No dia 5 de fevereiro, o Grupo de Defesa da Seguridade Social na Reforma Tributária, do qual o Cebes participa ativamente, se reuniu em Brasília para discutir a proposta de Reforma Tributária que tramita na Câmara do Deputados. A PEC 233/08 simplifica o sistema tributário federal, criando o imposto sobre o valor adicionado federal (IVA-F), que unificará as contribuições sociais, extingue e incorpora a contribuição social sobre o lucro líquido ao imposto de renda das pessoas jurídicas, estabelece mecanismos para repartição da receita tributária, institui um novo ICMS que passará a ter uma legislação única, com alíquotas uniformes, e será cobrado no estado de destino do produto, desonera a folha de pagamento das empresas, acaba com a contribuição do salário-educação e parte da contribuição patronal para a Previdência Social.
O grupo manifesta preocupação com a PEC 233/08, pois reconhece o perigo que essa proposta representa para o sistema de Seguridade Social caso seja aprovado com o texto atual. Para as entidades que participam desse debate, essa proposta traz graves consequências ao financiamento das políticas sociais no Brasil, ameaçando de forma substancial as fontes exclusivas que dão suporte às políticas da Seguridade Social (incluindo Previdência, Saúde e Assistência Social), Educação e Trabalho.
Em 2009, diz trecho da carta elaborada pelo grupo, essas contribuições sociais, que serão extintas, deverão arrecadar R$ 235 bilhões. Estão em jogo as fontes, assim como as prioridades para aplicação desses recursos. Particularmente na área da Seguridade Social, a proposta de Reforma - oriundo do Executivo e já aprovado na Comissão Especial da Câmara dos Deputados - prejudicará ainda mais, em termos quantitativos e qualitativos, a capacidade de atendimento do sistema de saúde pública nas suas múltiplas funções, seja de vigilância sanitária, consultas, internações, vacinações, etc. Afetará diretamente a vida de 26 milhões de titulares de benefícios pagos pelo INSS (Previdência e Assistência Social) e de cerca de 6 milhões de trabalhadores que recebem o seguro desemprego.
Além desses credores de direitos protegidos pela Constituição (cujo piso de benefícios é um salário mínimo), a proposta contraria os recursos de 11 milhões de famílias que participam do “Bolsa Família”, ou seja, milhões de pessoas que recebem até um salário mínimo com esse benefício. A proposta de reforma inviabilizará ainda qualquer expansão dos programas de saúde, previdência ou de assistência social, comprometendo igualmente qualquer projeto de sociedade, social e economicamente mais justo.
A PEC, se aprovado na forma atual, subtrai recursos e quebra salvaguardas constitucionais de benefícios e programas sociais e serviços públicos, atualmente protegidos pelo art. 195 da Constituição Federal de 1988. Desconstruida a capacidade de financiamento da Seguridade, desmoronam a construção e a efetividade de direitos declarados em várias partes do texto constitucional.
É fundamental, diz o documento, que o Governo Federal esclareça à população sobre as implicações sociais e políticas da reforma. O grupo portanto entende a necessidade de se fazer uma reforma tributária, reconhecendo os objetivos positivos da PEC 233/08, em especial no que se refere à simplificação do sistema tributário brasileiro. No entanto, não concordar com a proposta em curso que põe em risco os direitos sociais, especialmente dos pobres. "É preciso que o Congresso Nacional e o Poder Executivo abram o debate com a sociedade civil organizada para que se evitem tais prejuízos e que se busquem alternativas que preservem tais direitos arduamente conquistados pela população brasileira", observaram os partipantes da reunião. O grupo conclama a sociedade para essa discussão.
CNBB LANÇA CARTA EM DFESA DOS DIREITOS SOCIAIS
Para a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a proposta de reforma representa a perda de garantia de recursos necessários ao atendimento dos direitos sociais básicos. Se aprovada na forma atual, a PEC 233/08 quebrará salvaguardas constitucionais, acabando com a garantia de destinação exclusiva de recursos para a Seguridade. Na medida em que transforma contribuições sociais em impostos, modifica a natureza das fontes de recursos atualmente assegurados pelo art. 195 da Constituição para o financiamento da Seguridade Social. É o que afirma em nota entitulada "Em defesa dos direitos sociais básicos sob ameaça na proposta de Reforma Tributária", divulgada em 13 de fevereiro.
REFORMA TRIBUTÁRIA PREJUDICA A PROTEÇÃO SOCIAL
No dia 3 de fevereiro, oficina convocada pelo deputado Darcisio Perondi (PMDB-RS), tratou mais uma vez do tema. Participaram parlamentares e representantes de diversas entidades ligadas ao setor de seguridade social - entre elas Unicamp, Abres, Conasems, Conass, Confin-CNS, entre outros -, preocupados com o texto da Reforma Tributária em tramitação na Câmara dos Deputados (PEC 233/08) . Após diversas análises, reuniões e oficinas, inclusive com a participação do relator, o deputado Sandro Mabel (PR-GO), o grupo chegou à conclusão de que a reforma é necessária, mas que o texto já aprovado pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados é ruim para todo o setor de proteção social, que inclui saúde, previdência, assistência social, trabalho e educação, e não pode seguir adiante no Parlamento. O grupo promete lutar para impedir a votação da proposta de Reforma Tributária nos termos atuais e trabalhar para a aprovação de uma Emenda Aglutinativa Global que corrija os problemas do texto.
A oficina tomou como base o relatório-síntese do Deputado Sandro Mabel sobre o Projeto de Reforma Tributária apresentado pelo Governo, a Carta Social e do Trabalho (documento do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho do Instituto de Economia da Unicamp, organizado pelo professor Eduardo Fagnani), o documento de acompanhamento e análise da área de políticas sociais do Ipea, as reflexões preliminares sobre o impacto da Reforma Tributária no financiamento da Seguridade Social e, especificamente da Saúde, de Elias Jorge, Ana Cleusa Serra Mesquita e Jomar Miranda, e as reflexões a respeito da interface entre Seguridade Social e Fiscalidade no Brasil, de José Roberto R. Afonso e Gabriel Gdalevici Junqueira.
Abaixo, a síntese da oficina, realizada na Comissão de Orçamento, no Congresso Nacional.
"A REFORMA TRIBUTÁRIA E A ÁREA DE PROTEÇÃO SOCIAL: SAÚDE, PREVIDÊNCIA, ASSISTÊNCIA SOCIAL, EDUCAÇÃO E TRABALHO"
O grupo reconhece a necessidade premente de se fazer uma Reforma Tributária no Brasil. A Reforma Tributária, necessária, seria aquela que tivesse como prioridade atingir um estado de justiça tributária. Nesses termos, entende-se que a mesma depende tanto da arrecadação quanto da destinação dos recursos. Do lado da arrecadação, seriam características essenciais desta reforma: o caráter de progressividade da tributação, onerando quem mais tem; que tribute mais patrimônio e renda e menos o consumo; que apresente a maior e mais diversificada base de financiamento; que onere mais diretamente as pessoas físicas que as jurídicas; que permita uma arrecadação mais eficiente, de baixo custo e de melhor fiscalização. Concomitantemente, do lado da destinação de recursos, a
Reforma deve assegurar também o maior grau de justiça alocativa, priorizando áreas com maior impacto e distributivo, a exemplo do que fazem as contribuições sociais hoje.
O ponto de partida foi a apresentação de alguns dos técnicos que produziram os documentos de referência com suas análises. O ponto central foi a exposição e o debate com o deputado Sandro Mabel, relator do projeto, que mostrou e defendeu seu relatório.
Foram ao final apresentadas quatro questões aos debatedores presentes para uma tomada de posição:
1. O ATUAL PROJETO DE REFORMA TRIBUTÁRIA É BOM OU RUIM PARA A ÁREA DE PROTEÇÃO SOCIAL?
O grupo considera que o atual Projeto de Reforma Tributária, em votação no Congresso, é RUIM para a área de proteção Social. Ele é incapaz de responder às necessidades de enfrentamento da crise estrutural no sistema capitalista capitaneada pelo capital financeiro. O projeto não prioriza a importância dos recursos específicos para a seguridade social (previdência, assistência, saúde) e para as políticas sociais do trabalho e da educação, como o fez a Constituição de 1988.
2. POR QUE MOTIVOS O PROJETO DA REFORMA TRIBUTÁRIA EM DISCUSSÃO É RUIM PARA A ÁREA DE PROTEÇÃO SOCIAL?
O grupo fez a avaliação que o atual Projeto de Reforma Tributária é ruim para a área de Proteção Social destacando entre muitos pontos os seguintes:
a) Este projeto de Reforma Tributária, na conjuntura de crise que se vive, pode congelar uma situação tributária desfavorável à área de Proteção Social. Ao propor um percentual fixo da receita de impostos para custeio da Proteção Social, define o gasto a partir de uma restrição orçamentária o que representa uma "camisa-de-força". Impede a efetivação de direitos ainda não plenamente implantados, bem como novas conquistas evolutivas na Proteção
Social. Tende a estimular conflitos entre as sub-áreas da Proteção Social com consequente perda na qualidade do sistema.
b) A defesa de que o projeto seja neutro não se sustenta pois ele defende um nivelamento de todas as áreas, sepultando o conceito de destaque e prioridade da área de Proteção Social. Embora, no projeto estejam mantidos
mecanismos de vinculação de recursos, a saúde, previdência, assistência social, educação e o trabalho perderão as contribuições sociais que são fontes exclusivas de financiamento, criadas pelo Constituinte, que representam a prioridade concedida à Proteção Social, dentre as diversas ações e programas de governo.
c) A Reforma proposta retira as receitas próprias e específicas da área de Proteção Social e a coloca dependente de um conjunto de receitas concorrentes com as receitas de transferências municipais (FPM) e estaduais (FPE). Trata-se de um retrocesso, tendo em vista que a criação das Contribuições Sociais, assim como do Orçamento da Seguridade Social, pelos Constituintes buscou justamente resguardar a área social, uma vez que, historicamente, a mesma foi prejudicada na disputa intraorçamentária.
d) A Reforma faz uma substituição de fontes de contribuições sociais, sem prejuízo de outras fontes, por uma vinculação tributária frágil, sem garantia desses direitos e menos ainda de sua ampliação.
e) As contribuições têm características próprias quais sejam a possibilidade de ter um menor prazo de aplicabilidade quando criadas e ter alíquotas variadas. Por exemplo, a CSSLL das pessoas jurídicas tem uma alíquota própria para o Sistema Bancário o que não é possível aos impostos que só podem ter alíquotas sem diferenciação por atividade ou setor econômico. Além disso, é importante ressaltar que as contribuições sociais, podem ser regressivas/injustas na cobrança, mas na alocação para às políticas de direitos sociais assegura o princípio da justiça . Não se pode abrir mão de estratégias tributárias mais progressivas que poderiam ser colocadas em prática ao taxar diferenciadamente os diversos setores da economia. Constuticionalmente, essas fontes são diferentes dos impostos, podem ser majorados sempre que demandado, até mesmo no mesmo ano; podem diferenciar as empresas, por ramo ou setor de atividade, por porte, pelo uso intensivo de mão-de-obra etc.
e) Faltam receitas próprias da área de Proteção Social que serviram historicamente de escape para situações emergências. Como não haverá mais fontes exclusivas, cada vez que precisarmos definir mais recursos para a saúde, a educação, a geração de emprego, ou a infra-estrutura, será necessário aumentar a receita desses novos impostos. Qualquer acréscimo beneficiará sub-áreas de Proteção Social e igualmente a outras que podem não ter á mesma necessidade. O que parece justo, esconde o fato de que, com a reforma, a área de Proteção Social não poderá mais ser priorizada. Esta Reforma dará tratamento de igualdade a ações e prioridades desiguais.
f) Nas receitas estaduais abre-se a possibilidade para todos os estados criarem fundos de desenvolvimento que subtrairiam receitas do ICMS antes da aplicação dos percentuais para a saúde (15%) e para a educação (25%).
g) Não estão claras as simulações de valores estimados a que terá direito a área de Proteção Social com a incidência da DRU no todo ou em parte da receita.
h) A desoneração progressiva da contribuição de empregados e empregadores sobre a folha tem estimativas de perda em cerca de R$ 20 bilhões, sem nenhuma indicação da fonte que fará esta compensação. Esta alteração certamente comprometerá o equilíbrio das contas previdenciárias, abrindo caminho para novas propostas de reformas restritivas de direitos.
i) Os recursos referentes ao Fundo de Compensação para Estados, por possível diminuição do ICMS, não terão os percentuais para a saúde, nem para a educação.
j) Há indicação, não explícita, de risco de implantação de DRE - Desvinculação de Receita dos Estados - e até mesmo de DRM - Desvinculação de Receitas Municipais -, a exemplo do DRU - Desvinculação de Receitas da União.
l) Uma primeira impressão é de que o projeto da Reforma Tributária tem suas possíveis virtudes, ancoradas mais em expectativas pouco sustentadas principalmente face à atual crise e um prejuízo real direto à área de Proteção Social. Isto a torna uma temeridade no presente momento.
3. QUAL A CONDUTA A SER TOMADA PELAS INSTITUIÇÕES, TÉCNICOS E MOVIMENTOS EM RELAÇÃO AO ATUAL PROJETO DE LEI DE REFORMA TRIBUTÁRIA?
O grupo defende que o atual projeto seja debatido levando em consideração os pontos acima elencados para que se efetive uma REFORMA TRIBUTÁRIA COM JUSTIÇA SOCIAL, reforçando a construção de medidas de expandir vigorosamente o papel do governo no resgate à economia debilitada nessa crise, por meio do apoio aos recursos específicos da Proteção Social.
Promover discussões e debates com a sociedade e parlamentares mostrando os pontos frágeis desta Reforma para que juntos se façam modificações na essência do projeto que mantenham o espírito dos Constituintes de 1988 que organizaram um Estado de Bem Estar ainda longe de ser atingido.
4. QUAL SERÁ A ESTRATÉGIA DE LUTA?
a) Buscar aliados entre os parlamentares para discussão do projeto, mostrando os problemas acima destacados.
b) Buscar alianças com instituições, associações e movimentos da sociedade civil para se engajarem nesta luta pela mudança do atual projeto do Governo.
c) Fazer um trabalho com os formadores de opinião e com a mídia para que ajude a debater melhor e mais profundamente a Reforma Tributária.
d) Tentar retardar a votação do projeto até que os pontos acima elencados sejam devidamente discutidos junto à sociedade e sejam radicalmente modificados para a manutenção dos princípios que nortearam o Estado de Proteção Social com fontes próprias e específicas, conquistas da Constituição de 1988.
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