Exames citopatológicos das pacientes são analisados por amostragem, denunciam enfermeiras da rede pública
Toda mulher, após a primeira menstruação, deve fazer o exame para prevenção do câncer do colo do útero, anualmente – ou, com menor frequência, a critério do médico.
Também conhecido como exame Papanicolau, o procedimento é feito durante um exame ginecológico, antes do exame de toque, onde um aparelho chamado espéculo vaginal é introduzido na vagina para que o colo do útero seja facilmente visualizado. Com uma espátula ou uma escova especial, o médico coleta algumas células do colo do útero e da vagina e as coloca numa lâmina de vidro. Essa lâmina com as células é examinada em um microscópio para que sejam identificadas anormalidades que sugiram que um câncer possa se desenvolver (lesões precursoras) ou que já esteja presente.
Fundamental para a saúde da mulher, as amostras coletadas das pacientes da rede pública de saúde de Pelotas estavam sendo analisadas por amostragem, ou seja, de cada 500 exames, cerca de 5 eram analisados. “Desconfiamos pois os laudos vinham sempre com o mesmo teor: exame normal. Isso não é possível já que algumas pacientes apresentavam lesões aparentes”, observa a enfermeira J.
Ela passou a enviar para o laboratório, exames marcados com uma “bolinha”, de pacientes que estavam visivelmente com lesão. “Eles voltavam com o resultado ‘normal’”.
Outra enfermeira que prefere manter o anonimato, relata que essas repetições de resultados vêm ocorrendo nos últimos 6 anos. “Até então, as mulheres de Pelotas apresentavam índices de câncer semelhantes ao resto do Brasil, mas nos últimos seis anos caiu para quase zero, isso não é real”, observa.
O câncer de colo de útero é o terceiro mais frequente entre as brasileiras, atrás apenas do de mama e do colorretal. Em 2016, foram 16.340 novos casos, segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA).
Na Unidade Básica de Saúde da Bom Jesus, a suspeita dos exames por amostragem teria sido registrada em ata e encaminhada para a secretária Ana Costa, em março deste ano.
“As pacientes já estão chegando no Hospital Escola da UFPel em estágio avançado de metástase, mas os exames diziam que estavam normais”, observa J. Segundo ela, pacientes com ectopia (feridas no colo do útero) e NIC I, II e III recebiam laudos negativos para câncer. NIC é a neoplasia intra-epitelial cervical, com graus que variam de lesões de baixo grau (I) a lesões de alto grau (II e III).
Estas alterações das células são descobertas facilmente no exame preventivo Papanicolau, e são curáveis na quase totalidade dos casos. Por isso é importante a realização periódica deste exame. E é fundamental que a paciente receba seu laudo individualizado para, em caso de alteração, iniciar o tratamento o quanto antes.
“Pacientes jovens, com exames falsos, dizendo que estava tudo normal, mas que na verdade estavam com câncer em estágio avançado é uma situação revoltante, não podemos mais ficar caladas”, disse J.
SECRETARIA DE SAÚDE VAI TROCAR LABORATÓRIO
A secretária de Saúde de Pelotas, Ana Costa, falou com a reportagem do Diário da Manhã e disse que já havia recebido a denúncia sobre os exames com resultados repetidos. “Mas foi uma denúncia informal, há cerca de três semanas. Não há nenhuma reclamação formalizada na Secretaria”, observa Ana Costa.
A secretária disse que já está providenciando a troca do laboratório que realiza os exames citopatológicos. “A licitação para a contratação de um novo laboratório está em fase adiantada e já temos inclusive parecer do Conselho Municipal de Saúde”. Ela salienta que – além desses exames – haverá melhoria dos processos de ultrassonografia, com mais exigências para os diagnósticos das pacientes. (HFJ)
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