Páginas

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Patentes farmacêuticas: acesso à saúde e desenvolvimento econômico

DIRCEU BARBANO

Diretor presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária(Anvisa)

Uma mudança na legislação brasileira sobre patentes determinou que aAgência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi) passassem a atuar juntos na análise dos pedidos de registro de patentes que envolvem fármacos e medicamentos. Ao texto da Lei de Patentes foi acrescentado o dispositivo que atribui à Anvisa o papel de participar das decisões sobre medicamentos, por meio de uma análise que recebeu o nome de anuência prévia.

A alteração se deu em 2001, quando a Lei de Patentes completava cinco anos. A partir da mudança até os dias de hoje, passaram pela análise da agência cerca de 1,6 mil solicitações de reconhecimento de patentes, das quais aproximadamente 10% não foram anuídas. Essas divergências entre as avaliações do Inpi e da agência, entretanto, não devem ser vistas como problemas.

Pontos de vista distintos não fragilizam o rigor do Estado brasileiro na concessão de patentes de medicamentos. Ao contrário, ampliam o olhar técnico e asseguram os interesses do país e os direitos daqueles que pleiteiam a proteção das patentes.

No início deste ano, a Advocacia-Geral da União (AGU) emitiu parecer buscando esclarecer os papéis do Inpi e da Anvisa no procedimento para reconhecimento das patentes. O texto da AGU mobilizou a sociedade para o debate e ainda está na pauta. Da perspectiva daAnvisa, o parecer da Advocacia-Geral da União é esclarecedor em relação aos pontos que têm permitido a exploração de um suposto conflito de competências entre a agência e o Inpi, alimentando teorias de fragilização da ação do Estado.

O parecer da AGU reconhece que a anuência prévia é condição sine qua non para a concessão de patentes de fármacos e medicamentos no Brasil, deixando claro que a exigência da lei não se aplica apenas às patentes pipeline, como alegam os porta-vozes com interesse no tema em suas manifestações públicas.

As patentes pipeline são concedidas em outros países, devendo o Brasil reconhecê-las sem novo exame de mérito, desde que estejam em vigência no país de origem e que o produto patenteado ainda não tenha sido introduzido no mercado. A propósito, para as patentes pipeline concedidas sem anuência prévia da Anvisa, o parecer da AGU indica que o INPI e a agência devem mover, conjuntamente, as devidas ações anulatórias.

No texto, a AGU também reconhece que a concessão de patentes de fármacos e medicamentos é ato complexo e, portanto, depende da manifestação de vontade da Anvisa e do Inpi para se tornar perfeito. Ou seja, esse entendimento afasta qualquer questionamento sobre a natureza da manifestação da agência.

A despeito da clareza da manifestação da AGU, persistem as observações que distorcem o teor do parecer, explorando a perspectiva sob a qual o governo federal teria como objetivo diminuir as atribuições da Anvisa, tornando frágil o nosso sistema de patentes no que se refere à proteção da saúde. Muito se fala, ainda, sobre a existência de uma disputa acerca do rigor e da capacidade de análise entre a Anvisa e o Inpi. Nesse ponto, o parecer da AGU indica que o exame da agência para anuência prévia não pode se ater aos quesitos de patenteabilidade que já são objetos da análise do Instituto Nacional de Propriedade Intelectual.

Uma portaria interministerial instituiu grupo de trabalho que deverá apresentar proposta para a articulação entre os dois órgãos envolvidos na concessão de patentes no Brasil aos ministros da Saúde e da Indústria e Comércio. A constituição desse grupo de trabalho reforça a construção de um ambiente jurídico estável e fortalece o sistema patentário brasileiro. O trabalho deverá ser apresentado no prazo de 60 dias, contados a partir da publicação da portaria, no último 17 de agosto.

Num contexto de atuação sinérgica, espera-se que o olhar sanitário, no seu sentido mais amplo, seja a base da análise das patentes de fármacos e medicamentos no Brasil. Isso certamente implica a adoção de medidas que não gerem riscos relacionados ao consumo nem situações de vulnerabilidade para o acesso a medicamentos considerados essenciais e vitais para a saúde pública.

Nenhum comentário:

Postar um comentário