Aos 39 anos de idade, Alexandre Padilha, médico infectologista formado pela Unicamp, soma vasta experiência em saúde pública. Foi coordenador do Núcleo de Extensão em Medicina Tropical do Departamento de Doenças Infecciosas e Parasitárias da Faculdade de Medicina da USP (Numetrop/USP), entre 2000 e 2004, período em que também coordenou a área de Projetos de Pesquisa, Vigilância e Assistência em Doenças Tropicais, no Pará, uma ação realizada em parceria com a OPAS/OMS.
Ainda em 2004, Alexandre Padilha assumiu o cargo de diretor Nacional de Saúde Indígena da Funasa, órgão ligado ao Ministério da Saúde. Nomeado ministro de estado chefe da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República em setembro de 2009, Padilha atuava na coordenação política do governo Lula desde agosto de 2005, quando ingressou na Subchefia de Assuntos Federativos (SAF), a qual chefiou entre janeiro de 2007 e a posse como ministro. Membro do PT, Alexandre Padilha integrou a coordenação das campanhas presidenciais de Luiz Inácio Lula da Silva (1989 e 1994) e da presidente Dilma Roussef (2010). Em entrevista exclusiva ao site, o ministro da Saúde aborda questões sensíveis à organização e aos avanços do SUS.
Como reorganizar a Atenção Básica de forma a evitar que os usuários do SUS busquem consultas diretamente com especialistas, em hospitais, sobrecarregando o serviço? Há um projeto em andamento?
O sistema está em plena reorganização e uma das propostas da presidenta Dilma Rousseff é valorizar ainda mais este segmento da saúde pública. A ampliação do acesso à saúde com acolhimento de qualidade tem como um dos pilares fundamentais o fortalecimento da Atenção Básica. Essa perspectiva já começa a representar uma mudança significativa em relação ao modelo anterior, que colocava o hospital como centro da atenção à saúde.
Estudos demonstram que a atenção básica pode resolver mais de 80% dos problemas de saúde das pessoas. Por isso, temos feito um importante esforço no Brasil para constituir uma rede integrada que acolha e resolva os problemas das pessoas, evitando filas nos hospitais e o gasto desnecessário de recursos públicos.
A Estratégia de Saúde da Família é a principal porta de entrada do cidadão na rede pública de saúde. As equipes de Saúde da Família são responsáveis por ofertar uma atenção integral que passa pela promoção da saúde, vai para a prevenção de doenças e encaminhamento a especialistas, e ainda inclui a recuperação da saúde desde a primeira atenção aos casos agudos e urgências até o cuidado longitudinal dos agravos crônicos.
Hoje já temos 31.660 equipes de Saúde da Família que abrangem 100 milhões de brasileiros. Elas estão presentes em 5.294 municípios, ou seja, 95% do total. Na Atenção Básica, prevemos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC II) o investimento de R$ 5,5 bilhões na construção de 8.694 Unidades Básicas de Saúde (UBS). Somente em 2011, serão R$ 565 milhões em 2.122 novas UBS.
Muitos portadores de doenças crônicas não têm acompanhamento na Atenção Básica, porque não querem ou porque acabam ficando fora do serviço e o quadro evolui para a Alta Complexidade. Quais os planos do Ministério da Saúde, nos estados, para ficar mais próximo deste usuário?
Praticamente dobramos a cobertura populacional das equipes de Saúde da Família desde 2002, quando atendíamos 55 milhões de pessoas no Brasil. Essa ampliação nos possibilita fortalecer as ações de prevenção a doenças e de promoção da saúde e bem estar, na prática, mais próximos aos usuários do SUS. A Estratégia Saúde da Família amplia de fato o acesso dos brasileiros aos serviços básicos de saúde, desde consultas e exames até as visitas regulares dos profissionais de nossas equipes aos domicílios dos cidadãos. É o SUS batendo à porta de casa.
Essa maior proximidade do usuário do SUS, que viemos conquistando e vamos aprimorar ainda mais, está integrado às campanhas de promoção da saúde e a ações jamais feitas antes, como disponibilizar gratuitamente em 15 mil pontos do Aqui Tem Farmácia Popular de todo o País medicamentos para quem tem hipertensão e diabetes. Acabamos de realizar essa promessa de campanha da presidenta Dilma.
Essas são duas doenças crônicas muito preocupantes do ponto de vista epidemiológico, porque são responsáveis por 34% do total de óbitos do Brasil. Dentro dos programas Aqui Tem Farmácia Popular e do Farmácia Popular do Brasil, vamos avaliar como ampliar ainda mais o acesso de pessoas com doenças crônicas, como essas, a medicamentos subsidiados ou gratuitos.
Como o Ministério da Saúde atuará para obter a tão desejada intersetorialidade nas ações de governo?
Ações integradas entre os diversos órgãos de governo, estados e municípios já são uma realidade. Alguns exemplos: a revalidação de diplomas de médicos do estrangeiro e o investimento na residência médica em lugares longínquos e com escassez de profissionais, em parceria com o Ministério da Educação; o investimento de R$ 780 milhões em pesquisa, entre 2003 e 2010, juntamente com fundações estaduais de amparo à pesquisa e o Ministério da Ciência e Tecnologia; a participação de militares das Forças Armadas nas atuais ações de orientação para o controle da dengue em diversos estados, especialmente onde existe risco maior quanto ao sorotipo DENV-4, como Amazonas e Roraima.
Entre as ações que estamos empreendendo, destaco especialmente o Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack e outras Drogas, da Presidência da República. É um Plano que envolve diretamente o Ministério da Saúde e a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (SENAD), que juntos estão investindo R$ 140,9 milhões, e outros órgãos federais. No Plano, estamos implantando mais 6.120 leitos para o atendimento de usuários e aprimorando o acolhimento fora dos hospitais.
O fortalecimento da prevenção e da atenção aos usuários de álcool, crack e outras drogas é inclusive um dos compromissos da presidenta Dilma, que depende substancialmente de aprofundarmos cada vez mais as ações integradas com estados e municípios.
A previsão do atual governo é ampliar o repasse da saúde a estados e municípios e aperfeiçoar os mecanismos de acompanhamento, monitoramento e controle social dos recursos. A idéia é, ainda, priorizar o combate ao desperdício e a desvios de recursos, modernizar e profissionalizar a gestão do SUS.
Muito se fala em UPAs, Unidades de Pronto Atendimento, não seria mais adequado reestruturar as unidades básicas e os hospitais de referência? As UPAs parecem ser apenas mais uma unidade de saúde e não uma unidade que traga diferencial.
Postos e centros de saúde atendem os cidadãos em suas necessidades mais básicas. Os hospitais, nas necessidades mais complexas. A ampliação do atendimento intermediário vai reduzir as filas que vemos à porta das emergências dos hospitais, possibilitando o atendimento a fraturas e queimaduras e cuidados iniciais em casos como AVCs, por exemplo.
Nesse contexto, em que priorizamos a integração dos serviços de saúde, as Unidades de Pronto Atendimento 24 Horas (UPAs) são fundamentais para o atendimento a pacientes encaminhados pelas equipes de Saúde da Família e pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU/192). E o grau de resolutibilidade das UPAs ultrapassa os 97%. Isso significa que 3% dos pacientes que ali chegam precisam de transferência para hospitais, depois de receber o primeiro atendimento. O fundamental é não perder a perspectiva de que estamos construindo uma rede de atendimento as urgências e emergências no País.No PAC II, de 2011 a 2014, vamos investir R$ 2,6 bilhões na construção, compra de equipamentos e no custeio de 500 UPAs. Ainda neste ano de 2011, serão investidos R$ 268,4 milhões em 139 UPAs distribuídas por 115 municípios. Já temos hoje, no Brasil, 100 UPAs com recursos da União, seja na construção, nos equipamentos ou no custeio, em pleno funcionamento.
Mais um Verão com dengue. O mosquito e o vírus estão fortes no Brasil desde o final da década de 90. Todas as campanhas publicitárias focam na necessidade de intervenção das pessoas, da comunidade, ou seja, pedem mudança de comportamento. Mais de 10 anos depois, não teria chegado a hora de fazer um diagnóstico dessas campanhas e avaliar o que não deu certo e o que deu?
Primeiro, é importante destacar que em geral as pessoas não se dão conta de que a dengue não é apenas um problema do setor Saúde. Envolve também questões relacionadas ao clima, ao meio ambiente, à infra-estrutura das cidades, ao saneamento básico, à coleta de lixo, enfim, fatores que contribuem para a manutenção do mosquito transmissor, o Aedes aegypti, no ambiente.
Essas condições tornam impossíveis hoje a eliminação do mosquito transmissor. Por isso, a principal arma é o controle dele, que deve priorizar a eliminação dos criadouros. Isso pressupõe uma ação conjunta do setor público, dos governos federal, estaduais e municipais, e também do setor privado, das igrejas, das escolas. E, claro, o apoio da população. Hábitos já conhecidos do público, como eliminar a água dos pratos de plantas, limpar calhas e ralos, cobrir reservatórios de água, não deixar pneus e recipientes que possam acumular água a céu aberto ainda são armas poderosas.
Pesquisas do Ministério da Saúde sobre nossas campanhas de prevenção e combate à dengue mostram que 91% das pessoas se sentem informadas sobre como se pega a doença. Mas, contraditoriamente, 55% dos entrevistados acham que se o vizinho não tomar as precauções necessárias para evitar o mosquito, as medidas que ele mesmo adotar não vão adiantar. É um paradoxo. Precisamos mobilizar cada vez mais a população para transformar seu conhecimento em ação. Essa é uma responsabilidade do poder público e de vários outros atores, incluindo os veículos de comunicação, que têm um papel fundamental.
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