"Um dia, eles me levaram para um lugar que hoje eu localizo como sendo a sede do Exército, no Ibirapuera.
Lá estava a minha fi lha de um ano e dez meses, só de fralda, no frio. Eles a colocaram na minha frente, gritando, chorando, e ameaçavam dar choque nela.
O torturador era o Mangabeira [codinome do escrivão de polícia de nome Gaeta] e, junto dele, tinha uma criança de três anos que ele dizia ser sua filha.
Só depois, quando fui levada para o presídio Tiradentes, eu vim a saber que eles entregaram minha fi lha para a minha cunhada, que a levou para a minha mãe, em Belo Horizonte.
Até depois de sair da cadeia, quase três anos depois, eu convivi com o medo de que a minha fi lha fosse pega. Até que eu cumprisse a minha pena, eu não tinha segurança de que a Maria estava salva.
Hoje, na minha compreensão feminista, eu entendo que eles torturavam as crianças na frente das mulheres achando que nos desmontaríamos por causa da maternidade. Fui presa e levada para a Oban.
Sofri torturas no pau de arara, na cadeira do dragão, levei muito soco inglês, fui pisoteada por botas, tive três dentes quebrados. Éramos torturadas completamente nuas. Com o choque, você evacua, urina, menstrua.
Todos os seus excrementos saem. A tortura era feita sob xingamentos como ‘vaca’, ‘puta’, ‘galinha’, ‘mãe puta’, ‘você dá para todo mundo’... Algumas mulheres sofreram violência sexual, foram estupradas.
Mas apertar o peito, passar a mão também é tortura sexual. E isso eles fizeram comigo. Eles também colocaram na minha vagina um cabo de vassoura com um fio aberto enrolado. E deram choque.
O objetivo deles era destruir a sexualidade, o desejo, a autoestima, o corpo."
ELEONORA MENICUCCI DE OLIVEIRA, ex-militante do Partido Operário Comunista (POC), era estudante de Sociologia e professora do ensino fundamental quando foi presa, em 11 de julho de 1971, em São Paulo (SP). Hoje, vive na mesma cidade, onde é pró-reitora de extensão e cultura e professora titular de saúde coletiva da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
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