Especialista aponta quais são as mudanças caso a profissão do médico seja regulamentada
Pois é. Advogado e atleta de futebol, por exemplo, têm leis que regulamentam suas profissões. Médico não, o que beira o absurdo.
Pode parecer estranho, mas a medicina, imprescindível à nossa vida, tão antiga como é e com os mais de 300.000 médicos no país, não é uma profissão regulamentada.
Há um Projeto de Lei (PL) de nº 268/2002 em tramitação no Senado Federal, com vistas à regulamentação do exercício da medicina.
E o que é uma profissão regulamentada?
Profissão regulamentada é aquela que tem uma lei de regência disciplinando direitos, deveres e garantias para o seu exercício.
Outro exemplos de profissão regulamentada são: enfermeiro, assistente social, fonoaudiólogo, fisioterapeuta e terapeuta ocupacional.
Há quem faça referência à lei 3.267/58 como a que regulamenta a medicina. O próprio Ministério do Trabalho e do Emprego na sua Classificação Brasileira de Ocupações – CBO, assim o faz.
Mas referida lei tem como escopo dispor sobre os Conselhos de Medicina e, dentre as outras providências, há alguns dispositivos que enfrentam o exercício da medicina, mas de forma incompleta.
Portanto, carece a medicina de uma legislação específica para o seu exercício, abarcando todas as suas implicações e nuances.
Estão especialmente envolvidos nas discussões e aprovação da lei o Conselho Federal de Medicina (CFM), a Associação Médica Brasileira (AMB) e a Federação Nacional dos Médicos (Fenam), que promoveram recentemente, inclusive, o I Fórum sobre a Regulamentação da Medicina.
No momento, o PL, que será analisado em conjunto com a proposta aprovada pela Câmara (7.703/2006), está na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), depois passará pela Comissão de Assuntos Sociais (CAS), votada em plenário e, por fim, remetida para sanção presidencial, caso tudo dê certo.
O que muda?
A profissão da medicina não está largada, isso é fato notório. Há várias resoluções do CFM, a própria lei 3.267/58, a lei 6.932/81 (dispõe sobre as atividades do médico residente), além da jurisprudência, que orientam e direcionam o exercício da medicina.
Mas não é o suficiente.
No PL há definição do objeto da atuação do médico, os objetivos das suas ações, as atividades privativas, entre outros. Muda a clareza como tudo é apresentado.
Isso traz mais segurança aos pacientes, valorização para os médicos e o aperfeiçoamento das relações institucionais.
A ideia é que toda a sociedade ganhe com a regulamentação.
Não há consenso com outros profissionais da saúde
A CCJ promoveu audiência pública em 29/09/11, que contou com a presença, dentre outros, dos presidentes do CFM, Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (COFFITO), Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) e Conselho Federal de Farmácia (CFF).
Há resistências não à regulamentação da medicina em si, mas em relação a alguns dispositivos do PL.
O presidente do CFF foi incisivo ao afirmar que: “não vamos permitir que nos seja retirado o direito de exercer a citopatologia ou citologia clínica. Esse exercício profissional, desenvolvido por todos os farmacêuticos brasileiros, vem desde 1931, com o advento do Decreto-Lei nº 20.377, e que reconhece como atividade a atribuição do farmacêutico bioquímico e que hoje se estende também aos biomédicos.”
De fato, no PL o exame citopatológico consta no rol das atividades privativas do médico.
Já o Sindicato Nacional dos Optometristas e o Instituto Brasileiro de Optometria defendem a supressão do inciso que especifica prescrição de órteses e próteses oftalmológicas como atividade também privativa do médico.
O Conselho Federal de Psicologia expõe que o PL veio para trazer discórdia entre os profissionais da saúde e que trata a medicina como profissão acima das outras.
Ou seja, nobre leitor, a impressão que temos é que os nove anos de tramitação deste PL não foram suficientes para encontrar o consenso com outros profissionais da área da saúde que se sentiram aviltados com alguns dos seus dispositivos.
Caso este PL torne-se lei, possivelmente haverá muita discussão nos tribunais. E, certamente, o maior prejudicado é o conjunto de milhões de pacientes pelo Brasil afora, em especial os mais carentes.
A todos os profissionais vale sempre a lembrança do que determina o art. 5º, inc. XIII, da CF: “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”.
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