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quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Projeto paulista para cotas discrimina ao invés de incluir, dizem professores

Para especialistas, proposta de Alckmin, de criar cursos intermediário para cotistas, é 'capciosa' e coloca negros em condição inferior


São Paulo – Em plenária aberta organizada pela Frente Pró-Cotas de São Paulo, realizada na noite de ontem (5), na Câmara dos Vereadores, com a presença de cerca de 200 pessoas, o professor e doutor em Teoria Geral do Direito, Silvio Almeida, afirmou que considera inconstitucional o programa de cotas proposto pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB), por atentar contra os princípios da isonomia e da dignidade humana. Parlamentares presentes ao evento se comprometeram a promover uma audiência pública, em março, na Assembleia Legislativa de São Paulo, convocando o governador e os reitores das universidades públicas paulistas.

Para Almeida, ao criar os chamados Colleges, com um curso semi presencial de dois anos, por conta de uma suposta defasagem, e exigências de desempenho, o governo está promovendo a discriminação. “A proposta provoca discriminação negativa, colocando o cotista em condição inferior, quando a Constituição só permite a discriminação positiva, com sentido de inclusão. Além disso, promove a ameaça do estereótipo, fazendo o negro crer que precisa de reforço, pois não teria condição de competir, o que inferioriza humanamente o cotista. Assim se viola os princípios da isonomia e dignidade humana”, explica.

Segundo o professor, a proposta de cotas do governo estadual é uma reação à luta pela instituição das cotas, com a função de afastar os cotistas da vivência acadêmica. “Quando o principal argumento anti-cotas, de sua inconstitucionalidade, foi ao chão, o governo Alckmin se viu obrigado a dar alguma resposta. Essa proposta é ilegítima, pois não surgiu do debate que o movimento negro e a sociedade vêm travando há anos. Mas o projeto é uma reação aos nossos avanços, com o objetivo de afastar o negro com espaço acadêmico, pois a universidade não é só o conteúdo, é formação humana, convívio”, explica Almeida.

Para o professor Dennis de Oliveira, do Núcleo de Apoio à Pesquisa em Estudos Interdisciplinares sobre o Negro Brasileiro da USP, o projeto é, também, uma tentativa de dificultar o acesso da comunidade negra à universidade. “A questão capciosa da proposta é limitar o acesso. Vai fazer o cotista esperar, oferece um diploma que supostamente propicia a empregabilidade na metade do processo, exigir um desempenho específico para poder acessar a universidade. Quem, saído da escola pública e vindo de uma família pobre, vai ter condições de esperar esse tempo?”, questiona Oliveira.

A deputada estadual Leci Brandão (PCdoB), lembrou que os estudantes que utilizam do sistema de cotas para ingresso na universidade são oriundos de famílias pobres e precisam de apoio para permanecer nela. “Não é só cota. É auxílio para transporte, para alimentação, a compra de livros. Eu não quero ver o jovem negro lutar para entrar na universidade e depois ter de abandonar o curso porque, sendo pobre, enfrenta outras dificuldades que vão além do entrar na academia”, disse Leci.

Uma das demandas apresentadas pela Frente era que os parlamentares presentes se comprometessem a convocar uma audiência pública na Assembleia Legislativa, com a presença do governador, Geraldo Alckmin, e dos reitores João Grandino Rodas (USP), Julio Cezar Durigan (Unesp) e Fernando Ferreira Costa (Unicamp). Os deputados estaduais Carlos Gianazzi (Psol), Adriano Diogo (PT), Alencar (PT) e Leci Brandão (PCdoB), assumiram o compromisso e afirmaram que vão trabalhar pela aprovação dos Projetos de Lei 530/04 e 321/12, que estabelecem um sistema de cotas considerado satisfatório pelos movimentos. 

A plenária foi convocada pelas entidades com o objetivo de exigir a suspensão da proposta de cotas apresentada pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB), considerada preconceituosa e equivocada pelos movimentos, por reincidir na ideia de que estudantes cotistas podem diminuir a qualidade das universidades por estarem defasados. A ação também foi proposta como uma resposta à postura "intransigente" do governo Alckmin, em não debater as cotas. No entanto, nenhum representante do governo paulista compareceu ao evento.

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