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sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Para garantir juros baixos, taxar os grandes investidores

DR. ROSINHA
Mudança da remuneração da poupança preserva os pequenos poupadores, evita a especulação e permite a continuidade da redução da taxa Selic
Lembro que, na minha infância, meus pais até se esforçavam para ter uma poupança. Às vezes, conseguiam poupar alguma coisa, mas por um curto período: logo, por algum motivo, eram obrigados a usar o dinheiro que estava na conta.
Esforços desse tipo são feitos por muitas famílias pobres ou de classe média baixa, o que não é o caso, por exemplo, de megaespeculadores como George Soros.
Durante anos, o Brasil teve elevadas taxas de juros, sempre apoiadas por especuladores e seus representantes no Congresso Nacional. Depois de muita cobrança dos movimentos sociais, a taxa básica baixou e hoje está em 8,75% —a menor da história do país. Mesmo assim, e com razão, trabalhadores e o setor produtivo da economia defendem uma redução ainda maior dessa taxa.
Mas, afinal, o que impede uma redução maior dos juros? Uma razão é o risco de grandes aplicadores, como Soros, transferirem seu dinheiro dos fundos de investimento para a poupança. Com as regras atuais, a poupança se tornaria a opção mais atraente de investimento e especulação.
Essa migração pode gerar desequilíbrios financeiros, o que alteraria as condições de financiamento das empresas, famílias e governo. Assim, o Banco Central argumenta: não pode reduzir sua taxa básica de juros, sob pena de criar um problema sistêmico para a economia brasileira. Enquanto os juros estavam em dois dígitos, como era o caso durante o governo tucano de FHC, esse dilema não existia.
Para garantir a continuidade da queda dos juros — medida que traz grandes benefícios para a sociedade brasileira, em especial para os mais pobres —, o governo Lula propõe uma mudança da remuneração dos depósitos de poupança, sob três diretrizes: 1) Preservar os interesses dos pequenos poupadores; 2) Evitar a utilização da poupança como instrumento de especulação por parte de grandes investidores; e 3) Permitir a continuidade da redução da taxa Selic.
A proposta prevê uma alíquota de IR (Imposto de Renda) de 22,5%, aplicada apenas sobre os rendimentos dos saldos que excederem R$ 50 mil. Ficam isentos os contribuintes que tenham saldo total em contas de poupança inferior a este valor.
Ao contrário do que pregam seus opositores, a proposta atingiria os grandes investidores, que correspondem a apenas 1% dos detentores de cadernetas na poupança. Das 89.980.718 contas de poupança existentes em dezembro de 2008, nada menos que 89.085.862 não seriam afetadas, por terem saldo inferior a R$ 50 mil.
Exemplo concreto: uma pessoa que tenha R$ 60 mil aplicados em depósitos de poupança teria incidência tributária apenas sobre os rendimentos da parcela de R$ 10 mil que excede o limite de isenção. O IR, nesse caso, seria de R$ 11,25. Ao invés de receber R$ 300 de rendimentos mensais de rendimento, ela receberia R$ 288,75.
"Quando se entram em quantias maiores, as alíquotas se tornam claramente punitivas", explica, em seu blog, o jornalista Luis Nassif. "Esses ajustes pontuais, no fundo, preparam o mercado para o grande salto nos próximos anos. Com as taxas de juros se aproximando dos padrões internacionais, com o mercado de capitais bastante desenvolvido, com a necessidade de capitais de longo prazo para financiar a infraestrutura."
Fixada no início da década de 90, a atual regra do rendimento da poupança estabelece uma remuneração igual a 0,5% ao mês mais TR (Taxa Referencial, próxima de zero com a queda da Selic).
Vale ressaltar que o objetivo da proposta de alteração nas regras da poupança é regular, e não arrecadar. A proposta permitiria ao Banco Central reduzir a taxa Selic para um piso de 7% ao ano.
A cobrança de Imposto de Renda sobre o ganho da caderneta de poupança seria uma saída temporária para permitir que os juros continuem caindo. E para que os Soros das especulações não contaminem o meio da poupança dos pobres e da classe média.
A medida atingirá apenas os grandes poupadores, além dos investidores estrangeiros e residentes em paraísos fiscais. Esses dois últimos inclusive não terão direito à isenção sobre o saldo de até R$ 50 mil.
Do contrário, o Brasil estaria cedendo a megaespeculadores internacionais, que poderiam aplicar milhões de dólares na poupança, que se tornaria a melhor opção de investimento, e sem risco.
Cabe ao Congresso Nacional debater a proposta e, por que não, inclusive o teto de isenção, que pode vir a ser reajustado para cima. O que não se pode permitir é o discurso leviano e rasteiro da oposição, capitaneada por PSDB, DEM e PPS, que não se cansam de defender uma meia dúzia de grandes investidores em detrimento da maioria dos brasileiros.
Dr. Rosinha, médico pediatra, é deputado federal (PT-PR)
[*] Artigo publicado pelo jornal "Gazeta do Povo" em sua edição de 25 de setembro de 2009.

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