Por Marcelo Zero, no blog de Paulo Moreira Leite e reproduzido no Blog do Miro
Após comer uma coxinha estragada ontem à noite, acordei com os neurônios paralisados e dando razão ao pessoal anti-Copa.
Mesmo sendo um grande sucesso, essa Copa não deveria ter acontecido.
O Brasil ainda não tem Saúde e Educação de Primeiro Mundo. Portanto, não podia ter Copa. Tudo bem que os investimentos nos estádios foram 212 vezes inferiores ao que foi gasto com Saúde e Educação nos últimos 4 anos. Tudo bem que não tem dinheiro do orçamento federal nessas obras. Tudo bem que são empréstimos que terão de ser pagos por quem assumiu os estádios. Mas mesmo assim, não deveria ter havido Copa.
Não sei explicar bem o porquê. Não estou conseguindo enxergar direito qual a relação entre uma coisa e outra. Mas acordei revoltado, com vontade de xingar, como o pessoal vip do Itaquerão, e acho porque acho, e pronto!
E digo mais, tem muita coisa também que não deveria ter acontecido no Brasil.
Por exemplo, o João VI chega todo faceiro ao Brasil e, no meio daquele miserê de dar dó, resolve trazer, a peso de ouro, a Missão Francesa ao Brasil. Toda essa gastança para quê? Para implantar o neoclassicismo no Brasil. Imagina! Não tinha nem classicismo no Brasil e o pessoal gastando essa dinheirama para trazer o neoclassicismo!
O povo passando fome, sem nenhum hospital e escola, na fila do tronco, e o coitado do cidadão financiando o Grandjean de Montigny e a construção da Academia Imperial de Belas Artes, aquela frescura superfaturada. O Brasil com 99% de analfabetismo dando dinheiro para o Debret fazer aquelas gravurinhas vagabundas dele. E precisava fazer Jardim Botânico? Mato era o que não faltava no Brasil da época. Típica obra desnecessária.
E o Pedro II, hein? Em 1884, com o Brasil com 98% de analfabetos, com gente morrendo aos montes de febre amarela no Rio de Janeiro, o imperador me inaugura uma ferrovia caríssima que vai até o alto do Corcovado. Para quê, meu Deus? Nem Deus explica, porque o Cristo nem estava lá, ainda. Só chegou em 1931. Sabem o que havia lá encima? O tal do Chapéu do Sol, um mirante para o pessoal fazer piquenique. Não tinha Educação e Saúde e o pessoal fazendo piquenique e pensando em turismo. Até um hotel fizeram lá nas Paineiras.
E precisava botar o Cristo lá no alto? Deus é omnipresente, já estava por lá desde a eternidade. Outra obra claramente desnecessária. Tudo bem que o Cristo foi construído com dinheiro quase todo oriundo de doações. Mas com todo aquele concreto e aquela grana bem que podiam ter feito umas casas populares. Sei lá, um programa tipo Santa Casa, Santa Vida.
Fico possesso quando penso no Maracanã. Em 1950, o Brasil tinha mais de 70% de analfabetos, só uma meia dúzia de universidades, doenças e misérias sem fim e, mesmo assim, resolveram fazer uma Copa por aqui. Mas não resolveram apenas fazer uma Copa. Não! Resolveram fazer também um estádio novinho em folha. E não foi um estádio modesto, não. Os caras simplesmente resolveram fazer o maior estádio do mundo. Carlos Lacerda, o avô dos anti-Copa, bem que advertiu contra esse gasto absurdo, contra essa megalomania tupiniquim. Mas o pessoal fez assim mesmo e o Maracanã acabou virando um “templo do futebol mundial”. Frescura! Sempre fico pensando que, com aquele concreto todo, dava para construir uma gigantesca prisão e botar todos os mendigos do Brasil lá dentro, ao invés de jogá-los no rio Guandú, como Carlos Lacerda fez. Essa sim teria sido uma grande e útil obra!
Fico mais possesso ainda quando penso no Juscelino. O pessoal de hoje fica falando da Dilma, mas o Juscelino era muito pior. Estivesse ele na ala vip do Itaquerão, teria sido esquartejado. Imaginem só, o Brasil com mais da metade da população na miséria e no analfabetismo, sem Bolsa Família, sem Brasil Carinhoso, sem Prouni, sem Reuni, sem Fies, sem Ciência sem Fronteiras, sem Mais Médicos, sem Minha Casa, Minha Vida, sem Transposição do São Francisco, sem qualquer coisa, e o sujeito me resolve construir uma cidade inteira no meio do nada! E ainda ficou justificando que era para “levar o desenvolvimento para o interior”. Ora, era muito mais fácil e barato botar a capital em Juiz de Fora, que fica bem mais perto do Rio e já estava pronta. Estava tudo resolvido. O Aécio não é senador por Minas e não vive no Rio? Então?
Agora, eu fico apoplético é com a origem de tudo isso, de toda essa cultura da gastança desnecessária. A Coroa portuguesa, essa devassa. Portugal, na transição do século XV para século XVI, cheio de miseráveis, com 99,999% de analfabetos, até peste bubônica tinha, e os gajos me resolvem jogar dinheiro e recursos fora com os tais dos “descobrimentos”. Era um tal de mandar o Fernão de Magalhães para lá, o Vasco da Gama para acolá, o Pedro Álvares Cabral para cá. Era uma farra só. Com dobrões públicos!
E o pior é que os caras nem sabiam direito para onde iam! Quando perguntados, diziam com um sorriso cínico: estou a procurar terras desconhecidas a serviço de Sua Majestade. Diziam que queriam achar “uma nova rota para as Índias”. Ora, se já existia uma para que queriam outra? Só para jogar dinheiro fora. Picaretas! Além de gastar inutilmente os parcos recursos do país, ainda arriscavam a vida das pessoas, pois todo o mundo sabe que, naquela época, a Terra era plana, e chegando-se aos seus confins, as naus caíam todas num abismo sem fim. Irresponsáveis!
Ainda tiveram o topete de contratar o tal do Camões para fazer o marketing dessa picaretagem toda. Igualzinho aos “blogs sujos” de hoje!
Razão tinha o Velho do Restelo, que avisou que nada disso ia dar certo.
Alguém pode até argumentar que, sem isso, o próprio Brasil não teria acontecido. Pode ser. Mas eu sou anti-Copa e, como todo anti-Copa, eu nem gosto desse nosso país fútil e gastador. Prefiro Miami.
* Marcelo Zero é formado em Ciencias Sociais pela UnB e assessor legislativo do Partido dos Trabalhadores.
Marcelo Zero, você é mil..hões!
ResponderExcluirUm forte abraço