Fiocruz.

2 Valor da cotação da moeda americana do dia 3/5/2016: R$ 3,5697 (compra)

3 Também denominado Acordo TRIPs, acrônimo na língua inglesa para: Agreement on Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights.

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