Quando Fernando Lugo foi eleito presidente do Paraguai, The Economist disse, em editorial, que aquele seria o último presidente de esquerda a ser eleito na América Latina. A chegada da crise mudaria a pauta, que estaria centrada em temas propícios à recuperação da direita – ajuste fiscal e violência.
Qualquer candidato que pregue diminuição de impostos e mão dura na segurança pública sai na frente nas pesquisas. A primeira proposta apela para a desqualificação do Estado, que arrecadaria em excesso e não daria retorno em serviços à massa da população. Não importa que tipo de dessolidarização significaria pagar menos impostos, recorta-se a relação apenas com uma entidade abstrata – “Estado” -, sem levar em conta que a grande maioria dos gastos estatais são para contratar pessoal que atende a massa – em geral pobre – da população, como enfermeiras, professores, assistentes sociais. O inimigo não é a injustiça, a miséria, a falta de direitos para todos, mas se concentraria no Estado – vítima privilegiada do neoliberalismo.
O problema seria mais grave porque, mais recentemente, a mesmo The Economist afirmou que o Brasil seria um caso perdido para o liberalismo, porque, segundo eles, o voto sendo obrigatório e os pobres gostando do Estado – que é quem concede direitos -, os liberais nunca conseguiriam triunfar.
Acontece que, quem garante direitos, é o Estado. Quem coordena planos de casas populares, é o Estado. Quem desenvolve planos de contenção da maior crise econômica internacional, é o Estado. Quem pode redistribuir renda, mediante programas sociais, contrapondo-se em parte às desigualdades produzidas pelo mercado, é o Estado.
É, ou pode ser o Estado, na dependência de quem o dirige, da concepção que preside sua atuação. Na crise de 1999, o governo FHC subiu a taxa de juros a 48%, isto é, levou o país a uma profunda e prolongada crise, que teve como conseqüência a assinatura por aquele governo de mais uma Carta de Intenções com o FMI e a reiteração das medidas anti-sociais que essa carta contém.
Olhando para a recente crise mundial– consensualmente considerada a mais grave crise econômica desde 1929, terminando com a equivocada versão de que o governo Lula se dava bem porque contava com um entorno internacional favorável. -, podemos imaginar como estaríamos se o Brasil estivesse sendo governada por Alckmin, que tinha proposto o retorno ao Estado mínimo, a uma reinserção internacional como a propõe agora Serra, de ruptura das alianças com o Sul do mundo e vínculos carnais com os EUA. Teríamos uma crise como a mexicana.
O papel do Estado foi o diferencial entre a atuação do Brasil na crise de 1999 e na crise recente. Naquela, a ação do governo foi de multiplicar a crise. Nesta, o governo acionou todos os mecanismos anti-cíclicos para diminuir os efeitos da crise. Naquela crise, o Brasil foi jogado numa crise profunda e prolongada. Nesta, saímos da crise de forma relativamente rápida. Naquela, o povo pagou o preço mais caro da crise, elevando-se ainda mais o desemprego, o trabalho precário, a taxa de juros. Nesta, buscou-se resguardar o nível de emprego, de salários, as políticas sociais foram mantidas e até estendidas.
Daí que a luta pelo controle do Estado se torna tema e objetivo central da campanha eleitoral deste ano. Para que volte a ser instrumento dócil da acumulação privada – como foi nos processos de privatização levado a cabo pelos tucanos, unanimemente, sem voz dissonantes no seu ninho – ou para que seja o grande promotor do desenvolvimento com distribuição de renda, da soberania nacional e do combate à desigualdade e à injustiça social.
Postado por Emir Sader às 04:58
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