Projeto de lei revoga Estatuto e libera compra e porte de armas
Proposta a ser apreciada amanhã na Câmara dos Deputados permite o armamento para todos e deixa processo de autorização mais barato
na Gazeta do Povo
Após 11 anos em vigor, o Estatuto do Desarmamento vai passar amanhã
por uma prova de fogo na Câmara dos Deputados. O projeto de lei (PL)
3722/2012, que revoga as regras estabelecidas em 2003, será votado em
comissão especial e, se aprovado, segue para o plenário. A proposta
volta a permitir o porte de armas por civis, desburocratiza a compra,
torna as taxas de registro e licença até dez vezes mais baratas e
aumenta em 50% a quantidade de armamentos que cada pessoa pode ter.
Atualmente restrito a um grupo de 11 categorias profissionais, o
porte poderia ser autorizado para qualquer cidadão. Seria preciso
comprovar aptidão técnica e psicológica, não ter antecedentes criminais e
nem estar respondendo a um processo criminal no momento do pedido.
O autor do PL, deputado federal Peninha Mendonça (PMDB-SC), diz que a
proposta tenta adequar a legislação ao pensamento da maioria da
sociedade. Em 2005, 63,96% dos brasileiros rejeitaram, em referendo, a
proibição do comércio de armas no país (a votação não fazia referência
ao porte). “O projeto apenas permite o que a maioria da população
deseja: que o cidadão de bem tenha direito de ter uma arma para se
defender”, afirma o parlamentar.
O conteúdo original, no entanto, deve ser suavizado por meio de um
substitutivo do relator da matéria na comissão especial, Cláudio Cajado
(DEM-BA). Ele antecipou que vai mudar itens polêmicos, como o prazo de
validade do registro de armas e a idade mínima para a posse e o porte.
Atualmente, o registro precisa ser refeito a cada três anos. Pelo
projeto original, a validade nunca expiraria, mas Cajado vai sugerir um
prazo de cinco anos. O relator também deve manter nos atuais 25 anos de
idade a exigência mínima para a compra de armamento, contra 21 anos
previstos no texto de Mendonça. O porte seria concedido apenas após
cinco anos de posse, ou seja, a partir dos 30 anos.
“Dentro do escopo normatizado pelo Estatuto, queremos poder encontrar
um meio termo, que permita à população o exercício do direito
constitucional de defesa da vida”, disse Cajado, durante debate com
internautas na semana passada.
Diretor-executivo do Instituto Sou da Paz, Ivan Marques classifica o
projeto como um retrocesso para a segurança pública brasileira. “Não é
apenas uma proposta que desfaz o Estatuto, mas algo que estimula o uso
de armas”, diz. Ele cita como exemplo o aumento na quantidade de armas e
de munição permitidas por pessoa.
Pelo PL, o limite de armamento por cidadão salta de seis para nove.
Já o de munição pula de 50 por ano para cada arma para 600 por ano, por
arma. “Se o cidadão tiver nove armas, terá direito a 5,4 mil munições
por ano. Ele vai usar tudo isso para legítima defesa?”
Em favor do projeto, Mendonça cita dados do Mapa da Violência,
segundo o qual 51.043 brasileiros haviam sido assassinados em 2003
contra 56.337 em 2012. Já o representante do Sou da Paz menciona um
estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicado, segundo o qual um
homicídio foi evitado a cada 18 armas tiradas de circulação graças ao
incentivo do Estatuto.
“Bancada da bala” deve garantir aprovação da ideia
A aprovação do projeto que revoga o Estatuto do Desarmamento, pelo
menos na comissão especial, é dada como certa graças à articulação da
“bancada da bala”, que reúne parlamentares que receberam doações da
indústria armamentista. Levantamento do Instituto Sou da Paz mostra que
dos 24 titulares do grupo, 17 receberam doações de empresas do setor. A
lista inclui o relator da proposta, Cláudio Cajado (DEM-BA), e o
paranaense Fernando Francischini (SD), recém-indicado para comandar a
Secretaria Estadual de Segurança Pública do Paraná.
O diretor-executivo do instituto, Ivan Marques, também questiona a
falta de discussão em torno da proposta. Das seis audiências públicas
previstas para debater o PL, apenas uma foi realizada. Foram chamados
para a discussão um debatedor contrário às mudanças no Estatuto e sete
favoráveis, além de um representante do governo federal.
A formação de uma comissão especial também encurtou a tramitação do
texto na Câmara, que originalmente precisaria ser aprovado por três
comissões permanentes antes de ser remetido ao plenário. Desde junho, o
grupo realizou apenas cinco reuniões. “A aprovação da proposta na
comissão será um belo presente aos brasileiros justamente na data em que
comemoramos o Dia Internacional dos Direitos Humanos”, ironizou
Marques.
Se for aprovado pela comissão especial e pelo plenário da Câmara, o
texto segue para o Senado. Depois, ainda depende de sanção presidencial
para entrar em vigor.
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