Lula 2.0 tem a voz do velho sindicalista
Na noite de segunda-feira Nosso Guia fez ao mesmo tempo uma prestação de contas do governo Lula 1.0 e o discurso de posse de Lula 2.0. Um mostrou resultados, o outro ofereceu esperança.
Poucos presidentes puderam dizer como ele: “De 2003 para cá, o salário mínimo cresceu em termos reais 51% e o emprego também cresceu fortemente. Em 2007, batemos um recorde: 1 milhão 812 mil novos empregos com carteira assinada. Em 2008, novo recorde: até outubro, 2 milhões 148 mil empregos. Resultado: a taxa de desemprego caiu de 12,3% em 2003 para 7,6% em outubro de 2008. (...) Mudamos de cara e de astral”.
Pode-se avaliar a distância que separa o Lula 1.0 do 2.0 quando se vê que, no mesmo dia em que sua fala foi ao ar, o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados, o Caged, informou que em novembro passado perderam-se 41 mil empregos formais. Pior: enquanto Lula falava à tarde num crescimento de 4% para 2009, o Banco Central informava que a previsão de seus sábios baixa a bola para 3,2%.
Deixando-se de lado leviandades verbais como a “marolinha”, Lula artilhou-se na estratégia certa de combate à crise: deve-se estimular o consumo e o governo deve ser o indutor do resgate. Se a banca internacional e seus fâmulos nativos não estivessem mudos e quebrados, esmolando na porta do companheiro Obama, essas posições de Nosso Guia seriam vistas como excentricidades populistas. Infelizmente, Lula 2.0 tem amarrada à perna esquerda a bola de ferro de um organismo extra-constitucional chamado Copom. Um dia alguem fará a conta e descobrirá que essa invenção do tucanato causou mais males ao Brasil que as tropas de Solano Lopez. Não contentes com a marca da maior taxa de juros do mundo, conseguiram também a excentricidade de terem sido os únicos a subir a Selic enquanto o resto do mundo reduzia suas taxas ao longo do ano.
Colocando-se acima do poder republicano do presidente (por abdicação do titular) os Copomitas refletem a anarquia financeira da mesma forma que, durante a ditadura, os superpoderes do Alto Comando do Exército refletiam a anarquia militar. Com uma diferença: a anarquia financeira derreteu a economia mundial. Nosso Guia diz muito bem quando fala em jogatina “desavergonhada”. O doutor Henrique Meirelles e os seus colegas de Copom chamam essa mesma coisa de “mercados”.
O discurso de fim de ano de Lula 2.0 teve um grande momento: “É imprescindível que os trabalhadores defendam a produção e o emprego”.
A frase é ambígua, mas na hora em que o presidente da Vale, doutor Roger Agnelli, comemorou os 40 anos do AI-5 sugerindo “medidas de exceção” para as relações trabalhistas, nada melhor do que o discreto reaparecimento de um velho líder sindical. Se os trabalhadores não prestarem atenção, o mesmo empresariado que vai ao BNDES pegar o dinheiro do FAT a juros camaradas, haverá de tungar seus direitos trabalhistas. Acabarão retardando o recolhimento de impostos e antecipando a renegociação das horas extras. Agnelli gostaria que o governo passasse a faca na proteção que as leis dão ao trabalho, assim como a Fiesp gostou quando a ditadura passou a faca nas garantias individuais da patuléia. Depois, quando a História aparece com a conta, bota-se toda a culpa nos militares ou na reforma trabalhista do governo Lula.
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