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quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Que venha o “Mais Especialidades”… Mas que venha com REGULAÇÃO REGULAÇÃO REGULAÇÃO REGULAÇÃO.


Vovó Loloca sempre diz que existe um abismo enorme entre o falar e o fazer. 

Para sorte da humanidade, este abismo não é intransponível.

Vou deixar de lado a parte do discurso que fala do “Brasil Pátria Educadora” com as boas intenções e as verbas do pré-sal entregues ao Cid Gomes (do PROS, dissidência do PSB).

Cid Gomes é o cara que disse algo assim que “professor tem que trabalhar por amor, sem se importar com o valor do salário”.

Adoraria ver esta pérola aplicada aos políticos “profissionais”.

Mas quero me concentrar na saúde.

Dilma falou assim:

"Na saúde, reafirmo nosso compromisso de fortalecer o SUS. Sem dúvida, a marca mais forte do meu governo, no primeiro mandato, foi a implantação do Mais Médicos, que levou o atendimento básico de saúde a mais de 50 milhões de brasileiros, nas áreas mais vulneráveis do nosso país. Persistiremos, ampliando as vagas em graduação e em residência médica, para que cada vez mais jovens brasileiros possam se tornar médicos e assegurar atendimento ao povo brasileiro. Neste segundo mandato, vou implantar o Mais Especialidades para garantir o acesso resolutivo e em tempo oportuno aos pacientes que necessitem de consulta com especialista, exames e os respectivos procedimentos."

Legal! O Mais Médicos foi um achado! Mexeu com o modelo assistencial, mostrou outro jeito de cuidar das pessoas e deu uma abalada muito grande na espinha dorsal do corporativismo e “classismo” de algumas profissões da área da saúde.

Ampliar o acesso a chamada “média complexidade” com o “Mais Especialidades” é um passo gigantesco para desatar um nó monstruoso na área da assistência à saúde. 

Este nó não é exclusividade do nosso SUS. Ele existe no mundo todo. 

Quer um exemplo? Veja o que acontece na Inglaterra. Se o camarada que vive lá tem que operar uma hérnia inguinal, ele provavelmente terá que esperar na fila quase um ano.

Igualzinho aqui?

Quase!

A diferença é que lá na Inglaterra o cara sabe que vai operar a hérnia dali um ano com dia, hora e hospital já designados. 

Eles tem uma coisinha que nós temos muito pouco por aqui… 

A palavra mágica que faz a diferença é: REGULAÇÃO.

Ampliar a oferta de consultas, exames e terapias sem REGULAÇÃO é suicídio…

Quer um exemplo? Aqui no Paraná a gente tem uma quantidade de mamógrafos que corresponde a quase o dobro da necessidade para a população alvo. No entanto, a razão de mamografias realizadas é de 0,36, quando deveria ser no mínimo 0,5. O dobro de equipamentos realiza só 2/3 da necessidade.

O equipamento existe, mas as pessoas não chegam aos equipamentos que estão ociosos…

Por outro lado, procedimentos de alta complexidade são realizados em frequências discutíveis… Em algumas especialidades o índice de normalidade de exames é superior a 70%. Tomografias realizadas para investigar “dores de cabeça” chegam a ter índices de 90% de normalidade.

A isto os estudiosos chamam de “indução da demanda pela oferta”.

Se um usuário do SUS tiver um mal-estar com dor precordial, muito provavelmente em menos de 24 horas ele poderá estar dois pares de “stents” em suas coronárias… Mas se o caso for de fazer um teste ergométrico, ou um simples eletrocardiograma, pode demorar mais de 6 meses.

A palavra mágica que faz a diferença é: REGULAÇÃO.

Vou contar um caso:

Eu sou cardio-pediatra.

Há uns anos atrás, recebi um telefonema do hospital onde trabalho (região de Curitiba) dando conta de  que um bebê de 3 dias de idade com uma cardiopatia congênita grave tinha dado entrada na emergência.

Era um sábado, fui direto ao hospital e fiz o ecocardiograma do bebê. O diagnóstico foi de “Transposição dos Grandes Vasos com Septo Interventricular Íntegro”. Doença gravíssima. 90% de óbito dentro do primeiro ano de vida. Possibilidade enorme de óbito nos primeiros dias de vida.

Pessoal da UTI equilibrou o paciente, começou medicação "salva-vidas" endovenosa. A equipe cirúrgica foi acionada e a vida do bebê foi salva. Na segunda feira, dois dias depois, fiz o eco do pós operatório. Um sucesso!

Agora vem a parte interessante da coisa: o bebê tinha nascido em Tocantins! Constatado que tinha algo errado, o pessoal que atendia a criança entrou em contato com a CNRAC (Central de Regulação de Alta Complexidade).

A turma da CNRAC (que fica em Brasília) localizou o serviço disponível e colocou a criança e sua família no avião. Chegando a Curitiba a ambulância do SAMU estava na pista do aeroporto para levar a criança para o hospital.

Tudo isso pelo SUS - aquele que não funciona (SIC). Sem ônus para a família.

Uma criança precisando de um serviço complexo, nasceu em um lugar que não tem o serviço disponível.

No lugar onde existe o serviço, este funcionando com um certo grau de ociosidade.

Ambas as situações são preocupantes e custam muitas vidas (e muito dinheiro).

Daí vem alguém e coloca o bebê em contato com o serviço.

A palavra mágica que faz a diferença é: REGULAÇÃO.

Que venha o “Mais Especialidades”…

Mas que venha com REGULAÇÃO REGULAÇÃO REGULAÇÃO REGULAÇÃO.

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