no Valor Econômico
Melhorar a gestão, levar médicos para a periferia e proporcionar melhores salários aos profissionais da saúde são os principais argumentos citados por alguns prefeitos e gestores para justificar a crescente terceirização na saúde, com o uso de Organizações Sociais (OSs) no gerenciamento de hospitais e postos de saúde. O modelo, no entanto, está longe de ser um consenso entre especialistas e divide os partidos no debate eleitoral.
Em São Paulo, o debate sobre a terceirização divide claramente PT, que é contra, e PSDB, favorável. O candidato tucano, José Serra, é um dos maiores defensores do regime. É um modelo super adequado, descentralizado e mais flexível, diz Serra. Os parceiros das OSs são fundamentais para flexibilizar e aumentar a oferta, afirma. Foi Serra quem trouxe as entidades para administrar a saúde municipal a partir de 2006. Hoje, das 945 unidades de saúde em toda a cidade, as OSs gerenciam 610 delas (65%) e recebem 39% do orçamento da saúde, de mais de R$ 6,5 bilhões.
O candidato do PT, Fernando Haddad, apresenta restrições ao modelo. Diz que não cortará os contratos vigentes, mas não ampliará as OSs. Seu principal argumento é que saúde é papel constitucional do poder público: Retomaremos o papel da administração municipal na gestão das políticas de saúde e em consonância com os princípios do SUS.
No Rio de Janeiro, com R$ 1,32 bilhão comprometido com a folha de pagamento, a estratégia municipal para poupar com pessoal é contratar OSs. Atualmente, essas entidades são responsáveis por gerir quase 100 unidades de saúde do município, entre Clínicas da Família, Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) e Coordenações de Emergência Regionais (CERs). Só este ano foi R$ 1,27 bilhão em contratos com as OSs na cidade.
A diferença do salário dos contratados diretamente pela prefeitura e os terceirizados via OSs pode ultrapassar R$ 3 mil - fato amplamente criticado por quem é concursado na rede municipal. Segundo aSecretaria Municipal de Saúde, não há perspectiva de equiparação salarial entre concursados e contratados por OSs.
Mesmo pagando salários maiores, as OSs não conseguiram reter os profissionais no Rio. As condições estressantes de trabalho no atendimento de emergência e a falta de perspectiva profissional são as reclamações dos profissionais que permanecem pouco tempo nas UPAs. Entre os médicos entrevistados pelo Valor, houve quem permanecesse só quatro plantões em uma UPA.
Na fiscalização promovida pelo Conselho Regional de Medicina do Rio (Cremerj), das 22 unidades geridas por OSs visitadas, a falta de médicos foi constatada em 13 delas. Entre as UPAs, faltava médicos em todas as oito unidades fiscalizadas. A alta rotatividade de profissionais é a marca dos estabelecimentos geridos pelas OSs, diz o presidente do sindicato dos médicos, Jorge Darze.
Os contratos com as OSs do prefeito e candidato à reeleição, Eduardo Paes (PMDB), são o principal alvo das críticas dos candidatos de oposição Marcelo Freixo (PSOL) e Rodrigo Maia (DEM) na saúde. Eles defendem a realização de concursos públicos e o desenvolvimento de um plano de cargos e salários para valorizar os profissionais e aumentar o número de médicos na rede pública. Ambos querem cancelar os contratos com as OSs no longo prazo.
Para Freixo, o modelo representa a privatização da saúde. Um plano de cargos e salários é decisivo, é o que fazer um médico ficar no hospital público, diz Freixo, que afirma que médicos se aposentam ou se licenciam do serviço público para trabalhar em OSs.
Em 2011, o Tribunal de Contas do Rio apontou variações de até 167% na contratação de serviços por OSs. Esse é um dos motivos que levou o Supremo Tribunal Federal (STF) a negar recurso da prefeitura contra ação antiga do Sindicato dos Médicos (Sinmed-RJ), de 2000. A decisão, de 17 de setembro, determina que os cargos da saúde devem ser atribuídos a servidores admitidos por concurso público. A prefeitura pode recorrer.
O secretário de Saúde da prefeitura petista de São Bernardo do Campo e presidente do Conselho de Secretários Municipais de Saúde do Estado de São Paulo (Cosems), Arthur Chioro, é crítico da terceirização por OSs. Para ele, há dois problemas: são pouco permeáveis ao controle público e têm lógica voltada ao resultado.
Se sobrepõem ao interesse público nas necessidades tanto do gestor como do usuário, diz Chioro, ressalvando que qualquer generalização corre o risco de cometer injustiças. Em qualquer área existem organismos movidos por interesses republicanos e outros por interesses indefensáveis, diz Chioro, que é formado em medicina e já foi secretário de saúde de São Vicente (SP), dirigiu o Departamento de Atenção Especializada do Ministério da Saúde e atuou como consultor da Organização Panamericana de Saúde (OPAS) e das secretarias estaduais de Saúde do Rio de Janeiro, Bahia, Pernambuco, Goiás e Mato Grosso.
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