É necessário denunciar que, mesmo com os ataques sofridos todos os dias, o SUS ainda é o patrimônio do povo brasileiro
Manoela Lorenzi no Brasil de Fato (publicado em 03/01/2012)
Aprovada em 2000, a Emenda Constitucional nº 29 passa a assegurar os recursos mínimos para o financiamento das ações e serviços públicos de saúde. O texto estabelece que a união, a partir de 2001, deve aplicar o valor apurado no exercício anterior corrigido pela variação nominal do Produto Interno Bruto (PIB). Os estados têm por obrigação aplicar 12% do produto da arrecadação dos impostos, e os municípios 15%. Os estados e municípios deveriam atingir estes patamares gradualmente.
Segundo a Emenda 29, as normas de cálculo deveriam ser reavaliadas e regulamentadas por meio de Lei Complementar a cada cinco anos. A lei também deveria estabelecer quais são as ações e serviços que podem ser contabilizados como gastos em saúde para que não sejam feitos desvios para outras áreas.
Desde então, esta regulamentação é bandeira constante dos militantes em defesa do Sistema Único de Saúde (SUS) e da chamada Reforma Sanitária, que alegam que seriam necessários pelo menos 10% do PIB para que o acesso à saúde fosse de fato universalizado como garante a Constituição Federal de 1988.
No dia 21 de setembro, a Câmara dos Deputados aprovou um dos textos que tramitam no Congresso Nacional e que tem por objetivo regulamentar a Emenda constitucional número 29. O PLP 306/2008 de autoria do então Senador Tião Viana (PT/AC) já havia sido aprovado em 2008 por unanimidade no Senado. O texto propunha elevar os gastos em saúde da União para 10%.
Na Câmara, caíram os 10%. Restituiu-se a fórmula em que a União deve destinar à saúde o montante do ano anterior, acrescido da inflação e da variação do PIB. Outras duas alterações foram acrescentadas ao texto. Foram retirados os recursos destinados à educação na base de cálculo dos estados e suprimida a criação do imposto para o financiamento da saúde defendido enfaticamente pelo Planalto.
Todos os partidos, com exceção do PT votaram contra a criação de mais um imposto. A Contribuição Social para a Saúde (CSS), nos moldes da extinta CPMF, também incidiria sobre as movimentações financeiras.
Na prática, se aprovada no Senado como está, corre-se o risco dos recursos da saúde de responsabilidade da União continuarem como estão ou ainda sofrerem alguma redução sem atingir um financiamento adequado e que atenda com qualidade as demandas dos usuários do SUS.
O Senado pode ainda resgatar os 10% do projeto original, garantindo um adicional de aproximadamente 32 bilhões de reais, ou engavetá-lo como vem fazendo há vários anos.
O executivo é bastante enfático ao afirmar que não aceitará aumento de despesa que não indique a fonte de recursos. Além da CSS, derrubada em setembro, outros tributos estão em discussão. Um aspecto importante levantado pelos movimentos sociais a ser considerado é a possibilidade de se alocar os recursos oriundos da renda do pré-sal para investimentos na efetivação de direitos sociais, em especial para o financiamento do SUS.
Defensores do SUS público e estatal, centrado na atenção primária, na prevenção e promoção da saúde, frequentemente se veem lado a lado com a indústria farmacêutica, as grandes corporações hospitalares, as Organizações Sociais, a rede privada de sangue, entre outros atores que lucram com a doença da população defendendo mais recursos públicos para a saúde. Isso porque discutir mais recursos para o SUS não deve se limitar nas cifras adicionais garantidas pela Emenda 29.
Entre os dias 30 de novembro e 4 de dezembro será realizada a 14ª Conferência Nacional de Saúde. Novamente o debate estará colocado. Mais uma vez será necessário denunciar que mesmo com os ataques sofridos todos os dias, o SUS ainda é o patrimônio do povo brasileiro.
Manoela Lorenzi é militante do Fórum Popular de Saúde do Paraná (FOPS-PR)
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