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terça-feira, 10 de novembro de 2009

Vida decente, tão normal e plena quanto possível

No Brasil, a luta pelos direitos dos portadores de deficiência visual remete às últimas três décadas

No Brasil, a luta pelos direitos dos portadores de deficiência visual remete às últimas três décadas
Ana Maria Amorim, no Brasil de Fato

De São Paulo, da Radioagência NP.

A Declaração de Direitos das Pessoas Deficientes, proclamada pela ONU (Organização das Nações Unidas), em 1975, garante o respeito à dignidade humana dos deficientes. Tão cidadãos quanto qualquer outra pessoa, os deficientes devem, segundo a declaração, "desfrutar dos mesmos direitos fundamentais" e ter uma "vida decente, tão normal e plena quanto possível".

No Brasil, a luta pelos direitos dos portadores de deficiência visual remete às últimas três décadas. A inclusão atravessa diversas esferas, como a política, a econômica e a cultural. Avanços foram conquistados desde então, mas obstáculos continuam existindo.

Em entrevista à Radioagência NP, o presidente da Organização Nacional dos Cegos do Brasil, Antonio José do Nascimento Ferreira, avalia a situação dos deficientes visuais no Brasil.

Radioagência NP: Como a legislação brasileira vê os direitos dos deficientes visuais?

Antônio José: Os deficientes visuais no Brasil somam hoje quase dez milhões de brasileiros e têm os direitos garantidos na Constituição federativa nacional e na ratificação da Convenção Internacional do Direito das Pessoas com Deficiência. Na Convenção, que se tornou lei constitucional, nós temos os direitos especificamente pertinentes às pessoas com deficiência visual, além dos que valem para deficientes em geral.

E na prática, estes direitos são efetivados?

As políticas de acessibilidade estão garantidas nestes instrumentos legais. Começam a ser efetivadas nos estados a partir de suas próprias legislações. Hoje, fazemos o balanço que a partir da lei 10.048 a 10.098, que foram assinadas há cinco anos, as questões começaram a ser mais viabilizadas diretamente, dada a exigência de que as cidades se adéquem às normas de acessibilidade entre 2010 e 2014. Vale lembrar que nós, deficientes visuais, sentimos mais necessidade [do acesso] à comunicação do que à arquitetônica, que é a mais geral para todos deficientes físicos – no caso dos deficientes visuais, o acesso às áudios-descrições e às informações em braile.

Uma das pautas dos movimentos pela inclusão dos deficientes visuais é do acesso à educação. Como você avalia este direito no país para os deficientes visuais?

No aspecto da educação, não defendemos uma educação específica para as pessoas com deficiência visual. O Brasil tem caminhado para a educação inclusiva, como defendemos. O grande problema é que não existe o suporte necessário para que o deficiente visual tenha êxito na educação inclusiva. Por exemplo, hoje é garantido o acesso dos cegos em qualquer escola, mas não é garantido o acesso ao livro em braile, à tecnologia que dê autonomia a eles em sala de aula, que tenha uma igualdade no acesso à informação.

Quanto ao acesso à cultura, o direito tem sido garantido?

Nós sentimos falta de uma política de cultura que valorize o poder artístico das pessoas com deficiência visual. Sentimos falta de atividades que nos garantam o mesmo acesso – como a áudio-descrição, novamente. Por que os cegos não vão ao cinema? Porque é um lazer que não temos acesso pleno. Como podemos assistir aos filmes quando muitas cenas são mudas e não há quem descreva para nós? Falta uma política mais incisiva que garanta essa inserção do potencial artístico dos deficientes visuais, bem como também o acesso aquilo que é produzido.

O preconceito faz parte do cotidiano do deficiente visual?

Ainda existe um preconceito muito grande. Precisamos mudar esta cultura. As pessoas valorizam muito mais o que é perfeito, o que é belo. O que é diferente tende a ser excluído. Isto é, infelizmente, uma tendência. Precisamos romper com isto. As pessoas mostram muito preconceito principalmente quando não conhecem nossa maneira de viver, nosso comportamento. Quando elas passam a conviver mais conosco, esses preconceitos tendem a ser menores.

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