no Blog do Zé Beto (recebi da minha amiga Lenora)
por Jorge Brand*
Leio a última notícia: o novo super-ônibus de Curitiba é movido a soja!! Bio diesel, ou melhor, agro-diesel. Aquele que vem das grandes monoculturas detentoras de sementes modificadas em laboratórios, aquelas que conseguiram erradicar quase que totalmente a cobertura vegetal nativa do estado. Combustível que ajuda a consolidar a industrialização da vida rural. Soa bastante sustentável e isto é o que importa. O povo logo esquece, com a novidade do super-busão azul, que R$2,50 é uma tarifa absurda e o povo também certamente já esqueceu que a licitação realizada há alguns meses foi uma das maiores farsas já vistas.
Com tudo isso não dá nem pra pensar em classificar nosso transporte de público – coletivo, pode ser, mas é privado, tem gente ganhando muito dinheiro em cima disso. A lavagem verde segue adiante, alimentando os mitos da cidade inovadora. O vídeo da CNN segue neste caminho, mostrando o quanto é ´fantástica´ esta nossa provinciana e altamente motorizada Curitiba –http://edition.cnn.com/video/?/video/business/2010/11/29/fc.curitiba.sustainable.city.cnn
Perguntamos, no entanto, até onde vai o compromisso efetivo com mudanças – socias, ambientais, culturais e econômicas – e onde exatamente começa este 'green washing', esta lavagem publicitária que não é nada mais do que um discurso do mercado e do capital para justificar a continuação de toda degradação e destruição da natureza?
Até onde vai a retórica e o mito da capital ecológica, e onde entra a verdade sobre o aterro da cachimba, as ruas entupidas de automóveis, a falta absoluta de uma política de estímulo ao uso da bicicleta como meio de transporte?
Outra super-notícia, também já esquecida com certeza, foi o corte de cerca de 99% do orçamento destinado a estrutura cicloviaria na capital (http://www.youtube.com/watch?v=HN9Ue7e1byM). Há anos os ciclistas reivindicam melhorias significativas para a bicicleta ser cada vez mais aceita como meio de transporte. As melhorias passam pela necessidade de rever uma rede de ciclovias antiga, mal sinalizada, que conduz aos parques e que não oferece a segurança ideal para quem pedala; melhorias seriam as instalações de paraciclos e bicicletários por toda a cidade; a criação de ciclofaixas e ciclo-taxis; a integração dos ônibus com as bicicletas; a adequação do espaço urbano a mobilidade realmente limpa – se for movida a soja, que seja tofu e missoshirô!
A política dos binários levada a cabo pelo atual prefeito, seguindo a mesma linha de seu antecessor, é a de destruir as ruas pacatas e tranqüilas da cidade, transformando-as em vias de acesso rápido ao sempre crescente fluxo dos automóveis. O que antes era uma rua que dava até pra jogar bola, se torna um lugar hostil, mais uma zona de conflito e velocidade inumana.
A cidade agoniza em medidas paliativas, que oferecem uma sobrevida muito curta ao atual sistema. Quanto mais estímulos para os carros, mais carros teremos nas ruas. Que silogismo perfeito!
Algumas sugestões que certamente serão ignoradas pelos nossos obtusos gestores:
Subsídios maciços ao transporte público oriundos de diversas fontes: Estar, pedágios urbanos, impostos sobre os automóveis, dinheiro das empresas e revendedoras. A lógica seria fazer com que o privado sustente o público. Se eu quero andar de carro, devo pagar para que alguém possa ir de ônibus.
A bicicleta deve ser valorizada, elogiada e estimulada. Inserir a bicicleta no cotidiano das escolas e de todas as repartições públicas. Favorecer a cultura do diálogo, da troca, da liberdade e do prazer que só a descoberta da cidade pela mobilidade auto-propelida pode nos trazer.
A herança que toda esta gente deixa para o futuro é esta, não nos esqueçamos disto. Uma cidade que dançou a música do grande capital, que destruiu sua cultura autêntica, seu passado, suas ruas conviviais, sua criatividade. Que gerou falsos mitos e discursos de uniformidade. Uma cidade que passou a abdicar da política, que transformou todo ímpeto democrático num protocolo administrativo.
Curitiba, uma cidade que agoniza sob a montanha do lixo publicitário que a enaltece.
*Jorge Brand, 31, é filósofo e professor de yoga
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