Por Carolina Pombo, psicóloga, mestre em saúde pública pela ENSP, editora do blog What Mommy Needs.
O Governo acaba de anunciar o lançamento de mais um programa voltado para a saúde materno-infantil. A começar pelo nome, a nova estratégia do Ministério da Saúde não parece afinada às demandas das mulheres e dos movimentos sociais em torno do parto. A Rede Cegonha não enfatiza a diminuição dos índices de cesarianas desnecessárias e não garante uma mudança na formação médico-obstétrica para a humanização do parto e nascimento. Ela anuncia uma verba significativa para o programa, priorizando as regiões com maiores índices de mortalidade, mas não se preocupa com os altos índices de nascimento pré-termo e de bebês com baixo peso nos estados mais ricos, como Rio de Janeiro e São Paulo. Ela prevê a criação do Centro de Parto Normal, uma entidade externa à maternidade e diferente das Casas de Parto já existentes, mas também garante mais leitos e mais verbas para as Casas da Gestante e do Bebê, que são as novas estruturas para atendimento de gestantes de alto risco. Ou seja, os nomes adotados pelo programa deixam claro a manutenção da forma de atendimento centrada no médico e na doença. Se, do contrário, as estruturas de atendimento a partos normais se chamassem Casas da Gestante e do Bebê, haveria mais chance do programa ser afinado a uma concepção humanizada da gestação.
A Rede Cegonha parece assim ser resultado de um governo sem um projeto claro e bem definido para a saúde das mulheres brasileiras. Ao mesmo tempo que ele reconhece a insuficiência do modelo atual adotado pelo SUS, acolhe as demandas corporativas e econômicas que não prezam prioritariamente pela humanização. É provável que, com este programa, o Brasil continue a aumentar sua taxa de cesarianas, com todas as consequências que temos debatido.
O Brasil precisa de profissionais preparados para atender parturientes saudáveis, em trabalho de parto normal, sem intervenções desnecessárias. Assim, como em países desenvolvidos com sistemas de saúde públicos e mixtos, o Brasil deveria adotar a regulação e treinamento de parteiras, as chamadas midwives. É o que conclui o artigo de Ruth Hitomi Osawa, Maria Luiza Gonzales Riesco e Maria Alice Tsunechiro, na Revista Brasileira de Enfermagem. Elas fazem uma rápida análise do histórico da profissão de parteira e do embate com a classe médica e de enfermagem na Inglaterra, nos EUA e no Brasil, e mostram que as decisões políticas que impediram ou incentivaram o exercício da profissão foram pautadas pelas demandas corporativas mais do que pelas exigências da população. O que promoveu, na verdade, a regularização e reconhecimento das parteiras na Inglaterra foi um caso de morte materno-infantil durante o parto – uma tragédia que serviu de catalisador para mudanças positivas nas políticas públicas, porque a população se manifestou.
É por isso que o What Mommy Needs entrou na luta pela manutenção do curso de Obstetrícia da Faculdade de São Paulo. Seria o melhor dos mundos se nosso país adotasse uma política pública afinada à humanização, e que a preparação dos médicos e enfermeiras com uma mudança significativa nas graduações fosse uma prioridade. Então, nesse mundo ideal, a profissão de obstetriz seria apenas uma especialidade. Mas, a realidade é que os profissionais que desejam trabalhar com o parto e o nascimento, por uma ótica diferenciada, absorvendo o conhecimento tradicional de parteiras, sob um olhar multi-dimensional focado na saúde e no parto normal, tem que se agrupar em cursos diferentes, às vezes, desconhecidos do governo e do público em geral. Portanto, uma graduação com este perfil de estudantes e disciplinas significa a ampliação do reconhecimento desses profissionais e de uma demanda legítima da população feminina informada e cidadã. Nós, mulheres, queremos parir de forma natural, num ambiente acolhedor, na companhia de pessoas que amamos, e de profissionais que respeitem nossa fisiologia.
Por isso, sugiro que você, mulher e também homem, se informe e participe dessa luta por um nascimento mais feliz e saudável.
A USP, no seu representante maior, o Reitor, não pode abandonar os alunos sózinhos na luta contra o COFEN. Ele, como advogado, deveria ser o primeiro na frente dessa luta defendendo aquilo que ele representa, a Instituição e seus Alunos.
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