Doze livros de Saramago são "proibidos" pelo Opus Dei, revela DN
Doze livros de José Saramago estão entre os classificados com os mais altos níveis de interdição do Opus Dei a nível internacional, num Index que envolve 79 obras de autores portugueses, incluindo Eça de Queirós, Fialho de Almeida, Vergílio Ferreira, Miguel Torga, Lídia Jorge ou David Mourão-Ferreira. Esta é uma das revelações de um extenso trabalho de reportagem feito pelo jornalista Rui Pedro Antunes e publicado no dia 28 de janeiro no Diário de Notícias.
O dossier analisa as formas de financiamento e o milionário património do Opus Dei, organização criada por Escrivá de Balaguer e presente em Portugal em várias áreas do poder político e económico. Inclui uma entrevista com o líder do Opus Dei em Portugal, José Rafael Espírito Santo, e depoimentos de responsáveis da Igreja Católica.
A existência de um Index de livros - de ficção e de não ficção - é outro tema essencial deste conjunto de textos do Diário de Notícias, que entrevista a propósito a presidenta da Fundação José Saramago. "Só me surpreende que não estejam nessa lista todos os livros de José Saramago", diz Pilar del Río, que considera o Opus Dei "uma seita para castrar". Sublinha que José Saramago nunca escreveu sobre a mesma porque "essa seita é uma formiga e por isso não lhe interessava para nada". Os livros de Saramaga que o Opus Dei proíbe aos seus membros são: Caim, O Evangelho segundo Jesus Cristo, Manual de Pintura e Caligrafia e Memorial do Convento.
Lídia Jorge, cujos livros A Costa dos Murmúrios e O Dia dos Prodígiostêm também o nível mais alto de interdição, diz que este Index é "uma vergonha", uma listagem "feita por gente retrógrada e abstrusa". E acrescenta: "São pessoas que desprezo porque se armam em mentores, em guardas morais, quando, no fundo, revelam uma ignorância absoluta sobre o papel da literatura".
De Eça de Queirós, o Opus Dei proíbe, com o nível mais alto, A Relíquia,O Crime do Padre Amaro e O Primo Basílio. Os Maias, A Capital eCorrespondência de Fradique Mendes estão no segundo nível mais alto de proibição, isto é, são "livros que não é possível ler exceto com a autorização da Cúria".
Os autores portugueses não estão sozinhos nesta lista que tem seis níveis de interdição, o mais alto dos quais é de "leitura absolutamente proibida". Dela fazem parte 14 dos 15 últimos prémios Nobel da Literatura (apenas se exclui Le Clézio), e Mario Vargas Llosa é o que tem mais obras indiciadas, num total de 17, vindo logo a seguir José Saramago com doze.
Também na não ficção a lista revelada pelo Diário de Notícias é e extensa e variada, indo desde Marx e Freud a Jean-Jacques Rousseau, Charles Darwin e Hitler. Entre as obras portuguesas, estão Portugal Amordaçado de Mário Soares, A Revolução de 1383 de António Borges Coelho e até a História da Literatura portuguesa de António José Saraiva e Óscar Lopes.
Na imagem, ilustração de Helder Oliveira para o DN
A CENSURA É AQUI... parafeaseando o Hawai, é aqui.
ResponderExcluirOpus Dei, numa tradução literal "Obra de Deus" configura-se num ajuntamento poderoso, reacionário e moralista-conservador de extrema direita; forte no Brasil, onde temos figuras proeminentes como membros ativos, inclusive no PR. Mas, como a matéria postada pelo Mario está boa demais para eu dar pitaco, peço licença para "falar" da censura brasileira contemporânea. Censurar, ato tão vivo entre os anos 60 a 80 começa a ser melhor entendido, com evidência científica. Recentemente 28 caixas escondidas no Arquivo Nacional de Brasília eternizaram parte de uma história que permanece com páginas incompletas. A coleção reúne documentos dos censores sobre livros publicados no período que segue a criação do AI 5, em 1968.
A pesquisadora Sandra Reimão, da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP, criou a lista até agora mais completa de livros submetidos à censura durante os anos de chumbo. O estudo está disponível no excelente livro "Repressão e resistência – Censura a livros na ditadura militar", patrocinado pela FAPESP. Nele podemos compreender melhor os critérios do alto e do baixo clero militar para definir uma obra como liberada ou não para a pautuléia ignóbia - Nós!. Sob o pretexto de preservar a ordem e os bons costumes foram guilhotinados livros como "O mundo do socialismo", de Caio Prado Junior, e eróticos, como "Tessa, a gata", de Cassandra Rios.
Não resitiram à tesoura também "Feliz Ano Novo", de Rubem Fonseca, "Zero", de Ignácio de Loyola Brandão, "Dez histórias imorais", de Aguinaldo Silva; e "Carniça", de Adelaide Carraro. O livro também aborda peças teatrais publicadas em livros em que são citados os textos "Papa Highirte", de Oduvaldo Vianna, e "Abajur lilás”, de Plínio Marcos.
Mas, já tendo ido longe demais, volto aos tempos de hoje, cujo modus pensandi e operandi me parece é assemelhado à censura militar e ao Opus Dei, apenas com um discurso mais "lustrado" e politicamente (in)correto. Falo do analfabetismo histórico de censurar Monteiro Lobato com o argumento de que sua obra é racista, etc, etc. Racismo é não discutir o racismo censurando Lobato. hoje até setores importantes do MEC e do Judiciário reconhecem o equívoco, mas... Lobato continua persona-non-grata das escolas públicas brasileiras.
Enfim, o Opus Dei é aqui...
Abraços, Antonio Carlos Nascimento (SMS Ctba e UP)