Às vésperas da votação de projeto que disciplina gasto público em saúde, há consenso de que setor precisa de mais verba. Mas solução preferida pelo governo, a volta de imposto tipo CPMF, enfrenta resistências até de aliados. Para ex-ministro da Saúde, debate 'idelogizado' matou 'partido sanitário'. Mas ainda há defensores. 'Sou a favor de novo imposto', diz secretário paulistano.
André Barrocal e Maria Inês Nassif na Carta Maior
BRASÍLIA – Governo e Congresso reconhecem a necessidade de ampliar os gastos públicos na saúde, mas falta consenso sobre criar um imposto específico para a área. A situação do setor será discutida por deputados e autoridades nesta terça-feira (20), véspera de a Câmara retomar, depois de mais de três anos, a votação de projeto que impõe gasto estatal mínimo em saúde. O texto institui a Contribuição Social para a Saúde (CSS), uma espécie de nova CPFM. E, embora haja gente de peso a defendê-la, é improvável que seja aprovada.
Para o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), não há “clima político” a favor da CSS. Para o presidente da Frente Parlamentar da Saúde, deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), há “forte tendência” de reprovação do novo imposto. Até no governo, o sentimento é de pessimismo. “Acho muito difícil criar a CSS. O mais provável é que haja [para a saúde] um mix de fontes que já existem”, disse um ministro à Carta Maior.
O governo entrou de cabeça no debate sobre o caixa da saúde no início de setembro, por pressão de partidos aliados para que seja finalizada a votação do projeto da CSS. Originalmente, o projeto, que é do Senado, apenas definia os percentuais mínimos das receitas que Estados (12%), municípios (15%) e União (o último orçamento acrescido da taxa de crescimento econômico) investiriam. Mas, na Câmara, em 2008, houve uma alteração para incluir a CSS, o que paralisou a votação até hoje.
A presidenta Dilma Rousseff criticou abertamente os "demagogos" que rejeitam o aumento das receitas da saúde. O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, também publicamente, defendeu aumentar a taxação sobre cigarros e bebidas.
A esperança do governo era que, a partir dali, figuras públicas pudessem sair em defesa da CSS e ajudassem a criar um clima favorável na sociedade. Mas poucos cumpriram o roteiro. Uma das exceções foi o governador do Rio, Sérgio Cabral.
Em entrevista à Carta Maior, o secretário de Saúde da prefeitura paulistana, Januário Montone, também declarou apoio. “Sou a favor de um novo imposto para saúde, mas desde que, com o dinheiro, se faça política pública de saúde”, diz. Ele reivindica que a CSS seja repartida entre Estados (25%), municípios (25%) e União (50%).
Mas as manifestações, até agora, não parecem ter sido suficientes para que o Congresso tope enfrentar a opinião pública e criar a CSS. Três médicos ex-ministros da Saúde ouvidos por Carta Maior acreditam ser mais do que evidente que o setor precisa de mais recursos e de fontes novas. E, mesmo entre eles, há dificuldades para defender enfaticamente a volta da CPMF.
“Quando estava no governo, fui para a sociedade e defendi a CPMF. Agora não estou mais. A responsabilidade por apontar fontes é do governo e do Congresso”, afirmou Adib Jatene, para quem a imprensa tem sido eficiente em convencer a população de que a carga tributária no Brasil seria alta, do que ele discorda.
“Tenho simpatia pelo aumento da taxação de bebidas e cigasrros. Sobre a criação de um novo imposto, não tenho muita clareza. Deixo para especialistas em tributação”, disse José Gomes Temporão.
Especialista em contas públicas, Amir Khair, ex-secretário de Finanças da prefeitura de São Paulo, apoia a volta da CPMF. “Por quaiquer indicadores que se tome, a CPMF seria a melhor solução para o financiamento da saúde. Não é regressivo, pois capta mais dinheiro na parte de cima da pirâmide do que na de baixo", disse.
O terceiro ex-ministro, Humberto Costa, hoje líder do PT no Senado, lança uma hipótese para a dificuldade de ressuscitar a CPMF. Para ele, o debate ficou “ideologizado”. Cita como exemplo José Serra. O tucano era ministro quando o Congresso mudou a Constituição para impor gasto estatal mínimo no setor, mas hoje não apoia a CPFM. “Não há mais um 'Partido Sanitário'. Houve um racha entre os sanitaristas porque houve uma partidarização desse debate”, afirmou Costa.
Aliado do ex-presidente Lula e da presidenta Dilma Rousseff, o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, é um exemplo do problema apontado pelo conterrâneo Humberto Costa. Defensor da CPMF quando o Senado pôs fim ao imposto, em dezembro de 2007, hoje ele tem outra opinião.
“Não acho conveniente nem politicamente correto começar o debate pela criação de um novo tributo”, diz. Campos prefere reforçar a Saúde com um remanejamento orçamentário. “Se tiver uma redução da taxa de juros, alguns desses bilhões [gastos com juros da dívida] poderão ir para a saúde.”
Outro exemplo é o PMDB. É o partido do vice-presidente da República, Michel Temer. É o partido que mais tem pressionado pela votação do projeto na Câmara. E é o partido que, em fórum recente, listou a saúde com uma de suas bandeiras na eleição municipal de 2012. E, mesmo assim, não se mostra disposto a bancar volta da CPMF.
“O nosso sistema é muito bom. É claro que precisa de um pouco mais de financiamento, de investimentos", disse o presidente do PMDB, senador Valdir Raupp (RO), durante sessão do Senado que homenageou os 21 anos da lei do SUS. "E, sinceramente, eu não creio que haja necessidade de se criar um novo imposto para financiar a saúde."
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