Portaria instituiu as Farmácias Vivas, responsáveis pelo cultivo plantas e manipulação de medicamentos
A união entre conhecimento científico e sabedoria popular é realidade para profissionais e pacientes em muitos municípios brasileiros.
As fórmulas feitas à base de plantas medicinais – aquelas receitadas pelas avós – são recomendadas por médicos em postos de saúde de todo o País. A experiência tem dado certo e pode crescer.
O Ministério da Saúde (MS) publicou, na última semana, uma portaria que instituiu as Farmácias Vivas, responsáveis pelo cultivo de plantas e manipulação de medicamentos fitoterápicos, dentro do Sistema Único de Saúde (SUS).
Na prática, esses centros já existiam e produziam para o SUS. O que muda a partir de agora é o horizonte futuro. A expectativa dos especialistas e do próprio ministério é que a formalização permita a liberação de recursos para ampliar o programa nos estados.
Hoje, segundo o órgão, existe demanda para a criação de novas Farmácias Vivas em 500 municípios brasileiros. “Em 2011, esperamos poder destinar recursos financeiros para apoiar esses projetos”, afirma o diretor de Assistência Farmacêutica do MS, José Miguel do Nascimento.
Mary Anne Medeiros Bandeira, supervisora do Núcleo de Fitoterápicos da Secretaria de Saúde do Estado do Ceará, conta que a maior dificuldade para expandir o projeto é justamente a falta de recursos. “Os municípios têm de arcar com os custos da compra de equipamentos para os laboratórios, montar a horta. Não temos verba para isso”, lamenta. O Ceará transformou as Farmácias Vivas em projeto de governo em 1997.
No Distrito Federal, os fitoterápicos entraram nos postos de saúde há 20 anos. Apesar do longo caminho percorrido pelo projeto das Farmácias Vivas, ele não expandiu. Apenas um centro, que tem 15 funcionários além dos dois farmacêuticos responsáveis, produz medicamentos utilizados por 13 centros de saúde. A justificativa para a estagnação não muda: faltam recursos.
“A portaria é importante, mas o governo federal precisa intensificar as ações de promoção do serviço, criando linhas orçamentárias específicas para melhorar a capacitação de profissionais, as instalações físicas e controle de qualidade”, afirma Nilton Luz Netto, coordenador da Farmácia Viva do DF. Segundo ele, a demanda pelos serviços da unidade é enorme.
As farmácias são resultado da Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos, traçada em 2006. As novas regras do ministério determinam que essas farmácias têm de realizar todas as etapas que envolvem a produção dos fitoterápicos: cultivo, coleta, processamento, armazenamento de plantas medicinais, manipulação e distribuição dos medicamentos. Nada produzido por elas pode ser comercializado.
Experiências de sucesso
O Ceará é um dos estados pioneiros no desenvolvimento de farmácias de fitoterapia. O primeiro projeto começou na Universidade Federal do Ceará (UFC) em 1983. Naquele ano, o professor Francisco José de Abreu Matos montou um horto matriz de plantas medicinais para garantir eficácia e segurança na produção dos remédios.
O objetivo do idealizador do projeto da universidade era fazer com que as comunidades carentes da região de Fortaleza, capital cearense, utilizassem as receitas caseiras passadas de geração em geração de modo correto. Não é raro que a população confunda as espécies de plantas e desconheça a dose ideal para ingestão desses remédios.
Mary Anne Bandeira conta que o projeto se disseminou porque, além do valor medicinal das plantas, os municípios perceberam que, com o projeto, poderiam economizar recursos gastos com medicamentos convencionais. A rede pública de saúde cearense conta com 54 farmácias (em municípios, comunidades carentes e organizações não-governamentais).
A horta da universidade tem 102 plantas com certificação botânica. Do total, 40 são usadas na produção de 15 medicamentos fitoterápicos receitados à população. Os remédios naturais das Farmácias Vivas tratam apenas doenças simples, como infecções respiratórias, dores de estômago, problemas de pele e insônia, por exemplo.
No DF, Nilton conta que os médicos e demais profissionais de saúde que trabalham na rede pública são treinados antes de o medicamento chegar aos postos de atendimento à população. “A adesão deles ao tratamento fitoterápico é cada vez maior”, conta. “Acho que uma das coisas mais importantes do projeto é a valorização do conhecimento popular e a integração dele com o conhecimento científico”, destaca Nilton.
Nove plantas são utilizadas para produzir os remédios no DF: alecrim pimenta, babosa, boldo nacional, camomila, confrei, espinheira santa, guaco, erva baleeira. Em 2009, 21 mil medicamentos foram distribuídos nos centros de saúde do DF.
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