matéria publica no sítio Anti Drogas em 12/02/2007
Dentro do grupo de 513 deputados federais que na semana passada iniciaram os trabalhos da atual legislatura, estreou uma bancada que teve parte da campanha paga pelo setor do tabaco. Empresas de beneficiamento de fumo e fabricantes de cigarros septuplicaram o volume destinado a financiamento eleitoral e ajudaram a eleger parlamentares de seis estados. Eles estarão exercendo seus mandatos, votando e apresentando projetos, quando serão travadas no Congresso algumas batalhas próximas que colocarão de um lado médicos e autoridades da área de saúde e, de outro, plantadores de fumo e indústrias de cigarro.
No total, o setor aplicou R$ 1,7 milhão em campanhas de candidatos a deputado e a governador nas últimas eleições. Desse volume, R$ 674,1 mil foram somente para 13 parlamentares eleitos para a Câmara. Se comparado a doações de outros segmentos, como o de empreiteiras, esse valor não é tão alto. No entanto, para um setor que não é fornecedor de órgãos de governo nem tem tradição de envolvimento em disputas eleitorais, o volume é grande.
Em 2002, beneficiadores de fumo e fabricantes de cigarro destinaram R$ 255 mil para todas as campanhas que auxiliaram, dos quais R$ 97 mil foram para cinco deputados federais eleitos. Assim, o aumento das doações de uma eleição para outra foi de 577% no volume total e de 512% no auxílio específico para deputados federais eleitos.
Em silêncio
No ano passado, o setor sofreu uma grande derrota no Congresso. Foi ratificada a adesão do Brasil à Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, proposta pela Organização Mundial da Saúde (OMS), e o país se comprometeu a adotar novas medidas de combate ao cigarro. Em compensação, no dia 31 de janeiro, no encerramento da legislatura, houve uma vitória silenciosa: foi arquivado na Câmara, sem passar pelo plenário, o projeto de 2000 que obrigava as indústrias fumageiras a reembolsarem o Sistema Único de Saúde (SUS) pelos gastos com doenças resultantes do cigarro.
Apresentada aos números que mostram o aumento no volume de doações para campanhas, Tânia Cavalcante, chefe da Divisão de Controle do Tabagismo do Instituto Nacional do Câncer (Inca), órgão do Ministério da Saúde, não titubeia. Para ela, beneficiadores e fabricantes estão se precavendo. “Está havendo uma tentativa de preparar o Congresso para os futuros embates”, diz. O país já tem uma legislação antitabaco avançada, mas novas medidas deverão ser tomadas a partir da ratificação da convenção
Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostram que as empresas do setor que mais doaram para campanhas em 2006 foram as beneficiadoras de fumo Alliance One (R$ 555 mil) e CTA – Continental Tobaccos Alliance (R$ 298,6 mil), ambas instaladas no Rio Grande do Sul, e a fabricante de cigarros Sudamax (R$ 522,5 mil), de São Paulo. Outras sete empresas do setor fizeram doações menores. Allan Kardec Nunes Bichinho, presidente da CTA, reclama de uma “perseguição” aos fumantes no país e deseja que os parlamentares beneficiados por doações sejam equilibrados. “Esperamos que eles vejam todos os lados da questão”, afirma. “Enquanto houver tanta gente querendo fumar, vamos produzir, na hora em que diminuir, vamos reduzir a produção e plantar girassol.”
A Alliance One informou em nota que as doações foram realizadas “no sentido de estimular a defesa de idéias”, e a Sudamax preferiu não se manifestar. “O setor se organizou para apoiar congressistas que se identifiquem ideologicamente com as nossas causas”, confirma José Henrique Nunes Barreto, presidente do Sindicato da Indústria do Fumo do Estado de São Paulo.
Os números das doações não são os únicos fortes no enfrentamento ao redor do tabaco. Defensores do plantio e consumo argumentam que só entre agricultores gaúchos há cerca de 90 mil famílias sobrevivendo graças ao cultivo do fumo, e outros milhares de pessoas trabalham fabricando cigarros e em empregos indiretos. Quem se opõe ao consumo cita estimativas que apontam estarem por trás da fumaça do cigarro 90% de todas as mortes por câncer de pulmão e ser o tabaco responsável por 200 mil óbitos de brasileiros a cada ano. Entre cifras como essas irão legislar os congressistas.
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