* Aparecida Isabel Bressan no Blog do CEBES
Nos dias 29 e 30 de agosto de 2011, acontecerá, em São Paulo, a segunda edição do Medical Travel Meeting Brazil, com a participação de hospitais, laboratórios, indústria farmacêutica, indústria odontológica, investidores da área da saúde, entidades de classe e associações médicas e odontológicas. O evento destina-se a atrair cada vez mais pacientes de diversos países aos hospitais e clínicas privados brasileiros. Para isso terá como convidados: operadoras de saúde internacionais, empresas corporativas de autogestão mídia, e consulados.
O Ministro da Saúde, Alexandre Padilha, participará da abertura oficial do evento, juntamente com o Secretário Municipal de Saúde de São Paulo, Januário Montone. Serão apresentados os avanços da medicina brasileira para líderes internacionais que fomentam o turismo médico para países estratégicos. Haverá a apresentação de um projeto de lei proposto elaborado em conjunto entre o Ministério da Saúde e do Turismo que cria um visto de entrada no país específico para esse fim. O Projeto de Lei n° 5.655/2009 prevê um visto que poderá ser excepcionalmente concedido, em caráter temporário, por até um ano, ouvido o Ministério da Saúde, extensivo a um acompanhante, admitindo-se a prorrogação enquanto durar o tratamento. A concessão do visto será exclusiva para tratamento de caráter privado, sendo vedada a utilização de recursos do Sistema Único de Saúde.
Segundo os organizadores do Medical Travel Meeting Brazil – 2011 o turismo médico deverá crescer cerca de 35% no Brasil no próximos cinco anos. São citados números do Ministério do Turismo, segundo os quais 180 mil estrangeiros teriam vindo ao país com essa finalidade nos últimos três anos.
O turismo médico tem crescido no cenário internacional, direcionando pacientes dos países mais ricos para os países emergentes, motivado especialmente pelos menores custos de procedimentos. Uma cirurgia cardíaca que custaria 300 mil dólares nos Estados Unidos sairia por 90 mil dólares no Brasil. Outros fatores que têm influenciado esses fluxos são o grande contingente de pessoas sem seguro saúde nos Estados Unidos e as filas de espera para realização de procedimentos eletivos em países onde o sistema público é predominante como Reino Unido e Canadá.
Do ponto de vista de agentes do mercado privado da saúde no Brasil, o poder público deve contribuir com o incremento do turismo médico, uma vez que traria maior recolhimento de impostos, geração de trabalho, investimentos sustentáveis em estrutura hospitalar e formação profissional, o que poderia resultar em pulverização dos custos fixos na saúde. Esperam que o governo viabilize um arcabouço regulatório para a atividade, que dê conta de questões como estruturação tributária de prestação de serviços internacionais, mecanismos de contratação internacional e riscos de responsabilização dos atores nacionais em caso de danos. Esperam também que o setor público forneça serviços para dar suporte à iniciativa privada e crie mecanismos de indução a investimentos.
Em setembro de 2010, a Embratur participou com um estande de um congresso mundial do setor em Los Angeles – EUA. Informava aos participantes que o Brasil já recebia então um grande número de turistas em busca de procedimentos de cirurgia plástica, cirurgia bariátrica, tratamento de doenças cardíacas, problemas oftalmológico, entre outros. Propagandeava que o Brasil já possuía 23 instituições credenciadas pela Joint Commission Internacional, apontado como o mais importante órgão certificador de padrões de qualidade das organizações de saúde do mundo e que as cidades brasileiras contariam com excelentes hospitais, médicos experientes e universidades em pé de igualdade com grandes centros internacionais.
Em 2010 o Ministério do Turismo lançou uma cartilha intitulada Turismo de Saúde: Orientações Básicas onde aborda aspectos práticos jurídicos do Turismo Médico Internacional.
Em entrevista à Rede Record, no dia 15 de julho deste ano, o Ministro Padilha citou o crescimento do turismo médico no Brasil como sinal de competência da rede privada de saúde.
Em 2010 o Hospital Hcor de São Paulo – Capital já registrou um aumento de 150% no número de pacientes internacionais atendidos no hospital, o que teria sido responsável pelo aumento de 20% em suas receitas.
Os mais importantes hospitais privados de São Paulo – Capital, especialmente os hospitais Sírio Libanês e Hospital Israelita Albert Einstein pretendem investir, até 2014, R$ 2,5 bilhões no incremento da infraestrutura hospitalar com a construção de moderníssimos centros cirúrgicos, equipamentos de última geração e investimento pesado em hotelaria hospitalar, esperando atingir com isso o status alcançado pelos países líderes mundiais em turismo médico como a India, a Tailândia, Costa Rica e Singapura.
Também grandes hospitais de Porto Alegre (RS), Hospital São Lucas da PUCRS, Santa Casa Moinhos de Vento e Mãe de Deus, juntamente com a Secretaria Municipal de Turismo daquela cidade preparam-se para o crescimento do turismo médico internacional. Em junho de 2010 foi criado o grupo gestor do Porto Alegre Health Care Cluster que visa desenvolver uma rede de associados nas áreas de saúde e trade turismo para parcerias com agências facilitadoras e instituições internacionais com foco especialmente no mercado norte americano.
Para os hospitais privados, o turismo médico permite reduzir os atritos com os planos privados de saúde brasileiros acerca dos valores pagos pelos procedimentos, pois os estrangeiros pagam em geral 35% a mais e em dinheiro. Mas para a assistência à saúde dos brasileiros, o que representa o crescimento do turismo médico?
Será que os impostos recolhidos de estrangeiros compensarão o aumento dos preços dos procedimentos médicos gerado pela capacidade superior de pagamento dos estrangeiros, aumentando os gastos diretos com o SUS e com os subsídios públicos aos planos privados?
Haverá realmente aumento da capacidade instalada dos hospitais e do número de especialistas ou o turismo médico virá para aumentar a insuficiência de capacidade assistencial que já assistimos hoje no SUS e agora mais recentemente na rede privada que atende aos planos de saúde?
Note-se o que na Tailândia, que recebe anualmente dois milhões de estrangeiros para tratamento em seus hospitais, segundo o movimento civil Fórum de Leis, centenas de médicos deixaram os hospitais públicos atraídos pelos salários de instituições particulares que atendem a estrangeiros, o que contribuiu para a piora do sistema de saúde estatal, do qual depende a maioria da população, que tiveram aumentado o tempo de espera para serem atendidos.
Estaremos subsidiando com recursos públicos do povo brasileiro a tratamento de estrangeiros em hospitais filantrópicos que contam com amplas isenções fiscais? Até o momento os hospitais privados de fins lucrativos não se interessaram em atrair clientes estrangeiros.
Estarão o Ministério da Saúde, os demais gestores do SUS e o Conselho Nacional de Saúde atentos a esta questão?
* Aparecida Isabel Bressan é mestre em Políticas Públicas de Saúde pela Ensp/Fiocruz. Atualmente atua como especialista em Regulação de Saúde Suplementar na Agência Nacional de Saúde Suplementar e diretora executiva do Cebes.
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