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terça-feira, 20 de março de 2012

Artigo da vereadora Professora Josete: Um novo nome, o mesmo grupo, as mesmas práticas?

Artigo da vereadora Professora Josete (PT) sobre a eleição de João do Suco (PSDB) à presidência da Câmara Municipal de Curitiba 

Foi quase um parto: quase nove meses de uma profunda crise de identidade, de representação, de legitimidade, mas hoje, 19 de março de 2012, a Câmara Municipal de Curitiba elegeu seu novo presidente. Com 25 dos 38 votos possíveis, João Luiz Cordeiro (PSDB), a quem aprendemos a chamar de "João do Suco", assume o lugar deixado vago pelo colega de partido, João Cláudio Derosso, representante maior de uma verdadeira dinastia de oito mandatos consecutivos a frente da Casa de Leis. 

O momento foi histórico. Os vereadores tiveram nas mãos a oportunidade não só de superar a descrença sob a qual padece a Casa, mas de romper com a tradição histórica de submissão ao Executivo e de distorção das reais atribuições do Legislativo - a Câmara deveria ser a primeira instituição a reverberar os anseios da sociedade, mas tem sido refém de um fisiologismo que reduz a democracia a um pequeno e mesquinho jogo de troca de favores, no qual apoios e votos são decididos na expectativa de contrapartidas de cunho meramente privado, em detrimento do interesse público. 

A ótima oportunidade, no entanto, não foi aproveitada hoje. Mudou-se o nome da pessoa a ocupar a principal cadeira da Câmara. Mudou-se o tom do discurso. De resto, por enquanto, mais nada mudou. 

Nada mudou porque voltamos hoje às nossas casas sem a garantia de que as antigas e ultrapassadas práticas políticas e administrativas que há anos reinam na Câmara de Curitiba serão, de fato, repensadas. 

Nada mudou porque o grupo que possui a maioria dos votos sequer discutiu se a Câmara vai continuar dizendo amém a todos os espirros que chegam do Palácio 29 de março. 

Nada mudou porque a definição da pauta dos projetos a serem votados (ou não) tende a continuar amarrada aos interesses dessa mesma dinastia política.

Nada mudou porque, apesar dos anseios da sociedade, ainda não se sabe se haverá transparência, se as contas da Câmara serão detalhadas e auditadas; se haverá um esforço institucional para que sejam aprofundadas, internamente, as investigações sobre as irregularidades praticadas durante os 15 anos da gestão de João Cláudio Derosso. 

No que tange a aspectos meramente pessoais, respeito a pessoa e nutro certa simpatia pela figura de João do Suco. Mas é pelo olhar da dialética política que precisamos analisar o que ocorre, neste momento, na Câmara Municipal. 

Desde julho do ano passado, quando as irregularidades cometidas pela gestão de Derosso se transformaram em escândalo, João do Suco posicionou-se pouquíssimas vezes sobre o assunto. Ele não figurava entre os parlamentares que defendiam o aprofundamento das discussões no Conselho de Ética ou a instauração da CPI. Assinou o requerimento que a instalou, mas forçado pelas circunstâncias. 

Após constatadas as irregularidades, ele não defendia punição para os culpados. Quando não estava em uma posição de defesa do colega de partido, optava pelo caminho da omissão, mesmo nos momentos em que a cidade exigia claros e definitivos posicionamentos políticos. Além disso, João do Suco, durante todo este tempo, seguiu firme como o representante oficial do prefeito Luciano Ducci (PSB). 

Se levarmos em conta todos esses elementos, bem como o fato de Derosso também ter anunciado o voto em João do Suco, fica ainda mais evidente que o novo presidente representa mesmo é a continuidade da lógica que há décadas governa Curitiba. 

Para além desse raciocínio, depois de tudo o que aconteceu, quem pode, e como pode, demonstrar que existem diferenças na essência do pensamento e das práticas políticas de Luciano Ducci, João Cláudio Derosso, Beto Richa e João do Suco? Que Câmara, Prefeitura de Curitiba e Governo do Estado são instituições distintas e autônomas?

Será uma bela surpresa se minha análise estiver errada. E, para o bem da cidade, gostaria muito de estar errada, mas todos os elementos apontam para uma leitura pessimista sobre a oportunidade que a maioria dos vereadores perderam hoje. 

Apesar disso, também não posso deixar de levar em conta que, para nós da Oposição, o resultado do pleito soa como um progresso significativo. Iniciamos este mandato com apenas cinco parlamentares declaradamente oposicionistas à lógica opressora e fisiológica da Câmara e da Prefeitura. Hoje, porém, foram onze votos na candidatura fomentada pela Oposição, mais duas abstenções. Ou seja, 13 vereadores manifestando descontentamento com a lógica intervencionista na Casa do Povo. Sinal de esperança. Sinal de que, sim, é possível, é saudável, é preciso mudar. 

Temos a consciência de que fizemos a nossa parte defendendo a candidatura do companheiro Paulo Salamuni (PV), construída sobre uma plataforma que estabelecia as diretrizes necessárias para que a Casa retomasse a missão constitucional de legislar e de fiscalizar o Executivo com base em valores republicanos e democráticos tais quais a ética, a transparência, a participação popular, a soberania e a independência entre os poderes. De nossa parte, continuaremos trabalhando e exigindo transformações, transparência, legalidade, moralidade, impessoalidade. 

Mas as respostas às quais a sociedade espera não deverão ser dadas formalmente pela instituição Câmara Municipal. Afinal, quando ela teve oportunidade, o resultado escolhido pela maioria dos vereadores foi o culto cego ao continuísmo - continuísmo pelo continuísmo, pela simples manutenção do Poder. 

Por isso, pela conjuntura que está dada, essas respostas devem continuar vindo do Judiciário, do Ministério Público, do Tribunal de Contas. 

Devem continuar vindo dos 13 vereadores que disseram não à lógica do continuísmo. 

As mudanças devem e estão sendo fomentadas pela atuação dos profissionais e veículos de imprensa; da mobilização das comunidades de Curitiba; dos movimentos sociais; das entidades da sociedade civil organizada. 

As mudanças devem e precisam partir de todos nós que, desde o início dessa crise, defendemos a cassação de Derosso. 

Acredito e espero que elas também venham das urnas. 

Para mim, o dia de hoje conteve a dualidade da decepção e da esperança. Mesmo com essa ameaça do continuísmo, e com a sensação de que nada mudou ainda, considero que houve vitória, pois se a cassação que defendíamos não veio, o afastamento definitivo de Derosso da Presidência chegou. Foi conquistado a duras penas, mas demonstrou que não foi em vão a mobilização de diversos setores da sociedade. 

E por falar de esperança, não posso deixar de destacar que avançamos em alguns aspectos da Lei Orgânica e também aprovamos mecanismos de maior transparência para a Câmara, como a Comissão de Controle Interno, por exemplo. 

E em breve deve ser instalada a Comissão de Revisão do Regimento Interno da Câmara, da qual eu farei parte, outro espaço para garantir e aprofundar avanços.

Fica, então, a mensagem de que se a mudança que queremos e merecemos não foi consolidada hoje, poderá ser em breve, muito breve, com a atuação de todos e todas que lutam e trabalham por uma sociedade mais digna. 

A mudança ainda não veio, mas virá. 

Professora Josete. 
Vereadora pelo Partido dos Trabalhadores em Curitiba.

Curitiba, 19 de março de 2012. 


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