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segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Copo na mão aos 16 anos

Pesquisa com estudantes mostra que o álcool entra cada vez mais cedo na vida dos jovens brasileiros

Guilherme Voitch - Colaborou Vinícius Sgarbe, especial para a Gazeta do Povo

O primeiro contato dos jovens com a bebida tem acontecido muito cedo e o hábito de beber está se fixando a partir dos 16 anos, em oposição ao que prevê a legislação brasileira – 18 anos. Oito para cada dez jovens menores de idade consomem álcool. Essas são algumas das conclusões de uma pesquisa realizada pelo Portal Educacional, em parceria com o psiquiatra Jairo Bouer. Na pesquisa, 12 mil estudantes de 96 escolas de todo o Brasil responderam, de forma anônima, o questionário on-line sobre o tema.

Para Andrea Maia de Santana, gerente da Área de Projetos da Divisão de Tecnologia Educacional da Positivo Informática, a pesquisa partiu de uma necessidade das próprias escolas. “Foi uma demanda deles e a garantia de que as respostas seriam anônimas gerou um resultado muito bom entre os alunos”, diz. Segundo Andrea, o próximo passo é utilizar as respostas para tratar da prevenção do álcool nas escolas.

“A pesquisa confirma os estudos feitos sobre o consumo de álcool entre os jovens no Brasil e no mundo e aponta para a necessidade de se discutir essas questões de forma mais séria. O jovem precisa aprender os riscos e impactos do consumo abusivo de álcool”, diz Bouer. E a ação preventiva precisa começar muito cedo. A pesquisa mostra que pelo menos metade dos adolescentes até 13 anos admite já ter bebido.

Alguns grupos parecem ter chance maior de ter problemas com o consumo de bebida. São eles: filhos de pais que nunca viveram juntos, jovens que têm relação ruim ou péssima com os pais em casa, famílias em que pai e mãe bebem demais, jovens e famílias que não seguem uma religião, alunos com péssimo desempenho na escola e que faltam demais às aulas.

Para especialistas, os dados confirmam uma realidade cada vez mais preocupante. De acordo com o estudo, em 40% dos casos o primeiro gole ocorre em casa ou na casa de familiares. “Estamos falando de um comportamento aparentemente inofensivo. Mas o pai abre uma garrafa de vinho durante a refeição e pode despertar a doença do álcool no filho”, diz o membro da Pastoral da Sobriedade, José Augusto Soavinski.

Quase 15% dos jovens também mostraram que pai, mãe ou ambos bebem excessivamente. “O lar é uma metáfora de segurança. Tudo que existe em uma casa é, para as crianças e os jo­­vens, sinônimo de ‘sem perigo’. Quando um jovem experimenta álcool em casa pela primeira vez, ele considera um estímulo ao consumo”, afirma Albert Frie­sen, psicólogo, doutor em ciências da religião e especialista em terapia familiar.

Ele cita como exemplo o livro Filhos do divórcio, de Judith Wal­lerstein, em que é relatado o acom­­­panhamento de famílias depois da separação. A pesquisa foi feita ao longo de 25 anos e comprova que os filhos destas famílias são mais suscetíveis ao vício.

“As pessoas que têm pais separados, de alguma forma sofrem mais nas emoções. Têm, especialmente, menos limites e fronteiras. A lógica é que se dá pra sair do casamento, mesmo que se tenha prometido fidelidade até a morte, significa que limites não são exatamente necessários.”

Relação

O estudo também estabelece relações entre álcool e drogas mais pesadas. Quase 20% dos entrevistados já fumaram cigarros. Dos que já fumaram, 32% dizem ter mais vontade de fumar depois de beberem. Situação semelhante ocorre com a maconha: 8% dos entrevistados dizem já ter fumado maconha e, destes, 28% dizem ter mais vontade de fumar depois que bebem.

Soavinski, que há 20 anos dá palestras sobre os riscos do consumo do álcool em escolas, diz que é inegável o fato de que o álcool é porta de entrada para outras drogas mais pesadas, como a cocaína. “É uma sequência. Primeiro as [bebidas] fermentadas, depois as destiladas. O jovem segue e acaba nas drogas estimulantes. O responsável pela epidemia de crack que vivemos em Curitiba é o álcool. Quem começa a beber não sabe onde pode parar. O problema é progressivo, perigoso e pode ser fatal”, alerta.

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Cartilha do governo vai ajudar educadores

A Secretaria de Estado de Edu­cação (Seed) finalizou há poucos dias uma publicação destinada a instruir educadores e professores no combate ao uso de álcool e outras drogas. Se­­gundo o chefe da coordenação de De­­safios Educacionais Con­temporâneos, Sandro Cavalieri, a publicação deve começar a chegar às escolas públicas nos próximos dias. “Vamos ter artigos científicos, indicação de sites e material para quem lida diariamente com esses problemas”, explica.

Cavalieri afirma que o uso prematuro de álcool é uma realidade constantemente enfrentada pelos colégios públicos, mas ressalta que a questão não pode ser vencida só pelos colégios. “Temos oficinas de formação continuada aos sábados, para que professores, diretores e pedagogos discutam o tema. Mas é um problema social. Quando o adolescente entra nessa área de risco é preciso a mobilização dos profissionais de saúde, família, conselho tutelar, um esforço de toda sociedade, em rede.”

53% dos adultos bebe mais de uma vez por semana

Pesquisa divulgada em 2007 pela Secretaria Nacional Antidrogas, órgão ligado ao Ministério da Saúde, indica um alto consumo de bebida alcoólica também na população adulta. De acordo com o estudo intitulado 1º Levantamento Nacional sobre os Padrões de Álcool na População Brasileira, mais da metade dos brasileiros, 53%, bebe mais de uma vez por semana. Desse total, 12% têm problemas com o álcool. Por outro lado, 48% não bebem em nenhuma hipótese. A pesquisa, inédita à época, ouviu, durante quatro meses, 3 mil pessoas em todo o país.

Entre os que consomem álcool, 23% informaram que bebem frequentemente, uma ou mais vezes por semana; 29% se dizem bebedores pouco frequentes e afirmam que não fazem uso pesado de bebida. A cerveja, ou chope, é a bebida mais consumida, seguida de vinho e cachaça.

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