Eduardo Guimarães: Cidadania.com
O caso da febre amarela
Reproduzo, abaixo, a íntegra da nova manifestação que fiz em nome do Movimento dos Sem Mídia ao Ministério Público Federal no âmbito da Representação de nossa Entidade relativa à promoção de alarma social por meios de comunicação quanto a surto de febre amarela ocorrido no Brasil no início do ano passado.
PROCURADORIA DA REPUBLICA EM SÃO PAULO
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
EXMA. SRA. PROCURADORA DA REPÚBLICA
DRA. EUGÊNIA AUGUSTA GONZAGA FÁVERO
Ref.: Procedimento Preparatório nr. 1.34.001.002473/2008-63
O MOVIMENTO DOS SEM MÍDIA – MSM, organização da sociedade civil, através de seu Presidente e representante legal que esta subscreve, nos autos do Procedimento em referência, em trâmite perante essa D. Procuradoria Federal da República, volta a se manifestar no sentido de agregar aos Autos novas informações e documentos relativos a ações de mesma natureza praticados por órgãos de mídia e relativos a matéria de saúde pública, agora envolvendo a chamada gripe H1N1, popularmente conhecida como “gripe suína”, podendo tais ações terem acarretado novos prejuízos ao país e à sociedade, em decorrência da repetição de fatos que provocaram a Representação inicial de nossa organização, feita a essa D. Procuradoria da República em 17 de março de 2008:
DO HISTÓRICO DA REPRESENTAÇÃO
No final do mês de dezembro de 2007, com a seqüência dos fatos prosseguindo até o fim de janeiro de 2008, os veículos de comunicação social ora Representados pautaram e colocaram em imensa evidência, em suas publicações e transmissões, relatos e opiniões de forma extremamente alarmantes, sempre em escala crescente, o que acabou disseminando entre a população a crença de que estaria em curso no país uma EPIDEMIA DE FEBRE AMARELA URBANA, evento que não ocorria há mais de sessenta anos. Dessa prática da imprensa decorreu verdadeira histeria social que se apoderou do cidadão mais humilde até o mais abastado – e, pretensamente, mais bem informado -, num processo em que cada órgão de imprensa parecia querer produzir mais estardalhaço e alarme do que o outro.
Com efeito, no decorrer do ano passado foi constatado, sob informações do Ministério da Saúde, os efeitos deletérios do alarmismo midiático quanto a uma epidemia inexistente que provocou corrida aos postos de vacinação e conseqüente esgotamento de vacinas contra a febre amarela no país que é o maior produtor mundial do medicamento, o que gerou adoecimento de dezenas de pessoas por reação adversa à vacina, conforme informações do mesmo MS comprovaram, sem falar nas mortes decorrentes da reação em pessoas que comprovadamente se vacinaram sem necessidade, de maneira que o MSM pede que se investigue se essas pessoas não foram movidas exclusivamente pelo noticiário dos veículos de comunicação representados.
Em 7 de novembro de 2008, atendendo ao ofício dessa Procuradoria GABPR12-EAGF/SP-000506/2008, o MOVIMENTO DOS SEM MÍDIA voltou a se manifestar nos autos no sentido de requerer dados ao Ministério da Saúde que fundamentariam a tese proposta por nossa Entidade e oferecendo documentos daquele Ministério que fundamentariam aquela tese e que nos foram entregues pela jornalista especializada em Saúde Conceição Lemes, um estudo intitulado Auditoria de Imagem, o qual revela detecção do MS de alteração “inexplicável” do comportamento dos meios de comunicação no surto de febre amarela do ano passado em relação a surtos ocorridos em anos anteriores.
Em decorrência daquela manifestação do MOVIMENTO DOS SEM MÍDIA, essa D. Procuradoria requisitou informações ao Ministério da Saúde já por duas vezes este ano, mas até agora não foi atendida. Dessa conduta inexplicável daquele Ministério ou da lentidão no encaminhamento das informações sobre a febre amarela a essa Procuradoria, nossa organização acredita que decorrem os fatos que relata a seguir.
DOS FATOS
A falta de responsabilização dos meios de comunicação representados por nossa organização há mais de 1 ano na questão do alarmismo relativo à febre amarela parece ter gerado novo prejuízo à sociedade, agora por conta do surto de gripe A (H1N1), vulgarmente conhecida como “gripe suína”.
O alarmismo dos meios de comunicação fica patente não apenas no senso comum, na constatação do afluxo de cidadãos aos hospitais que se viu recentemente, contrariando recomendações do Ministério da Saúde e congestionando os sistemas de Saúde público e privado, inclusive facilitando a transmissão do vírus H1N1 ao reunir nas instalações hospitalares pessoas sãs com outras infectadas. Novamente, alarmadas pelo noticiário as pessoas voltaram a arriscar a própria saúde.
Um dos casos mais graves do novo surto de alarmismo midiático, apesar de outros órgãos de comunicação também terem agido de forma similar (com escalada de manchetes sobre a questão, devendo também ser investigados pela D. Procuradoria), foi matéria de capa do jornal Folha de São Paulo publicada em 19 de julho último e reproduzida a seguir.
Folha de São Paulo, domingo, 19 de julho de 2009
Gripe pode afetar até 67 milhões de brasileiros em oito semanas
HÉLIO SCHWARTSMAN DA EQUIPE DE ARTICULISTAS
A pandemia de gripe provocada pela nova variante do vírus A H1N1 poderá atingir entre 35 milhões e 67 milhões de brasileiros ao longo das próximas cinco a oito semanas. De 3 milhões a 16 milhões desenvolverão algum tipo de complicação a exigir tratamento médico e entre 205 mil e 4,4 milhões precisarão ser hospitalizados. [...]
Assinante da Folha lê a matéria completa clicando aqui
A matéria em questão gerou matéria da jornalista Conceição Lemes publicada no site jornalístico “Vi o Mundo” (www.viomundo.com.br), em 23 de julho deste ano, contendo entrevista com o médico epidemiologista Eduardo Carmo Hage, diretor de Vigilância Epidemiológica da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS), do Ministério da Saúde. É o mesmo citado na reportagem da Folha de São Paulo, conforme reprodução abaixo.
'Reportagem da Folha sobre gripe suína é totalmente furada; uma irresponsabilidade’
Publicado em 22 de julho de 2009 às 08:37
por Conceição Lemes
Domingo, 19 de julho, capa da Folha de S. Paulo: Gripe suína deve atingir ao menos 35 milhões no país em 2 meses
Domingo, 19 de julho, caderno Cotidiano da Folha de S. Paulo: Gripe pode afetar até 67 milhões de brasileiros em oito semanas
Difícil o cidadão comum ler essas manchetes, e não se apavorar. Quem ainda tem na memória a epidemia midiática de febre amarela de 2008, é impossível não se indignar. Um verdadeiro crime contra a saúde pública foi cometido pela mídia corporativa. O pânico desencadeado pela combinação de má-fe e incompetência de grande parte da imprensa levou milhões de pessoas a se vacinar inutilmente e a correr riscos desnecessários devido aos efeitos colaterais. Duas morreram estupidamente.
Leia a matéria completa clicando aqui.
O descalabro do procedimento do jornal Folha de São Paulo, que não foi o único apesar de ter sido o mais grave, gerou reação do próprio ombudsman daquele jornal, Carlos Eduardo Lins da Silva, poucos dias depois.
O título da coluna do ombudsman fala por si mesmo: “No Limite da Irresponsabilidade”. O texto foi publicado no jornal em 26 de julho último e segue abaixo reproduzido.
OMBUDSMAN
Folha de São Paulo, 26 de julho de 2009
No limite da irresponsabilidade
Ao ler na capa chamada sobre a gripe A, até os menos paranoicos devem ter achado que chances de contrair doença são enormes
A REPORTAGEM e principalmente a chamada de capa sobre a gripe A (H1N1) no domingo passado constituem um dos mais graves erros jornalísticos cometidos por este jornal desde que assumi o cargo, em abril de 2008.
O título da chamada, na parte superior da página, dizia: "Gripe suína deve atingir ao menos 35 milhões no país em 2 meses". A afirmação é taxativa e o número, impressionante. Nas vésperas, os hospitais estavam sobrecarregados, com esperas de oito horas para atendimento. Mesmo os menos paranoicos devem ter achado que suas chances de contrair a enfermidade são enormes. Quem estivesse febril e com tosse ao abrir o jornal pode ter procurado assistência médica. [...]
Assinante do jornal lê mais clicando aqui
A arrogância, a irresponsabilidade e a sensação de impunidade dos meios de comunicação em um assunto da gravidade da Saúde pública fica patente até na coluna de um jornalista que trabalha em um desses veículos, que imprime tom de revolta em sua crítica.
Esta é a situação que impulsiona o MOVIMENTO DOS SEM MÍDIA a novamente se manifestar, no sentido de solicitar a máxima agilização nos procedimentos relativos à Representação que protocolou há mais de um ano nessa Procuradoria, e que, até agora, não gerou nenhuma conseqüência para empresas de comunicação Representadas, as quais, ao que parece pelo relatado acima, continuam convulsionando o país, podendo causar graves danos à Saúde pública e literalmente zombando das leis e do sofrimento das vítimas, o que chega a parecer divertimento dessas empresas com os danos que estão causando e parece até estimulá-las a prosseguirem nas mesmas práticas abusivas e ameaçadoras ao conjunto da sociedade brasileira.
Pelo exposto, nossa Organização roga - e, em nome dos interesses indisponíveis da sociedade, requer - que a Representação que apresentou junto a essa D. Procuradoria tenha seu andamento agilizado, no sentido de requisitar a máxima celeridade do Ministério da Saúde no envio das informações requisitadas pela Douta Procuradoria da República sobre os dados da febre amarela no País, possibilitando o encaminhamento das providências ulteriores por essa Procuradoria, de forma a proteger a sociedade das condutas que entendemos ilegais por parte das Representadas, quer seja no plano da responsabilização penal dos responsáveis, quer no tocante ao ressarcimento do Erário Público Federal pelas despesas extraordinárias provocadas pelas empresas Representadas através de seu noticiário alarmista e irresponsável em matéria tão sensível e importante à cidadania como é a área da saúde pública.
São Paulo, 11 de agosto de 2009.
MOVIMENTO DOS SEM MÍDIA
EDUARDO GUIMARÃES
PRESIDENTE
Nenhum comentário:
Postar um comentário