Lenir Santos[1]
A organização do SUS em nosso país está assentada em três pilares: rede (integração dos serviços interfederativos), regionalização (região de saúde) e hierarquização (níveis de complexidade dos serviços). Estes são os pilares que sustentam o modelo de atenção à saúde, conforme dispõem o art. 198 da CF. A Constituição ao estatuir que o SUS é um sistema integrado, organizado em rede regionalizada e hierarquizada, definiu o modelo de atenção à saúde e a sua forma organizativa.
O modelo do sistema de saúde brasileiro é centrado na hierarquização das ações e serviços de saúde por níveis de complexidade. Isto significa dizer que ele se estrutura em níveis de maior ou menor complexidade de ações e serviços de saúde, conforme dispõe, ainda, os arts. 8º e 7º, II, da Lei 8.080/90.
Nesse sentido, o modelo de atenção à saúde, que se centra em níveis de complexidade dos serviços, deve ser estruturado pela atenção básica, principal porta de entrada no sistema, a qual deve ser a sua ordenadora. A hierarquização se compõe da atenção primária ou básica[2]; atenção secundária e terciária ou de média e alta complexidade (ou densidade tecnológica).
A atenção primária deve atuar como se fora um filtro inicial, resolvendo a maior parte das necessidades de saúde (por volta de 85%) dos usuários e ordenando a demanda por serviços de maior complexidade, organizando os fluxos da continuidade da atenção ou do cuidado. Este papel essencial da atenção primária, tanto na resolução dos casos, quanto no referenciamento do usuário para outros níveis, torna-a a base estruturante do sistema e ordenadora de um sistema piramidal.
O importante a destacar é que a forma organizativa e o modelo de atenção à saúde não podem ser escolhas da autoridade pública de saúde. Elas estão definidas constitucionalmente no art. 198, e legalmente nos arts. 8º e 7º,II, da Lei 8.080/90 que determina a integração dos serviços públicos dos entes federativos em redes de atenção à saúde. Estas redes devem ser regionalizadas, o que pressupõe um relevante papel do Estado, ente competente para definir as regiões de saúde a partir de aglomerados de municípios limítrofes com características que importem à organização de rede de atenção à saúde, conforme determina a CF.
Este modelo piramidal, de base alargada, densa, em razão de a atenção primária ser a principal porta de entrada do sistema e responsável pela resolução da maioria da necessidade de saúde da população, deve ser estruturada qualitativamente, com fixação de metas e a atribuição de garantir o acesso do usuário ou o seu caminhar na rede de atenção à saúde. Os serviços denominados de ‘regulação’ devem ser, na realidade, serviços que se integram à atenção primária, ordenadora de todo o modelo assistencial do SUS.
Região de saúde deve, por sua vez, fundar-se na sua capacidade de concentrar num aglomerado de territórios municipais contíguos, serviços de saúde capazes de resolver entre 60 a 70% das demandas dos usuários. A região de saúde deve ser dotada de características culturais, sociais, demográficas, viárias que possibilitem a organização de rede de atenção à saúde. Esta forma de organização do SUS – integração (rede) de todas as ações e serviços de saúde dos entes federativos daquela região – impõe aos municípios, articulados com o Estado e com a União, a necessidade de permanente interação com vistas a garantir uma gestão compartilhada.
Sendo os entes autônomos, é necessário que esta articulação seja negociada para se obter consensos em nome do interesse público. As responsabilidades, atribuições, metas, recursos financeiros, monitoramento, avaliação, controle devem ser definidos pelos entes envolvidos e consubstanciados em contratos que possam consagrar os consensos, gerando, assim, um ambiente de respeito às autonomias e segurança jurídica nos acordos firmados.
[2] Há uma discussão a respeito da denominação da atenção à saúde: primária ou básica. Na Europa, a denominação que prevalece é atenção primária que dá ensejo a pensar em prioritária, em essencial. Na Constituição, tanto quanto na Lei 8.080/90, não há qualquer referencia a um ou outro nome. Contudo, a EC 29/2000, dispõe que 15% dos recursos das transferências da União para os demais entes federativos deve ser para o custeio de ações e serviços básicos de saúde. Se entender serviços básicos como atenção básica, esta, então, seria a denominação a ser utilizada.
[1]Coordenadora do Instituto de Direito Sanitário Aplicado – IDISA; Coordenadora do Curso de Especialização em Direito Sanitário da UNICAMP-IDISA; ex-procuradora da UNICAMP.
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