Segundo delações do doleiro Lúcio Funaro, a liberação do capital estrangeiro na saúde, por meio da Medida Provisória 656/2014 e posterior Lei 13.097/2015, foi obtida mediante propina paga por empresas de planos de saúde e hospitais privados, conforme notícia destacada nos meios de comunicação.
A se confirmar o conteúdo da delação de Funaro, a Associação Brasileira de Saúde Coletiva – Abrasco, juntamente com entidades da saúde e da sociedade civil, acionarão os mecanismos necessários para que a inconstitucionalidade da lei do capital estrangeiro seja analisada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), com fundamento na existência de vício na sua origem.
A aprovação da lei não cumpriu os ritos básicos para uma mudança constitucional em tema de grande relevância social, que é o direito à saúde.
A tramitação origina-se de uma emenda inserida em Medida Provisória – MP editada no apagar das luzes de 2014. A MP 656, enviada ao Congresso, tinha como tema principal créditos e incentivos tributários. A autorização para a atuação do capital estrangeiro na saúde caracterizou-se como “contrabando legislativo” por referir-se a objeto desconexo do texto originário. Esse tipo de prática encontra-se expressamente vedado pelo STF desde 2015, com o julgamento da ADI 5127/DF.
Além do “contrabando”, não foi caracterizado o requisito constitucional básico de urgência, necessário para a submissão e aprovação de uma MP. Como se não bastasse, o autor da emenda é um deputado do PMDB que teve campanha eleitoral financiada por empresa de plano de saúde, o que evidencia flagrante conflito de interesse.
Conclui-se que, além de vícios nos motivos e acordos escusos que levaram à edição da lei – conforme delatou Funaro –, há também vícios formais na sua elaboração.
Logo após a aprovação sumária da legislação, entidades do Movimento da Reforma Sanitária lançaram movimento alertando sobre os interesses e lobbies que prevaleceram, de planos de saúde e hospitais privados, que sempre visaram a ampliação do capital estrangeiro em seus negócios. As entidades demonstraram que a nova lei desrespeitava a Constituição e a Lei Orgânica da Saúde, que previam a participação do capital estrangeiro apenas em casos excepcionais, e não em regra. E, ainda, que a abertura irrestrita representaria mais um passo rumo à privatização da saúde e ao desmonte do SUS. Sem sucesso, apelaram ao veto da ex-presidente Dilma Rousseff, enquanto a ampliação do capital estrangeiro era defendida abertamente pelo Ministério da Saúde.
O Partido Socialismo e Liberdade – PSOL, com participação de entidades da saúde, acionou então o STF com a Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 5435, questionando a validade do artigo 142 da Lei Federal 13.097/2015. O argumento é que a lei, ao alterar o art. 23 e inserir o art. 53-A na Lei Orgânica da Saúde (Lei 8.080/1990), e permitir participação direta ou indireta de capital estrangeiro na assistência à saúde, afronta os artigos 196, 197 e 199, § 3 o , da Constituição da República.
Por entender que a matéria apresentava “relevância e especial significado para a ordem social e a segurança jurídica”, a relatora da ação no STF, ministra Rosa Weber, aplicou ao caso o rito abreviado previsto na Lei 9.868/1999 (Lei das ADIs). A medida faz com que a ação seja julgada pelo Plenário do STF diretamente no mérito.
Em 2016 a Procuradoria Federal dos Diretos do Cidadão – PFDC, do Ministério Público Federal, encaminhou ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot, nota técnica reforçando a inconstitucionalidade da Lei do capital estrangeiro na saúde.
Em julho de 2017, Rodrigo Janot, em manifestação ao STF, contrariou a PFDC, opinando que a Lei do capital estrangeiro na saúde não fere a Constituição.
Diante do fato novo e gravíssimo, de que a lei pode ter sido “comprada”, fruto de corrupção, resultado do esquema de venda de medidas provisórias, a Abrasco defende rigorosa investigação sobre eventuais envolvimentos, tanto de empresas da saúde quanto de agentes públicos do Legislativo e do Executivo.
Ao mesmo tempo, a Abrasco apela desde já à Ministra do STF, Rosa Weber, relatora da ADI 5435 contra a Lei 13.097/2015, que considere as circunstâncias recém divulgadas, de que houve vício na aprovação da norma legal, como elemento para a aplicação da inconstitucionalidade e nulidade da lei pelo Supremo.
O pagamento de propina, a compra de votos e a influência corrupta sobre o Congresso Nacional atentam contra princípios previstos na Constituição Federal – Artigo 37, e transformam o Processo Legislativo (artigo 59 e seguintes) em um instrumento de negócios particulares ilícitos, afrontando o interesse público e a democracia.
As evidências sobre a atuação de forças econômicas na promoção de políticas contrárias ao SUS e ao direito universal à saúde exigem urgência na reversão de uma norma legal imposta por empresas que compram leis.
Exigimos a Nulidade da Lei 13.097/2015!
Pelo Direito Universal à Saúde!
Associação Brasileira de Saúde Coletiva
14 de setembro de 2017
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