Para Valter Pomar, opção por ampliar alianças trouxe problemas ao partido
Renato Godoy de Toledo no Brasil de Fato
As denúncias da oposição contra o presidente do Senado José Sarney (PMDB-AP) visavam transferir uma crise do Congresso para alguns metros dali, no Palácio do Planalto. Até o momento a missão não foi cumprida, tendo apenas resvalado na ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, com acusações que ainda carecem de comprovação.
A oposição mirou o governo como um todo, mas atingiu apenas parte de seu objetivo. Acertou em cheio o principal partido de sustentação do governo, o PT. O dia 18 de agosto foi agitado em Brasília. Com determinação do Planalto, Sarney foi absolvido. O líder petista no Senado, Aloizio Mercadante, disse que não aceitaria a posição do partido em prol do presidente da casa. Via Twitter, anunciou que renunciaria à liderança. Mas, após reunião com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no dia seguinte, voltou atrás.
Mas os danos não pararam por aí. Ainda no dia 18, o senador Flávio Arns, então do PT paranaense, anunciou que se sente envergonhado pela postura do partido e anunciou sua desfiliação. Por motivos “extra-crise”, a senadora Marina Silva tornou pública a sua decisão de sair do PT e sinalizou que deve mesmo ser candidata à presidência pelo PV, partido em que se filiou no último domingo (dia 30). Além de perder uma senadora com notoriedade, o PT enxerga em Marina uma concorrente que pode atrair parte do eleitorado que votaria em Dilma.
Bandeira da ética
Desde 1995, quando a então Articulação Unidade na Luta – hoje reunida no campo Construindo um Novo Brasil – retomou o controle do PT, as bandeiras socialistas começaram a perder espaço no âmbito partidário, derrotando a posição dos grupos mais à esquerda. Assim, o principal ponto de referência das campanhas petistas passou a ser a conduta ética de seus parlamentares. De fato, ocorreram alguns exemplos, no início desta década, em que membros do PT notabilizaram-se por denunciar esquemas de corrupção, como em São Paulo, durante a gestão de Celso Pitta e na cidade de Embú das Artes (SP), onde um único vereador do partido denunciou e cassou todos os seus colegas.
Dentro dessa política, incluía-se uma flexibilidade em termos de aliança e de novas adesões ao partido. Algumas figuras estranhas à história do PT ingressaram na agremiação, como o senador Delcídio Amaral (MS), detentor de milhares de hectares de terra, e o ex-governador de Roraima, Flamarion Portela, que foi cassado por corrupção (em 2004) e tem uma postura notadamente anti-indigena.
Uma organização estritamente parlamentar
Para o sociólogo Francisco de Oliveira, professor aposentado da Universidade de São Paulo e ex-petista, as relações entre o governo e José Sarney demonstram a equiparação do PT aos demais partidos. “Há uma diminuição na representatividade do PT na sociedade. Finalmente, o partido entrou no grande jogo dos partidos que só vivem no parlamento. Com isso, digamos que a viagem redonda do PT se consumou: partiu da contestação desse procedimento tradicional, deu a volta e incorporou-se ao modelo que antes criticava”, analisa.
Oliveira também iguala o comando de Lula sob o partido ao tradicional mandonismo da política brasileira. “O PT vai continuar na política como um grupo que se organiza para o poder. Assim como o PMDB, por exemplo. A maneira como o presidente Lula age sobre o partido é caudilhesca. Assim como a maneira que ele se livra das pessoas incomodas. Ele acabou de humilhar um senador [Mercadante] com importantes serviços ao partido”, considera.
Na opinião do sociólogo, a maneira dura como o presidente dirige o partido resultou na escassa criação de novos quadros para o petismo. “Aquele que não obedece, ele destrói. Por isso que ele não tem sucessor. Para a candidatura à presidência, ele buscou um quadro que não é tradicional no partido [Dilma veio do PDT em 2000]. Em São Paulo, onde o partido nasceu, não há candidato. E o senhor Luiz Inácio Lula da Silva tem uma grande responsabilidade nisso”, avalia.
Filiações e posturas
A flexibilização em acordos partidários e a mudança de perfil apontada por Oliveira, tem trazido frutos ao PT. O senador Flávio Arns é fundador do PSDB e tornou-se petista no início desta década, após convite do diretório regional do Paraná. Valter Pomar, secretário de Relações Internacionais do partido, critica filiações como a de Arns. “O senador Flávio Arns nunca deveria ter entrado no PT. Sua conduta sempre foi tucana. Sua saída é benéfica e demonstra o erro dos que querem ampliar o PT, atraindo pessoas sem identidade ideológica”, defende.
Pomar também critica a postura instável de Mercadante, pelo fato de este ter sido um dos arquitetos da ampliação do leque de alianças do PT. “A conduta de Mercadante foi errática e errada. A 'escolha de Sofia' que tivemos que fazer no Senado é em grande medida produto de uma estratégia construída desde 1995, estratégia da qual Mercadante é um dos construtores. Sempre dissemos que esta estratégia tinha seus custos, inclusive eleitorais. O senador Mercadante, pelo visto, só descobriu isto agora, mas sua reação frente a isto foi errada, pois ele sabe muito bem que ruim com Sarney, pior com Marconi Perillo e a tucanagem”, analisa.
Dilma como alvo
A oposição tem como principal foco eventuais denúncias que envolvam a ministra Dilma, candidata do PT à sucessão. Tudo que foi levantado contra ela até o momento seria uma reunião entre ela e a ex-secretária da Receita Federal, Lina Vieira. Procurada pelo jornal Folha de S. Paulo, Lina afirmou que, em reunião com Dilma, a ministra teria pedido celeridade nas investigações da Receita sobre Fernando Sarney, filho do presidente do Senado.
A ex-secretária – esposa de um ex-ministro de FHC – foi convocada a depor no Senado. Inquirida, disse não lembrar da data da reunião, mas recordou dos trajes da ministra. “A oposição está em campanha e seu alvo é o PT e Dilma. As acusações feitas contra ela são patéticas: a própria acusadora, além de ter problemas de memória, afirma que o suposto pedido da ministra não tinha nada de irregular. Quanto ao PT, o problema é político: a oposição, que quando era governo tinha aliança com o PMDB, acusa o PT pelos erros e crimes de peemedebistas”, diz Pomar.
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