Nenhum estado brasileiro gastou mais com internações hospitalares em 2010 do que o Paraná – seja na quantidade de procedimentos por habitante como na despesa proporcional ao número de moradores, segundo dados do Datasus, do Ministério da Saúde. O primeiro lugar, no entanto, é resultado de uma artimanha: dois terços dos municípios excederam o limite de custeio para internamentos estabelecido pelo próprio governo, em comum acordo com as prefeituras. Até o mês passado, cada cidade poderia internar por ano o equivalente a no máximo 8% da população local, recebendo recursos de acordo com o número de autorizações de internamento hospitalar (AIHs) emitidas.
Mas não foi isso que ocorreu. Pelo menos 264 dos 399 municípios apresentaram gastos acima da cota, que, em alguns casos, chegou a 14% da população. A Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) estima que o excedente com internações causou um rombo de R$ 7 milhões no ano passado. Em negociação com o governo federal, o Paraná conseguiu verba para cobrir a dívida, mas precisou se comprometer a rever a sistemática de internações. Agora, o limite baixou para 7,5% e a Sesa promete fazer um controle rigoroso do cumprimento do teto.
Essa medida deve ter dois efeitos imediatos: ampliar os problemas financeiros da maioria dos hospitais do estado e forçar uma reavaliação de todo o sistema de saúde no Paraná, com foco na atenção básica e preventiva. Em tese, ninguém deixará de ser internado por falta de AIH. Mas sobrará para as prefeituras arcar com as despesas que excederem o limite. Situação que provoca ainda mais reclamação. Gestores municipais alegam já gastar em saúde muito além do que podem e do que determina a lei – 15% do orçamento. A Associação dos Municípios do Noroeste Paranaense (Amunpar), por exemplo, emitiu uma nota pública contestando a redução na proporção do repasse.
Valores
O dinheiro que custeia os internamentos vem do governo federal, mas é o estado que regula os gastos. De partos a transplantes, cada procedimento médico gera uma AIH e o valor de cada guia varia de acordo com a complexidade do procedimento – de R$ 400 a R$ 70 mil. No Paraná, o custo médio é de R$ 1 mil. Por mês, acontecem 65 mil internações nos 458 hospitais que atendem pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no estado.
A Sesa evita falar em diminuição de recursos para os hospitais. Argumenta que determinou a redução na faixa proporcional de AIHs, mas atualizou a base do número de moradores, agora feita de acordo com o Censo de 2010. Há dez anos, 8% da população do Paraná representavam 762 mil pessoas e atualmente 7,5% equivalem a 782 mil pessoas – ou seja, com a atualização da base populacional, a diminuição no limite de AIHs ainda significaria mais repasses.
Em Uraí, no Norte do Paraná, a redução de meio ponto porcentual no repasse de verbas de AIHs representará R$ 7,5 mil a menos por mês. A cidade tem 40 leitos e recebe do SUS por 89 internamentos mensais, sendo que 23 são de São Jerônimo, que encaminha basicamente partos, e cinco de Rancho Alegre. Os dois municípios não têm hospital. “O dinheiro das AIHs vai para custear o funcionamento do hospital e ainda falta”, conta o secretário municipal, Donizete Ruiz Pinha.
No ano passado, o hospital já passou por problemas financeiros e foi feito um empréstimo consignado, com base no valor de repasse de AIH, para pagar as dívidas. Para este ano, a alternativa foi rifar um terreno para conseguir mais recursos. “Será que estamos preparados para perder os pequenos hospitais sem que haja morte de pacientes?”, indaga.
Segundo a superintendente de Gestão em Saúde da Sesa, Márcia Huçulak, apesar de gastar mais com internações, o Paraná não tem o melhor sistema de saúde. “Nossa população está insatisfeita com a assistência que recebe, e com razão. Temos leitos em quantidade suficiente, mas falta qualidade. Portanto, é preciso mudar esse sistema, e mudar radicalmente qualificando o gasto e melhorando a assistência”, avalia.
A Sesa alega que o parâmetro de 7,5% segue uma diretriz do Conselho Nacional de Saúde e que houve acordo sobre a redução dos parâmetros numa comissão formada por representantes dos municípios.
Cidades vão perder hospitais, dizem gestores
Gestores municipais ouvidos pela reportagem e que pediram anonimato afirmam que o novo teto para internações e o rigor no cumprimento da regra vão inviabilizar a administração hospitalar em muitas cidades. “Qualquer redução [no repasse de verbas], mesmo que pequena, vai derrubar os hospitais pequenos, que já trabalham no vermelho”, diz um deles.
Os administradores acreditam que a situação caminha para um cenário de cidades pequenas sem hospital para partos e procedimentos mais simples e de cidades maiores com hospitais cada vez mais superlotados. “Vamos voltar à era das ambulâncias em que a única coisa que as cidades menores podiam fazer era encaminhar pacientes para os hospitais maiores”, afirma outro gestor.
Um terceiro gestor consultado faz uma previsão pessimista: a redução no número de AIHs (autorizações para internação hospitalar) acarretará no fechamento em massa de pequenos hospitais. “O comentário é um só: a quantidade de autorizações já era insuficiente para os atendimentos”. Para ele, o que fez com que pequenos hospitais diminuíssem a capacidade de resolver os problemas dos pacientes foi a gradativa retirada de AIHs para os centros maiores, levando o recurso e assim também os profissionais qualificados. “É necessário alimentar a rede hospitalar e não acabar com ela”, afirma.
O presidente da Federação dos Hospitais do Paraná, Renato Merolli, informa que a entidade está levantando informações para calcular o impacto que a redução do teto (de 8% para 7,5%) terá no sistema, mas declara que atualmente já está complicado manter os estabelecimentos.
COMENTÁRIO: Interna-se muito e interna-se "mal". Pelo menos 50% (!!!) das internações - em pequenos hospitais de pequenos municípios - são de condições sensíveis a atenção ambulatorial.
Interna-se para fazer inalação, para fazer exames, para "tomar soro" e a campeã: para "observação".
Casos mais complicados ficam internados até conseguir vaga em outros hospitais, fazem passeio da ambulância e vão gerar mais AIH`s em outros municípios, aumentando o percentual.
Todas estas condições dispensariam internamento caso se tivesse uma Atenção Primária implementada, efetiva e eficiente.
O que não pode, é o SUS continuar financiando com AIHs os hospitais ineficientes, deficitários e desnecessários que existem por aí.
Alguns terão que ser desativados SIM. Não dá para desfinanciar o sistema como um todo só para manter eternamente vaidades e distorções de poucos.
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