Nestes últimos dias tenho ouvido
(e lido) muitas referências ao papel dos “especialistas”.
Em encontro no qual foram prestar solidariedade a uma colega acusada de
assassinatos em série, as entidades médicas (Federação Nacional dos Médicos e
Sindicato dos Médicos do Paraná) destacaram a “falta de informação científica de muitos meios de comunicação no trato
do tema, recomendando prudência e respeito aos médicos especialistas em
medicina intensiva, legal e anestesiologia”.
Não deixam de ter sua dose de razão,
afinal, o parecer de especialistas - mesmo que não signifique o dogma supremo
- deve ser sempre considerado...
Investigar crimes, fraudes e
outros ilícitos é também tarefa de especialistas.
A auditoria médica é uma
especialidade.
As primeiras menções ao trabalhos
de auditoria remontam ao início do século XX, quando o médico George G. Ward,
nos Estados Unidos, descreveu a importância da verificação da qualidade da
assistência prestada ao paciente através dos registros em seu prontuário. Naquele tempo não haviam UTIs nem especialistas em medicina intensiva.
Estranhamente (ou não...), até
hoje a auditoria ainda não foi reconhecida como especialidade pelo Conselho de Medicina (mas
esta é outra conversa)...
A matéria prima do trabalho do
auditor é a informação. Ele é um
especialista no trato da informação.
O auditor é profissional com
formação técnica necessária para – diante da necessidade de uma investigação
- identificar as fontes de
informação que serão analisadas, da análise destas fontes destacar evidências
(evidência é diferente de ilação) que consubstanciarão CONSTATAÇÕES
(constatação é um dado OBJETIVO, que veio de evidências consistentes obtidas de fontes
fidedignas). Trata-se de processos de trabalho que requerem conhecimento
técnico, executados mediante técnicas científicas de amostragem e investigação
e que obedecem normas de atuação muito bem definidas.
Dentre estas normas, consta a possibilidade
de valer-se da opinião de especialistas nos casos em que esta seja necessária, manter
a autonomia profissional durante a investigação, e agir com isenção.
Por “agir com isenção”
subentende-se (entre outros) despir-se de todos os cacoetes de corporativismo.
Um mega-especialista em terapia
intensiva poderá ter algum grau de dificuldade em conduzir uma investigação
dentro destes parâmetros, pois, afinal “não é especialista na área”, embora o
seu parecer técnico possa ser utilizado na instrução.
No caso que tem sido divulgado
pelos meios de comunicação e que foi objeto do”apoio” de entidade médicas, a
investigação está sendo realizada por uma equipe numerosa composta por
especialistas em terapia intensiva (todos eles titulados na área), médicos peritos
de carreira do Ministério Público e auditores da Secretaria Municipal de Saúde
de Curitiba e Ministério da Saúde com ‘expertise’ em terapia intensiva.
Eu faço parte da equipe. Sou
pediatra, tenho mestrado pela UFPR em cardiologia, atuei por algumas décadas em
terapia intensiva pediátrica (embora, assim como a colega que está sendo
acusada eu não possua o titulo de especialista em terapia intensiva) e sou médico
auditor há pouco mais de 32 anos.
Ou seja: meu trabalho há mais de trinta anos
é o de investigar crimes, fraudes e ilícitos praticados contra a sociedade na
área da saúde.
O interesse da sociedade deve
prevalecer sobre o espírito das corporações. Por mais “especializadas” que
sejam.
Em tempo: respondendo a perguntinha
do titulo:
Parabéns pelo seu trabalho, Dr. Lobato! São pessoas comprometidas com a verdade que fazem do mundo um lugar melhor.
ResponderExcluirÉ... correto! Lá pelos anos 1920 começa a segmentação da prática médica, o ensino por especialidades, órgãos e sistemas; a biologia que 100 anos depois vai cada vez mais a fundo no conhecimento e chega ao DNA decifrando o genoma humano, etc... Não conheço, porém, exceto em Auschwitz, Sorbidor, Daschau e Birkenau, a especialidade médica de exterminador em massa.
ResponderExcluirAs tais entidades "de classe" deveriam ter um pouco mais de classe - no bom português: um pouco mais de vergonha na cara - e zelar um pouco menos pelo umbigo mal lavado de uma pequena parcela dos seus "associados", especialmente os "exterminadores".
Antonio Carlos Nascimento.
O "Espírito de Corpo" ou corporativismo é expressado em todas as sociedades e é lícito, sempre, porém muitas vezes cego e imoral. No Brasil não consigo ver este corporativismo mais forte do que na classe médica. Os políticos são corporativistas, sim, mas muitas vezes são mais canibalistas e ignorantes. As forças policiais também tem um espírito de corpo exacerbado, mas acabam sendo usadas muitas vezes como massa de manobra da classe política, ambas contaminadas por uma corrupção nefasta que tem origem antropológica. Os magistrados também são corporativistas, escondendo-se em suas togas e na aura da justiça "cega e imparcial". Casos de magistrados condenados por seus pares são exíguos, assim como os de cúrias. Mas como a classe médica não há!
ResponderExcluirvendo um documentário sueco muito sóbrio e preciso sobre o lado, digamos, humano dos nazistas - Arquitetura da Destruição - aprendo umas coisas; por exemplo, de todas as categorias profissionais representadas entre os membros do partido NAZI Alemão qual era a hegemônica, com mais membros???
ResponderExcluirquem adivinhar ganha um exame de próstata grátis..pq isso não me surpreende???