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quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Relato muito interessante de uma consulta ginecológica como deveria ser



Meninas, moças, mulheres! Preciso contar que fui na ginecologista ontem. Já falei pra todo mundo que encontrei depois da consulta e agora vou espalhar aqui. Foi assim:

Uma moça de 29 anos, de vestido confortável e brincos combinando, cabelos encaracolados presos num rabo, me recebeu e levou até a sala dela, que é dentro de um casarão aconchegante em Pinheiros - fiquei em dúvida sobre quem era essa, porque não tinha nada que indicasse "médica", coisa incomum pra mim (em ambientes de saúde, eu sempre sei quem é o médico só de olhar. Faça o teste: você provavelmente também). Subindo as escadas ela disse que me atenderia e só aí identifiquei. Salvo pelos itens imprescindíveis de uma g.o. (cama forrada com papel, alguns materiais descartáveis), o lugar era como o cômodo normal de uma casa, com detalhes aconchegantes e pessoais. Sentei no sofá e continuamos conversando coisas não comuns para uma consulta. Falei um pouco sobre quem eu era e ela falou também. Me contou sobre seus planos profissionais para mais adiante. Contei do meu parto e ela disse que no futuro o dela será domiciliar. Então assim, naturalmente, o assunto foi ficando ginecológico, mas como se fosse entre amigas num café da tarde. Expliquei minhas questões e ela deu o panorama mundial, condutas, e sua experiência pessoal sobre (não experiência com as pacientes, com ela mesma mulher).

Depois ela foi ajudar para que EU me examinasse junto com ela. Não tinha aquela ferramenta de tortura psicológica chamada perneira, e acostumada a cumprir solicitações nesses ambientes, eu achei difícil escolher a melhor posição pra mim. Ela deu o instrumento para que eu mesma colocasse (aqui preciso lembrar que a última gineco que eu fui não-grávida, já faz uns 5 anos, me mandava tossir bem forte pra inserir aquilo em mim. Não era "relaxa", era "tosse de novo!" Bem inesquecível). 

Agora a parte mais incrível, e como ela mesma disse, super imagem de criação pra quem faz cênicas: com um espelho ela me mostrou o colo do útero. (Agora o texto deixa de ser descritivo porque num dá).
 
Cara, o colo do útero é lindo. Ver é bem diferente de conhecê-lo por toque. Eu saí chocada que em 25 anos nunca nenhum ginecologista dividiu comigo essa imagem de algo meu. Simplesmente uma parte muito importante está omitida das mulheres. Algumas talvez não queiram ver como é, outras talvez conheçam e achem feio, mas é uma loucura pensar que pra quase zero essa chance é dada. Eu achei muito poético. É unicamente feminino, participa do processo menstrual, da fecundação, do parto. Muda de acordo com o momento do nosso ciclo, nos dá as informações pra entendermos os processos do nosso corpo. É a parte visível de um órgão de poder. Não faz sentido nenhum que consideremos uma zona escura e desconhecida o que está além de dois dedos da entrada da vagina. Somos em grande maioria, e me incluo, ignorantes sobre nosso funcionamento, falhamos solenemente quando poderíamos entender porque x está y através de auto-percepção e só. Mas a culpa não é nossa, já sabemos bem nossas chances (ou falta de) aqui e agora. Não nos dão esse voto de confiança nem essa auto-estima para nos regermos por questões de perigo de revolução. <3 font="">

É isso. Depois conversamos mais e não precisei sair de lá com nenhuma receita médica. Eu disse que da próxima vez queria fotografar meu colo e ela me deu um espéculo (o instrumento para visualizar) de presente. No total foi uma hora de consulta-aula-papo. Queria mesmo dividir com vocês a horizontalidade dessa experiência com uma médica. A gente é muito mal-tratado por aí e não sabe da mágica que acontece quando é cuidado tipo ser humano, e considerado, e bem amparado. E também o colo do útero, não dê google, espera pra ver o seu que é super impactante. <3 font="">

Obs: O lugar se chama Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde e conta com várias ginecologistas, além de outras profissionais como advogadas e psicólogas. O valor da minha consulta foi abaixo da tabela de mercado.

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[Editando] 
Muito surpresa e feliz com a repercussão do post! Isso mostra o quanto nós mulheres consideramos importante um atendimento sensível e humanizado. Alô alô ginecologistas desse Brasil!

Vamos lá:
O Coletivo fica em São Paulo capital, e há também uma unidade em Florianópolis/SC. 
A linha telefônica delas está bastante ocupada pelas pessoas que viram a publicação, então uma das profissionais do projeto me pediu gentilmente que eu passasse também o site, onde é possível obter todas as informações: onde e como funciona o trabalho, e a história dessa iniciativa (vem sendo construída em SP desde os anos 80, por outra geração de feministas que abriu caminho para as que continuam construindo e fortalecendo esse modelo de atendimento hoje):

mulheres.org.br 

E um esclarecimento para que a informação se espalhe sem chiado: lá atendem obstetrizes e médicas de família além da ginecologista, profissionais qualificadas para esse tipo de trabalho. Algo incrível que pouca gente sabe é que uma mulher saudável não precisa necessariamente da ginecologista, porque a gine é uma profissional capacitada para o alto risco (caso de ir direto para o hospital, não numa consulta, nem mesmo com a própria médica g.o.) enquanto que no atendimento de uma mulher saudável o conhecimento engloba igualmente, e eu diria que até mais dentro da realidade brasileira, todas essas outras profissionais.

Sobre indicar a que me atendeu, de verdade, no coletivo esse modelo lindo de atendimento é o padrão, e quando pesquisei pra escolher li belas indicações para todas, sem excessão. Aliás, eu havia ligado para marcar com outra e fiquei frustrada de não ter o horário que precisava. Fui pega de surpresa por uma profissional que não escolhi. [♡]

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