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quarta-feira, 17 de agosto de 2011

A polêmica avaliação dos hospitais psiquiátricos no Brasil


Avaliar os hospitais para ampliar financiamento  como dispositivos da rede ou para fechamento dos precários, investindo na rede de atenção substitutiva?
por Emanuelly Paulino Soares, Psicóloga, especialista em saúde da família, (twitter: @EmanuellyPS)
Nesta última terça-feira, 16 de Agosto de 2011, foi transmitida pelo site do Ministério da Saúde (www.saude.gov.br/temporeal), uma videoconferência sobre a proposta de avaliação dos hospitais psiquiátricos públicos e privados do país, prevista na Portaria Ministerial n.1704/2011. Esta videoconferência teve como objetivo discutir a participação dos Estados no processo de aplicação e consolidação do instrumento a partir da elaboração de um relatório com as informações apontadas em 65 itens e subitens.
A videoconferência iniciou às 09h00 e foi encerrada às 12h:30 aproximadamente, contando com a participação da maioria dos Estados, que assistiam das Salas de Videoconferências do DATASUS, bem como, a participação de outros interessados que acompanhavam pelo site.
A equipe responsável pela realização, contou com a presença do Diretor do DENASUS/MS, Adalberto Fulgêncio, que fez a fala de abertura, priorizando na sua fala os três movimentos em andamento no MS: a auditoria dos mamógrafos;  dos laboratórios de citopatologia; e, visita técnica de avaliação dos hospitais psiquiátricos. Reforçou a importância de todos na garantia do sucesso destas ações.
Em seguida, foi o pronunciamento do Coordenador da Área Técnica de Saúde Mental do MS, Dr. Roberto Tykanori, que reafirmou a importância do movimento, disparado a partir de visita técnica da equipe do MS, a um hospital psiquiátrico na cidade de Sorocaba-SP, onde se identificou óbitos ocorridos frequentemente, sem investigação ou causa mortis definida, na maioria dos casos.
Após as falas iniciais, Veralúcia Marques, Coordenadora da ação, junto a equipe técnica responsável, discutiu item por item do instrumento na tentativa de providenciar a discussão com os atores dos Estados, que poderiam, seguidamente, comentar ou sugerir a respeito.
O instrumento foi construído pelas equipes técnicas do DENASUS/MS, CSM/SAS/MS e outros colaboradores. Tem como objetivo realizar uma avaliação técnica dos hospitais psiquiátricos públicos e privados aos olhos da Política Nacional de Saúde Mental. Será aplicado a partir do mês de setembro de 2011 sem Comunicado de Auditoria prévio. As equipes montadas pelos Estados serão responsáveis pela aplicação do roteiro de 02 a 03 dias em cada instituição e, consolidação das informações em relatório final, que deverá ser encaminhado para o MS, para sistematização final. Pretende-se concluir toda essa ação até novembro de 2011, entregando ao Sr. Ministro da Saúde, Alexandre Padilha, o produto final.
Principais pontos do Instrumento:

Identificação do Estabelecimento
Qualificação dos responsáveis (diretores gerais e administrativos)
- Número de leitos (CNES e encontrados)
- Leitos de intercorrência clínica (não faz parte do número total de leitos)
- Leitos masculinos e femininos; Leitos de crianças e adolescentes menores de 18 anos; Leitos particulares e de convênio
- Avaliação da Clientela Internada (situação – número de pacientes – tempo de internação)
- Óbitos ocorridos em 2010 e de janeiro a junho de 2010 (números e causas básicas)
- Altas em 2010 e de janeiro a junho de 2010
- Tempo médio de permanência do usuário no serviço
- Percentual de usuários que recebe BPC, sem identificação, internados sobre ordem judicial, que têm alta médica e não saíram do hospital, com registro de pessoa como referência
- O controle das internações é feito por meio da central de regulação? Se não tem, qual a principal instituição demandante?
- O hospital é visitado pela gestão estadual/municipal?
- Se sim, qual a regularidade até 6 meses, 6-12 meses, mais de 12 meses?
- Tem alvará/inspeção sanitária?
- Está atualizado?
- Qual a principal causa identificada de ter paciente morador?
- Como se dá o sistema de referência/contra-referência para os ambulatórios? E nos casos de urgência e emergência?
- Como é feito o transporte de pacientes?
- Qual alternativa utilizada?
Estrutura física:
- O hospital está adaptado para 100% dos pacientes ou não?
- Conta com um sanitário para no máximo duas enfermarias?
- Os leitos dos pacientes são identificados?
- Os espaços entre os leitos permitem a circulação dos pacientes?
- Há conservação e limpeza dos mobiliários?
- Há adaptação para cadeirantes e macas na área interna?
- Sala de curativo; sala para intercorrências clínicas; farmácia;
- É utilizado dose individualizada? Há rotinas escritas na farmácia?
- Área externa e área de lazer (equipamentos, espaço físico…)
- Lavanderia
- Nutrição e dietética (Cozinha e refeitório…)
Comissões Internas (Comissão de revisão de prontuário; infecção hospitalar; revisão de óbitos; de ética…)
- Possui Projeto Terapêutico escrito? É multidisciplinar? Como se dá essa atuação interdisciplinar? Há PTI? Consta no prontuário? Para que tipos de pacientes? Há registro de trabalho para alta hospitalar no PT?
- Documentação e Prontuário: Prontuário único? Evolução semanal? As evoluções no prontuário refletem a evolução real do usuário? Existe anotação por turno diurno/noturno pelo auxiliar de enfermagem?
- Qualificação da atenção: O paciente circula pelas áreas da instituição? Realiza reuniões clínicas multiprofissionais periódicas? Promove atividades envolvendo familiares e pacientes? Realiza atividades extra-hospitalares? Tem acesso ao uso de telefone? Há licença terapêutica? Visitas de familiares diárias? Há protocolo escrito para contenção física? Realiza eletroconvulsoterapia? Caso sim cumpre o disposto na resolução CSM? Referencia para psicocirurgia? Os pacientes apresentam-se com roupas limpas e individualizadas? Apresentam-se calçados? Tem acesso a espelho, absorvente?
RH: Quatro categorias: Categoria profissional; CH total necessária/encontrada
Anotações relevantes que não constam no instrumento
Conclusão

Minhas considerações:
  1. Não ficou claro durante a videoconferência, qual o foco desta ação. Uma prova disto é que a maioria dos representantes dos Estados teve dúvidas a esse respeito. É auditoria ou visita técnica? Como equipes do CEAUD's irão conduzir uma ação sem contarem com equipes de assistência no apoio?
  2. As equipes dos CEAUD's têm dificuldade com termos e conceitos da Saúde Mental (Reforma Psiquiátrica, desospitalização, cuidado integral, serviços substitutivos, etc), um fato que pode prejudicar a aplicação do instrumento.
  3. No instrumento, sinto falto de itens relativos à Educação Permanente dos Profissionais, ex.: A instituição investe na formação continuada dos profissionais?; Controle Social, ex.: O Conselho Estadual de Saúde realiza visitas periódicas à instituição?; Informações sobre a população negra, prisional e usuários abusivos e/ou dependentes internados nestes hospitais, serão relevantes dados epidemiológicos; Geração de Renda, ex.: A instituição investe na qualificação para o trabalho? Oficinas de geração de renda, hortas, fabricação de produtos comercializáveis?
  4. Durante a videoconferência, fica evidenciada a enorme dificuldade de trabalhar de forma integrada, com representantes colaboradores, dos três entes federados. Fato este, que pode prejudicar diretamente a ação.
Por fim, fica a dúvida quanto ao objetivo central desta ação: avaliar o funcionamento dos hospitais psiquiátricos públicos e privados para ampliar o financiamento SUS e contar como dispositivos da rede? Ou, avaliar para providenciar o fechamento destas instituições, diante das condições precárias, provavelmente identificadas e, garantir financiamento constante e progressivo da rede de atenção substitutiva ao hospital psiquiátrico?
Nesse sentido questionei ao Sr. Ministro da Saúde, via twitter, qual a o foco desta ação e obtive como resposta: "o foco é, pela 1ª vez, vistoriar cada um e checar se cumprem as diretrizes da Política Nacional de Saúde Mental cada um."
Sabemos que essa não é a primeira vez que os hospitais psiquiátricos são auditados, pois existem inúmeros relatórios de auditoria dos Estados e Municípios, bem como, o Relatório do Programa Nacional de Avaliação dos Serviços Hospitalares em Psiquiatria (PNASH, Portaria GM n° 799/00 e GM/MS n° 251/02), cujo roteiro foi utilizado na elaboração do instrumento de avaliação proposto pelo DENASUS/MS e CSM/SAS/MS em 2011.
Portanto, nos resta esperar a continuidade deste movimento, reforçando o debate na rede.


COMENTÁRIO da Diana Marilia Arenas:
É uma área muito carente de acompanhamento qualificado. Creio que esta iniciativa é sinal de interesse por parte do MS em corrigir muitas das irregularidades que existem. Há um par de semanas atrás houve matéria na Isto é denunciando a epidemia de torturas que ocorrem hoje em nosso país, principalmente em instituições prisionais e estabelecimentos psiquiátricos. Foi citado que uma comissão internacional estaria desembarcando em nossas terras para avaliar a realidade. Não é difícil entender que o MS queira dar uma chacoalhada... Só que concordo contigo, Mario: deve ser feito de forma solidária com a assistência, já que os conhecimentos se complementam, sob risco de estar diante de irregularidades e não identificá-las, situação que comprometeria demais o resultado. Um abraço Diana

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