Recebi algumas mensagens, alguns telefonemas e alguns recados: “Parabéns pela sua luta! Foi aprovada a EC-29!!!!” Consideraram vitória por desconhecedores dos detalhes do aprovado. O texto ficou péssimo. Mas, o fato de terem votado pode significar um avanço rumo ao Senado para melhor discussão.
Minha alma está com sentimento duplo mas o que domina é o de uma parcial satisfação. Explico: ruim sem ela, pior com ela! A proposta de criação da CSS, perdendo dinheiro, iria expor ao ridículo, mais uma vez, a saúde pela impossibilidade de melhorá-la! Criada a CSS como ficou iria, ainda uma vez, levar a população a “odiar”Sistema de Saúde, pois, mas uma contribuição como ficou nada traria de melhoras à saúde.
O Projeto saido da Câmara é bom. Melhor que a situação de pasmaceira onde os deputados nos tinham metido desde 2008. Não votavam o último destaque e consequentemente, nenhum encaminhamento se dava. Que bom que saiu de lá mesmo reconhecendo que com a pior das hipóteses: a saúde perde sete bilhões de reais!!! É uma situação deveras esquizofrênica.
Lutamos, desde a promulgação da CF, para que a saúde tivesse recursos definidos, definitivos e suficientes. Nossas perdas neste campo foram muitas. Perdemos a primeira batalha na Constituinte quando os economistas, capitaneados por um futuro Ministro da Saúde, impediram que ficasse determinado um percentual do orçamento para a saúde, ao modo como definido o da educação. Ganhamos 30% para 1989 na ADCT e nos anos até 1994 na LDO. Mesmo prescrito nunca cumprido. A média do executado nestes anos foi de 20% e, no Governo Collor, 14%!
Ganhamos a CPMF nos anos de 1997 pensando ser um dinheiro a mais para melhorar a saúde. Fomos ingênuos, como afirmou o Ministro da Saúde da época pois, na lei não constava a CPMF como dinheiro a mais para a saúde. Estava armada a arapuca pois a CPMF entrou para saúde com uma mão e com a outra foram retiradas outras receitas da saúde, que foram usadas, na época, para reforçar o caixa do pagamento de juros da dívida interno-externa.
Veio a EC-29-2000 e deram outro tombo na saúde – as mesmas figuras que impediram que se fixasse recurso para a saúde na CF. A manobra, na calada da noite, foi de criar uma fórmula em que a União entrasse com menos dinheiro. Ao mesmo tempo aumentou a contribuição dos Estados em 20% (10 para 12%) e dos Municípios em 50% (10 para 15%).
Todo mundo aplaudindo achando que estava sendo aprovada a PEC-169 do Eduardo Jorge. Na verdade já a haviam modificado radicalmente. Ficou tão complexa a forma de cálculo que, poucos sabíamos que estavam dando um tombo de esperteza, na população em geral e em técnicos que defendiam mais dinheiro para a saúde. Saímos da aprovação da EC 29 (set.2000) já com o prato na mão e assim continuamos até hoje!!! Outro tombo (passa-moleque em nossa cidadania) quando estava para ser aprovado em 2007 o projeto de Roberto Gouveia alocando 10% da Receita Corrente Bruta de recursos federais para a saúde. Numa reunião de almoço com parlamentares, representantes do governo , em apenas uma hora, reviraram o projeto de cabeça para baixo mantendo a mesma base de cálculo de percentual do PIB e colocando como dinheiro a mais, um percentual da CPMF, ainda em vigor naquela época.
Aprovado, longe dos anseios de militantes e da população, foi ao Senado para votação. Antes de sua apreciação havia a votação da prorrogação da CPMF. Foi o momento do jogo de vaidades, contrário a nossa cidadania. O governo não quis dobrar-se à exigência dos opositores de colocar todo o dinheiro da CPMF só para a saúde. O momento da votação da CPMF se aproximando, aconteceu numa quase madrugada de dezembro de 2007. De um lado o governo fixo na idéia de não colocar todo o dinheiro da CPMF para a saúde. De outro a oposição jogando o jogo da chantagem cobrando a declaração do Governo do destino total da CPMF para a saúde. Quando Lula se dobrou, na undécima hora, mandando oficio ao Senado, afirmando que a CPMF seria destinada toda à saúde, a oposição tripudiou. Disse que agora era tarde demais e não iria aprovar a permanência da CPMF. Daí para frente não se levou o projeto da saúde PLP 01/2003 à apreciação do Senado. Perdeu o sentido, agora, com menos dinheiro. Sem nada a mais e ainda com a perda de R$16 bi da CPMF que ía para a saúde!!!
Neste meio tempo o projeto do Tião Viana tinha sido aprovado no Senado por unanimidade, garantindo os 10% da Receita Corrente Bruta. Assim que aprovado, foi encaminhada à Câmara. A Saúde, com este projeto, ganharia mais dinheiro da União. A Câmara, teleguiada pelo Governo, desfigurou o projeto original do Senado e voltou a seu projeto morto no Senado, criando a CSS (uma CPMF só para a saúde e com alíquota menor!). A CSS foi aprovada mas o destaque que faltava votar, depois de três anos, foi votado nesta semana de setembro de 2011, tirando a base de cálculo da CSS tornando-a totalmente inócua. Eis a arte do estado em relação aos vários capítulos de se ter mais dinheiro para a saúde pública brasileira.
PROJETOS NO SENADO PARA VOTAÇÃO
A) O PLP 01/2003 aprovado na Câmara em 2007 e que se encontra no Senado – mantendo a mesma forma de financiamento pelo PIB e sem CPMF que, afinal é a mesma coisa que hoje está aí. Sem nenhum aumento de recursos!!!
B) O PLP 308-B da Câmara que acaba de sair para o Senado – mantendo a mesma forma de financiamento atual com um agravante: os Estados conseguiram tirar dos 12% de sua base de cálculo o equivalente aos recursos do FUNDEB. A Saúde perde R$7 bi. Fomos pedir mais recursos para a saúde pública e saíamos de lá assaltados pelos Governadores, perdendo R$7 bi.
C) O PLS 121/2007 aprovado no Senado e que destina 10% da Receita Corrente Bruta da União para a Saúde.
D) O PLS 156/2007 que não passou ainda pelos trâmites de votação e propõe que a União destine à saúde no mínimo 18% da Receita Corrente Líquida.
REG-EC – MS – HIPÓTESES 2011
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R$ BI
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GANHA/ PERDE R$BI
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LOA-2011 (COM A ATUAL Variação Nominal do PIB)
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71,5
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0
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PLP 01/2003 – Originário da Câmara e que mantém o mesmo valor atual pois é sem a CPMF
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71,5
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0
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PLP-306-B-2008 CÂMARA (Mantém VNP) SEM CSS (PERDE 7 BI DO FUNDEB)
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64,5
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-7
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PLS-121-2007 TIÃO SENADO ORIGINAL
(10% RCB DE R$1.040,2 BI)
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104
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32,5
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PLS 156 – 2007 PERILLO SENADO
(18% RCL DE R$551,2 BI=R$99,2-
(GANHA R$27,7)
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99,2
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27,7
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E AGORA JOSÉ?!!!
Aprovado o Projeto da Câmara, sem CSS e existindo um Projeto originário do Senado de aumento de cerca de R$30 bi para a saúde sem nenhuma fonte nova de receita, o Governo treme nas bases. Começa a se organizar como relata a mídia:
“SOB ORDEM DO PLANALTO – SENADO IRÁ CONGELAR A EC-29 – 23-9-2011 – AGÊNCIAS - Senadores da base e da oposição ensaiavam resgatar a proposta que obrigava a União a gastar mais com saúde. Governo, temeroso, decidiu manobrar para engavetar o projeto. O Planalto vai manobrar para que o Senado engavete o projeto de lei complementar que regulamenta a Emenda Constitucional n.º 29, que estabelece porcentuais mínimos de destinação de recursos públicos para a saúde. Aprovada anteontem na Câmara dos Deputados, a proposta não deve ser votada este ano pelos senadores. O motivo: líderes aliados detectaram um movimento na base e na oposição para que o Senado ressuscite o mecanismo que obriga a aplicação de 10% da receita corrente bruta da União no setor. Essa vinculação injetaria muito mais recursos no setor do que o Planalto está disposto a despender. “Não há hipótese de o governo aceitar o restabelecimento dos 10%”, afirmou o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE). “Não interessa ao governo votar esse projeto agora”, resumiu o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR).”
O Planalto detectou forte possibilidade de os senadores manterem o texto com os 10% e, por isso, decidiu “congelar” o projeto. “Vamos insistir naquilo que foi votado no Senado. Não nos venha com a idéia de criar imposto novo ou nova receita para financiamento da saúde. Não precisa. Um país que fala em trem-bala para beneficiar uns poucos não tem autoridade moral para falar em mais recursos para a saúde”, disse ontem o presidente nacional do DEM, senador José Agripino Maia (RN). Até mesmo dentro da base aliada, há quem já tenha declarado ser favorável aos 10%, como o petista gaúcho Paulo Paim. “Como existe essa possibilidade de os 10% voltarem, vão empurrar o projeto com a barriga para o ano que vem”, prevê Paim. Outro problema para o Planalto é que o projeto do Senado prevê ainda mais gasto adicional, desta vez para os estados – que poderiam pressionar a União a repassar mais recursos para os governos estaduais.
CONCLUINDO:
Minha análise otimista é a pior possível. O texto acima mostra claro o aviso de que o Governo fará tudo para impedir a votação de qualquer proposta de aumento dos recursos para a saúde que não aponte as fontes legais de recursos.
As hipóteses de conseguir mais recursos substanciais para a saúde são fluídas e distantes (aumentar impostos já existentes (fumo,álcool,dpvat); criar imposto grandes fortunas; usar dinheiro do pré-sal; reiniciar a tramitação de nova lei criando imposto/contribuição sobre a movimentação financeira; buscar recursos na diminuição de juros pagos pelo Governo a seus credores; etc.).
A constatação de que estamos diante de uma situação de perspectiva pouco positiva para a saúde, não pode impedir a nossa luta que deve ter pelo menos três frentes:
1) convencer os senadores que têm que tomar uma atitude de escolha de seu projeto já aprovado por unanimidade, garantindo 10% da Receita Corrente Bruta para a saúde;
2) discutir com a sociedade a necessidade de mais dinheiro para a saúde considerando que muito se faz pela saúde da população com pouco dinheiro (em 2010 o SUS fez 3,6 bilhões de procedimentos).
3) convencer o Governo da dívida social com a saúde e da necessidade de resgatar as apropriações feitas por governos anteriores de recursos da saúde.
Mãos à obra, sem tardança e sem desânimo. Sempre foi assim com a saúde pública pelo menos nos últimos quarenta anos. Não é agora que podemos nos entregar.
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