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sábado, 3 de julho de 2010

DNA TUCANO: 'Famiglias' da Máfia do transporte coletivo receberão rescisões “virtuais”


Prefeitura prevê R$ 41 milhões para empresas demitirem funcionários caso percam a concorrência, mas pelo menos seis deverão ser habilitadas e receber valores
A Urbanização de Curitiba (Urbs) deverá pagar cerca de R$ 41 mi-lhões em indenizações trabalhistas às dez empresas de ônibus que operam o transporte coletivo na capital. A dívida foi admitida pela Urbs nos acordos feitos para a primeira licitação do setor na cidade. Reportagem de ontem da Gazeta do Povo mostrou que somente a Cidade Sorriso, uma das permissionárias que atuam hoje e que concorrem na licitação, terá R$ 6,1 milhões para acordos trabalhistas.
Ao analisarem o caso, juristas veem a possibilidade de ilegalidade nos pagamentos, já que as atuais permissionárias podem lucrar com os acordos. A Cidade Sorriso e outras cinco empresas que operam em Curitiba deverão continuar prestando serviços. Elas integram os consórcios que estão na concorrência e, como há apenas um consórcio disputando cada um dos três lotes da licitação, a chance de continuarem é grande. Se isso ocorrer, as atuais permissionárias manterão o serviço e não precisarão demitir funcionários, mas receberão os valores previstos. Seria uma espécie de “rescisão virtual” bancada pelo poder público.

Os documentos envolvendo a licitação estão sob sigilo, já que a concorrência ainda não terminou. Uma auditoria externa foi contratada pela Urbs para verificar os acordos e os consórcios vencedores só serão divulgados após a conclusão do trabalho. Ontem, aGazeta do Povo mostrou que a Urbs reconheceu uma dívida total de cerca de R$ 200 milhões com as empresas. O valor poderá ser descontado dos R$ 252 milhões referentes à outorga da licitação (preço cobrado pelo poder público para conceder a exploração de um serviço).
A dívida total não diz respeito apenas a indenizações trabalhistas – também envolve a frota de veículos exclusivos utilizados em Curitiba, atrasos nos pagamentos da Urbs às concessionárias e prejuí zos das empresas com a utilização de vales-transporte falsos em 2003. Somente a Cidade Sorriso tem um crédito de R$ 39,4 milhões, o equivalente a 40% da outorga, que é de R$ 96,3 milhões no Lote 3.
Demissões
O acordo entre a Urbs e as empresas começou a ser costurado no ano passado e o representante das atuais operadoras foi o Sindicato das Empresas de Ônibus de Curitiba e Região (Setransp). Nas informações dadas ao Ministério Público do Paraná sobre o acordo com a Cidade Sorriso, a Urbs admite bancar a despesa que a empresa poderá ter com a demissão de motoristas e cobradores.
Em documento assinado em 28 de dezembro de 2009 (um dia antes da abertura da licitação), fica previsto que a empresa receberá R$ 6,1 milhões “para fins de provisionamento de indenização pelos custos que serão assumidos pela permissionária, após o encerramento da permissão, com a rescisão de contratos de trabalho de seu pessoal.” A Urbs permite ainda que a Sorriso desconte esse valor do preço de outorga. Segundo o site da Cidade Sorriso, a empresa tem 1.250 funcionários e administra uma frota de 245 ônibus.
O acordo não detalha o cálculo utilizado para definir o valor da dívida, mas, segundo o diretor de Transportes da Urbs, Fernando Ghignone, foi consultado o cadastro do FGTS de cada motorista e cobrador. Das 11 empresas que estão na licitação, seis são permissionárias hoje – Glória, Mare-chal, Mercês, Redentor, Cidade Sorriso e CCD (antiga Cristo Rei). As outras cinco são metropolitanas (Santo Antônio, Araucária, Expres-so Azul, Tamandaré e São José). As quatro últimas compraram as empresas da capital sem condições financeiras para participar do certame. Essas cinco também podem ser beneficiadas, pois o acordo prevê que as atuais operadoras podem vender o crédito com a Urbs.
A Urbs promete tornar públicos os detalhes dos acordos quando a licitação for concluída, o que pode acontecer neste mês. Até o fechamento desta edição, o Setransp não retornou os pedidos de entrevista sobre o assunto.
Juristas questionam legalidade da medida
Em tese, o poder público não deve ser responsável pelas indenizações trabalhistas decorrentes do fim de contratos firmados com a iniciativa privada para a prestação de serviços. Essa é opinião de dois especialistas em Direito Administrativo ouvidos pela reportagem. Porém, mesmo entre advogados que estudam o tema a opinião não é unânime. Os três consultados comentaram o assunto em tese, sem analisar o caso específico da licitação do transporte coletivo em Curitiba.




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