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quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Artigo: “ESTADO DE SÃO PAULO INICIA PPP NA ÁREA DE SAÚDE”


Paula Carnevale
Médica – Dra. Em Saúde Pública – Professora da UNIVAP

O que estará por trás disso, não? Primeiro a entrada do capital estrangeiro no mercado da saúde e agora esta PPP que envolve construção e gestão administrativa de quatro hospitais no mesmo projeto, e consolida as OSs na gestão clínica. Para mim, traz mais um ator de grande peso econômico (e social, já que o edital o valoriza e diferencia do público, como destaca o texto extraído do edital  "visando excelência na qualidade do atendimento...") para o já complexo sistema de saúde paulista. 

Claro que será ótimo contar com tecnologia de ponta nos hospitais públicos; o problema é a forma como a proposta está apresentada. Entre muitos pontos, além daquele primeiro que me parece fundamental, destaco dois.: 

1. Os critérios de avaliação serão estabelecidos pela própria empresa que fará o empreendimento (acho que esta é a palavra correta, pois me parece ser disto que se trata, um negócio): "Para manter a excelência da qualidade dos Serviços administradas pela SPE – PPP, o estudo deverá propor indicadores de eficiência e acompanhamento de desempenho conceito SLA – Service Level Agreement – e/ou Verificador Independente, com base nas boas práticas nacionais e internacionais".

2. A natureza pública do hospital deve ser quase lida nas entrelinhas; deixa abertura para o atendimento privado e a exploração de um verdadeiro complexo que pode ser caracterizado como cultural, comercial ou não sei de que natureza (quase vejo uma propaganda de página inteira de jornal, "saúde com excelência, enquanto espera a realização de seus exames de checkup, passeie e faça compras no shopping...) : " A equalização do Conforto Ambiental (Projetos Sustentáveis / Conceito Verde) mantendo o caráter de Serviço Público com atendimento gratuito à população. Para cada Complexo Hospitalar deve ser analisada/pesquisada a possível inserção de áreas com equipamentos que agreguem valor ao projeto e possibilite a obtenção de Receitas Acessórias (Bancos, Livrarias/Revistas, Correios, Lojas de Conveniências, Restaurantes, Lanchonetes, Salas para Internet, Salas para os Acompanhantes, Salas cinema, etc.). Prever planos de Expansão / Ampliação para os próximos:"  

É um movimento que agrega imenso valor simbólico à já cultuada atenção secundária e terciária e à participação do setor privado na organização e gestão dos serviços de saúde (que define as regras do jogo, conforme o edital), reforçando o caráter comercial que a saúde vem adquirindo no país, não mais como "suplementar" ao sistema (o que, de fato, nunca foi) mas oficialmente nas entranhas do SUS. 

Voltando a um tema que tem estado em pauta, este edital reforça a tese da fragilidade das instituições no Brasil. Os rumos da política são decididos em instâncias outras que não as oficialmente estabelecidas - afinal, qual a participação do Conselho de Saúde neste debate? Provavelmente nenhuma, pois pela falsa justificativa da inquestionabilidade de critérios "técnicos", a discussão política é descredenciada e desqualificada, reduzida a uma questão menor, quando é, na verdade, o lócus, por execlência, desse debate. 

Vamos ver as repercussões, e em cada espaço que participamos, analisar os interesses em jogo. 

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