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terça-feira, 15 de dezembro de 2020

Rudá Ricci: "Está em curso um alinhamento dos setores empresariais para abocanhar fundos públicos da educação e saúde"

Por Rudá Ricci @rudaricci no Twitter

Bom dia. Farei um mini fio analisando como empresários, Centrão e Bolsonaro decidiram mirar nos fundos públicos da educação e saúde neste último período e o papel do Centrão na manutenção dos índices de aprovação do governo federal. Lá vai fio:



1) Postei agora há pouco uma nota de Daniel Cara em que se revela o desvio de recursos públicos do Fundeb para a iniciativa privada: quase 16 bilhões. Não se trata de uma "ajuda" ao Sistema S ou às escolas filantrópicas. Trata-se de disputa por recursos públicos pelos empresários

2) O texto de Daniel Cara informa que "Em 2019, conforme análise de dados da Receita Federal produzida por João Marcelo Borges (FGV), concluiu-se que as entidades filantrópicas e confessionais receberam 6,37 bilhões de dinheiro público (...) e o Sistema S recebeu R$ 21 bilhões."

3) Fica nítido que está em curso um alinhamento dos setores empresariais para abocanhar fundos públicos da educação e saúde. Na saúde, a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) publicou as “Diretrizes para um modelo de atenção integral em saúde mental no Brasil“

4) O documento “Diretrizes para um modelo de atenção integral em saúde mental no Brasil” é um nítido ataque aos fundos públicos da área da saúde mental. O ataque procura voltar ao passado, focando no isolamento da pessoa com sofrimento mental em hospitais. Quem ganha com isso?

5) Então, parece claro que há uma orquestração do empresariado na captura de recursos públicos da saúde e educação. Se não conseguem revogar o orçamento público vinculado às duas áreas, decidiram atacar pelos flancos.

6) Nesta manobra e focalização na saúde e educação, o empresariado conta com um aliado de peso: o Centrão. Este bloco de centro-direita movimenta-se politicamente na captura do Estado e comando da política nacional. Vou usar alguns termos caros à ciência política para explicar


7) Gramsci fazia uma analogia entre as ações militares e ações políticas. O autor italiano articulava a guerra de movimento com a guerra de posição, ações de avanço pontuais com ocupação de espaços "entrincheirados"

8) Gramsci dizia: “A verdade é que não se pode escolher a forma de guerra que se quere a menos que se tenha imediatamente uma superioridade esmagadora sobre o inimigo". Este é o caso: quem avança não é Bolsonaro, mas o Centrão. E avança sobre o Estado e recursos públicos

9) Então, temos iniciativas e avanços tópicos ao longo deste ano em que o Centrão negociou com o general Luiz Eduardo Ramos o ingresso no governo federal para "pacificar" a relação com o Congresso. A aliança foi bem além deste armistício

10) Com a vitória do Centrão nas eleições municipais, este bloco se transformou no que Poulantzas - também empregando conceitos gramscianos - denominou de "bloco no poder": uma unidade conjuntural de comando do mundo político por frações da elite.

11) Gostaria, então, de sugerir que a estabilidade do apoio popular (em 37%) ao governo federal deve-se ao Centrão e às suas orientações e movimentações recentes. Bolsonaro não é o centro da política nacional. O Centrão é tão hábil e hegemônico que já lança pontes para a esquerda

12) A candidatura de Arthur Lira para a presidência da Câmara de Deputados é parte central desta consolidação da hegemonia do Centrão. Não se trata de trocar Maia por Lira, mas de forjar um acordão entre Centrão, Bolsonaro, militares e centro-esquerda

13) PSB, PDT e PT são alvos nítidos deste avanço do Centrão no cenário político. Merece atenção. Atenção nos movimentos do Centrão, mas, principalmente, nos movimentos de deputados de centro-esquerda. Aí está o futuro dos recursos públicos em saúde e educação. (FIM)

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