no Blog Direito Sanitário: Saúde e Cidadania
José do Vale Pinheiro Feitosa
Como em todo sistema capitalista os papéis públicos e/ou sociais no direito à saúde oscilam entre a finalidade e o processo de acumulação de riquezas pelas empresas e pessoas de negócios. Ao contrário do que dizem os virtuosos do mercado, é mais comum haver contradição entre os papéis e o processo do que igualdade entre os dois.
Como o papel do Estado não é tornar médicos e empresários da saúde em milionários, com carros importados caríssimos, casas espetaculares em alguma ilha de Angra dos Reis, apartamentos em Miami e contas bancárias em paraísos fiscais, fica a primeira lição de quem deseja analisar a gestão de saúde no Brasil. É que a saúde virou um negócio tão estúpido que estamos em vias de perder o direito a ela em face de uma ganância por acumular lucros.
Agora mesmo, com capitais da Bradesco Seguros, o Laboratório Fleury está adquirindo a Rede de Laboratório Dor, numa transação de um bilhão de reais. Para o mercado isso é estimulante, mas para o cidadão, especialmente aquele que detém planos de saúde, pode apenas significar monopólio, preços altos e redução de pontos de atendimento. Diga-se que, no Rio de Janeiro, isso é pedra de cal dos últimos anos de laboratórios associados a pioneiros destes meios diagnósticos como Helion Povoa, Maiolino e Sergio Franco.
Aí é que entra o papel do Estado e especialmente do Ministério da Saúde que parece ter se tornado apenas num grande gestor de planos de saúde público. Ao contrário, cabe ao Ministério todos os assuntos espinhosos da sociedade, entre epidemias como a dengue e o monopólio de agentes privados que põem em risco a economia popular.
Os quase cinqüenta milhões de brasileiros que têm planos de saúde sofrem em consultas médicas rasteiras, de uma epidemia de exames desnecessários e de uma restrição, contraditoriamente, em exames essenciais que são caros. Sofrem nas emergências dos hospitais privados, não têm acesso à medicina intensiva e problemas com cirurgias, até mesmo eletivas.
Há um movimento de concentração de empresas gestoras de planos de saúde e de compras de carteiras e de medidas, até mesmo do agente regulador do Estado, numa idéia de que a concentração dá sustentação ao mercado sem o devido contraponto à monopolização danosa à economia. O Estado que sofre a erosão da corrupção em suas verbas, também recebe o assédio desses agentes que tentam apenas concentrar poder e dinheiro cada vez mais.
Não é possível uma democracia com acesso universal à saúde do modo como o Estado está sendo usado para facilitar negócios concentrados, albergar “fornecedores” que não passam de lobistas, muitos dos quais no caixa das campanhas de deputados e senadores, a “vender” normas que obrigam o consumo de certos “produtos de saúde”.
O problema da saúde pública brasileira não é má gestão: isso é desculpa para privatizar ainda mais. O problema é não enfrentar a contradição entre o processo de acumulação das empresas de saúde que se tornaram mais poderosas e capitalizadas após a Constituição de 1988.
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