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quinta-feira, 5 de março de 2009

Falta de direitos trabalhistas nos sistemas cooperativistas prejudica Economia Solidária

No sítio do Projeto Brasil

As instituições cooperativistas ainda precisam ser aprimoradas no país, defende o titular da Secretaria Nacional de Economia Solidária Paul Singer.

Em entrevista concedida ao docente do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho da USP, Paulo de Salles Oliveira, o secretário explica que a falta da obrigatoriedade de direitos, como o pagamento do salário mínimo e o recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo e Serviço (FGTS), incentiva a abertura de entidades “pseudocooperativistas” que, em vez de atuarem no combate as desigualdades prejudicam os direitos básicos do trabalhador.

Os dois especialistas discutem também a importância da Economia Solidária para o Brasil, e outros mecanismos desenvolvidos no mundo de combate a pobreza, como a criação do microcrédito e os chamados ‘Clubes de Troca’ – que permitem às pessoas sem, ou com pouco, trabalho aumentar suas vendas e simultaneamente suas compras em um ambiente onde moedas alternativas são criadas.

Segundo o secretário, Economia solidária é quando em um empreendimento os meios de produção são de posse dos trabalhadores, quando existe a igualdade de direitos, e cada um representa um voto. Dessa forma a autogestão e o controle econômico do empreendimento são realizados pelos próprios produtores.

Segundo Paul Singer, entre os exemplos mais expressivos de economia solidária estão as cooperativas que, quando grandes, necessitam funções especializadas, ou seja, de presidentes e tesoureiros, “porque aí uma grande parte das decisões tem que ser tomadas pelos responsáveis por diferentes setores”, explica.

O secretário acredita que a economia solidária oferece oportunidade para todos, e por isso, é importante para o desenvolvimento social brasileiro, dada as desigualdades sociais que persistem no Estado.

Em uma cooperativa, por exemplo, os trabalhadores são proprietários de tudo o que é produzido, e também são responsáveis pelos prejuízos do empreendimento. Portanto, como qualquer outra empresa, devem constantemente inovar e melhorar a gestão para se manterem competitivos no mercado.

Nem tudo é perfeito

As instituições cooperativistas no país ainda precisam se aprimorar para chegar ao nível de um empreendimento ideal. O secretário reconhece que ainda existem erros na legislação dessas instituições como a não obrigatoriedade do pagamento de salário mínimo aos cooperados, falta de recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, férias, e 13º salário.

Esses fatores dão margem ao surgimento das chamadas ‘falsas cooperativas’, ou ‘pseudocooperativas’. A diminuição de encargos trabalhistas atrai empresários que podem transformar a firma em “cooperativa” reduzindo pela metade os gastos com a folha de pagamentos. “Existem hoje até consultoras especializadas em transformar empresas em falsas cooperativas”, afirma o secretário.

Dados do ano de 2008 divulgados pela Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) mostram que existiam até o final daquele ano cerca de 7.682 cooperativas gerenciadas por 7.887.707 associados. Em 2008 o total faturado por esses empreendimentos foi 18% superior ao registrado um ano antes: R$ 84,9 bilhões.

Crédito e economia solidária

Para o secretário Singer o principal gargalo para o desenvolvimento da economia solidária no país é a dificuldade em obter crédito.

“O sistema financeiro formal está muito voltado aos grandes clientes, sejam governos ou empresas. Há um dito que banco só empresta para quem não precisa. Isso é verdade, porque quem precisa mais é quem não tem como garantir que vai devolver o que tomou emprestado; então o sistema exclui os pobres”, expõe.

O microcrédito é visto como uma das armas mais eficientes para contornar esse problema. O secretário abordou o sucesso da criação do Grameen Bank (Banco da Aldeia), em Bangladesh, por Muhammad Yunus, em 1976.

A instituição é uma cooperativa de crédito, onde os donos são os clientes. Mais de 90% são mulheres e o crédito é concedido a grupos de cinco pessoas que devem decidir juntas quanto cada uma deve receber.

Yunus recebeu em 2006 o premio Nobel da Paz pela criação do Grameen Bank que desde o inicio só deixou de gerar lucros nos anos de 1991 e 1992 - o banco conta hoje com mais de 2 mil agências e já emprestou o equivalente a 5,7 bilhões de dólares a 6,6 milhões de mutuários.

Clubes de Troca

Na entrevista concedida ao professor Oliveira, o secretário falou também sobre a importância da criação dos ‘Clubes de troca’, ou LETS (Local Exchange and Trade System).

Essas organizações surgiram em vários lugares no mundo, sempre em situação de crise de mercado. É um sistema de preços onde uma comunidade estabelece a criação de uma moeda especifica para as atividades de interesse local.

O secretário explica que nos anos 1990, por exemplo, os argentinos criaram clubes de troca, assim, grupos de trabalhadores e seus familiares puderam melhorar suas vendas, compras, “e em conseqüência produzir mais, se alimentar melhor e satisfazer outras necessidades”.

“Como a grande maioria carece de dinheiro, o processo de intercâmbio não poderia deslanchar porque ninguém poderia comprar antes de vender. Esse ponto de estrangulamento monetário é superado pela adoção pelo clube de uma moeda própria, que, em geral, ganha um nome fantasia, com caráter ideológico, como: reais solidários, dólares verdes ou horas [de trabalho]. Antes de cada sessão de trocas, cada sócio recebe a mesma quantia da moeda do clube. Com esse dinheiro, as primeiras mercadorias são compradas”, completa Singer.

Para acessar a entrevista na íntegra, clique aqui.

Da Redação Lilian Milena

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