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sábado, 7 de novembro de 2009

As lisonjas e o respeito


por Mauro Santayana, no Jornal do Brasil

Os elogios que partem do estrangeiro ao desempenho da economia brasileira devem ser recebidos com cautela. Se observarmos bem, eles não se destinam à nossa autonomia na administração do Estado, nem aos esforços a fim de reduzir as penosas desigualdades sociais que nos constrangem, mas ao fato de que continuamos (o que não é verdade inteira) a política de abertura do governo passado.

Ainda agora, o presidente Lula é agraciado, na Chattam House, em Londres, e, em Madri, a Fundação Marcelino Botin, do Banco Santander, encerrou, quarta-feira, um seminário sobre o Brasil, visto como futura “potência latina”, desde, é claro, que mantenha abertas as suas portas aos investimentos estrangeiros. O Banco Santander, graças ao Brasil, é hoje o maior banco espanhol e um dos maiores do mundo. Como todos se recordam, o Santander adquiriu o Banco do Estado de São Paulo, em uma operação ainda não muito clara. Antes, já havia adquirido outros bancos menores. E, depois, adquiriu bancos maiores, entre eles o Amro. A Fundação Marcelino Botin é também presidida pelo senhor Emílio Botin, principal acionista do Santander, que também acompanha, com empresários brasileiros, a visita de Lula à Inglaterra. Há poucas semanas, o Santander Brasil aumentou seu capital, de mais de R$ 49 bilhões, para mais de R$ 61 bilhões.

Os mineiros ficam sempre desconfiados quando recebem excessivos elogios. A pergunta que se fazem é: o que estão querendo de mim? O que estão querendo do Brasil, com essa série de elogios, não só a seu presidente, mas ao país? Os espanhóis se encontram em uma situação econômica complicada, como todos sabem, e eles não conseguem escondê-la. Por que se interessarem tanto pela economia brasileira, a ponto de promoverem a reunião em Madri, com a presença de brasileiros, alguns membros do governo, e especialistas estrangeiros, em lugar de discutirem profundamente as causas da recessão em seu próprio país?

O jornal El País publicou ontem um artigo do jornalista conservador Federico Ysart Alcover, diretor do Observatório de Análises e Tendências da Fundação M. Botin, que promoveu o encontro sobre o Brasil. Nada pode ser mais explícito. Ele pergunta se o Brasil está disposto realmente a transformar-se em uma potência e esclarece, que, para isso, a sociedade e o governo devem continuar a política do governo anterior, de abertura dos mercados aos estrangeiros, e aprofundar a globalização. É interessante que se faça o elogio do governo neoliberal de Fernando Henrique Cardoso, nas mesmas horas em que o ex-presidente entra em cena com seu artigo-plataforma. Federico Ysart é homem ligado ao Banco Santander há muitos anos, e pertenceu ao governo conservador de Adolfo Suarez. Foi, ainda, deputado federal pela UCD. E lhe coube coordenar o encontro de Madri, ontem concluído.

O banqueiro Emílio Botin é filho e neto de banqueiros da Cantábria, e não esconde que deu a sua maior jogada ao entrar no mercado financeiro brasileiro. Está sempre em nosso país, onde transita com grande desenvoltura, sendo figura constante nas festas e outros eventos sociais. O rei Juan Carlos concedeu, recentemente, à sua esposa, a pianista Paloma O’Shea, o título de Marquesa de O’Shea, o que fez de Emilio Botin o Marquês Consorte de O’Shea.

Desde o fim do franquismo, com a morte do ditador e a assunção do poder por Adolfo Suarez, os espanhóis decidiram recolonizar a América Latina. Os governos – incluídos os socialistas –, a partir de então, passaram a investir tudo nessa ofensiva, financiando a compra de empresas em nosso continente, mesmo à custa do aumento brutal de sua dívida pública, uma das maiores do mundo. Com a velha arrogância ibérica, chegaram a tratar governantes de nossos países como vassalos, como fez o direitista Aznar com o presidente Duhalde, da Argentina, a quem telefonava dando ordens e exigindo explicações. E nem vale a pena lembrar o “por qué no te callas” de Juan Carlos, em inaceitável ofensa ao presidente da Venezuela.

Enquanto o desemprego grassa na Espanha, seus empresários enchem os bolsos com os lucros obtidos em nossos países. Aqui, a Telefónica disputa a compra da GVT, para ampliar, ainda mais, a sua presença na telefonia brasileira. O seminário de Madri deve ser visto dentro desse quadro de fundo. É melhor dispensar as lisonjas, que soam interessadas, e criar instrumentos jurídicos e políticos que lhes fechem o caminho.

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