O recado é: chega de Lei de Cotas só no papel!
FÁTIMA OLIVEIRA, em O Tempo (via Vi o Mundo)
Médica – fatimaoliveira@ig.com.br
Com duas candidatas à Presidência da República, Dilma Rousseff e Marina Silva, a tendência é pensar que os partidos progressistas terão a decência de investir mais em candidaturas de mulheres. Não daquele tipo só para cumprir a lei de cotas de 30% para mulheres e, sem pudor, levá-las ao sacrifício e a vexames eleitorais, numa atitude de dupla moral. A demonstração do empenho de eleger mais mulheres é o rótulo de “prioridade de campanha”. O resto é conversa fiada.
Eis uma manchete reveladora: “Partidos buscam mulheres para preencher cota de 30% de candidaturas”. O conteúdo fala de caça às mulheres – como se elas estivessem fugindo da raia por analfabetismo político! “Os partidos estão à procura de candidatas para compor as chapas às Assembleias Legislativas e à Câmara dos Deputados. Embora mais da metade da população do país seja do sexo feminino, faltam aspirantes à política. A julgar pela vã batalha retórica empreendida por líderes partidários na tentativa de cooptá-las, neste pleito, assim como em 1998, 2002 e 2006, as chapas mal conseguirão integrar 15% de participação feminina”.
Após elencar desculpas rotas e esfarrapadas de figuras como Roberto Freire (PPS), o deputado federal Rodrigo de Castro (secretário nacional do PSDB) e o deputado federal Reginaldo Lopes, presidente do PT mineiro, a matéria chega ao âmago da questão: “Motivos para resistir aos apelos, elas têm”. Dizer que faltam aspirantes femininas à política é um raciocínio machista ilimitado. É muita desfaçatez que só às soleiras das eleições comecem a “caçada”, 13 anos após a Lei de Cotas (lei federal nº 9504/97)! Donde se deduz que os partidos em geral passam ao largo da seriedade no tocante à justiça de gênero.
“Algumas revelam experiências frustrantes e repassam suas histórias em família e entre amigos. A cabeleireira Izabel Lina Alves, 45, guarda triste experiência de sua aventura eleitoral, quando concorreu pelo PTN a uma cadeira na Assembleia Legislativa mineira. ‘Prometeram-me recursos para bancar a campanha e fui dando cheques pré-datados. No fim, estava endividada e só. Por isso, não pretendo voltar à política. A estrutura dos partidos está a serviço da eleição de uns poucos. E, em geral, homens”.
O que disse Izabel é voz corrente, de cabo a rabo, nos sentidos norte-sul: da nascente do rio Ailã, no monte Caburaí (RR) à barra do arroio Chuí (RS); e de oeste-leste: da nascente do rio Moa, na serra da Contamana (AC) à ponta do Seixas (PB); até o extremo leste absoluto (ponta sem nome na ilha do sul do arquipélago de Martim Vaz). E isso não significa nada para os partidos? A matéria entrevistou a chefe do Departamento de Ciência Política da UFMG, Marlise Matos, que desmontou o discurso demagógico da quase totalidade dos partidos brasileiros quando o assunto é viabilizar candidaturas femininas.
Pontuando que, quanto à presença de mulheres em cargos eletivos, a situação do Brasil é vergonhosa – décima posição mundial, com 8,8% de cadeiras na Câmara dos Deputados -, ela declarou que “nesse conjunto de 137 países estudados pela Inter-Parliamentary Union, o Brasil se iguala, por exemplo, aos países árabes, que também têm cerca de 9% de representação feminina” (Bertha Maakaroun e Ricardo Beghini, “Correio Braziliense”).
Resumo da opereta: não faltam mulheres que desejam se candidatar, mas a maioria tem coragem de dizer não às propostas indecentes de candidaturas de “biscuit”.
O recado é: chega de Lei de Cotas só no papel!
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