Ação questiona constitucionalidade de parte da lei, em vigor desde 2008.
De 28 palestrantes ouvidos, apenas seis foram contrários à lei.
no G1
A maioria dos especialistas, parlamentares e pesquisadores ouvidos pelo Supremo Tribunal Federal sobre a Lei Seca foi favorável à manutenção da regra. Nesta segunda-feira (14), a Corte realizou o segundo e último dia de audiências públicas sobre o tema, e ouviu representantes do governo federal, de associações médicas e de representantes do setor de entretenimento.
As audiências foram realizadas como parte da análise da ação protocolada em 2008, quando a Lei Seca entrou em vigor, e que tenta anular pontos da regra. A previsão do relator do processo, ministro Luiz Fux, é de que o julgamento ocorra no segundo semestre deste ano.
Ao todo, foram ouvidas 28 pessoas, das 30 previstas originalmente. Apenas seis foram contrárias à manutenção da lei, sendo três delas ligadas a associações de bares e restaurantes, incluindo a autora da ação que contesta a constitucionalidade da lei. Entre os defensores, estão órgãos de governo, parlamentares e associações criadas por parentes e amigos de vítimas de acidentes.
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Argumentos
Desde o início, o ministro relator da ação ressaltou que a discussão se daria não sob os aspectos jurídicos do processo. Assim, nos argumentos dados pelos que se opõem à lei figuraram, por exemplo, o de que a punição prevista pela lei não é razoável, ou que a repressão sozinha não é suficiente para reduzir a ocorrência de acidentes causados por motoristas que bebem e dirigem em seguida.
Outro argumento usado foi o de que a reação do organismo ao consumo de álcool varia, e que por isso seria impossível determinar um teor alcoólico mínimo - como faz a lei - que provoque redução na capacidade de dirigir.
"A verificação in loco do oficial de justiça ajuda, mas é muito difícil termos um padrão, e o mundo reconhece isso", afirmou o representante da Federação Brasileira de Hospedagem e Alimentação (FBHA), Alexandre Sampaio de Abreu.
Ele também questiona a crítica a motoristas flagrados em operações de fiscalização e que se recusam a fazer o teste do bafômetro - um dos palestrantes criticou personalidades que já se recusaram a fazer o teste. "Nós temos muitas pessoas que recusam a fazer o teste por não concordarem com o exame. Rotular todos como potencialmente embriagados é um absurdo", argumentou o representante da FBHA.
Alguns dos defensores da lei apelaram para a emoção. Representantes de policiais rodoviários federais, por exemplo, apresentaram fotos de impacto de acidentes de trânsito. Já o coordenador da Lei Seca no Rio de Janeiro, major Marco Andrade, contou com o depoimento de uma cadeirante, vítima de acidente, e hoje agente das operações.
A discussão científica, no entanto, não foi esquecida. Um dos representantes da maioria favorável à lei, o médico e representante da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), Flávio Emir Adura, contestou a ideia de que não é possível determinar o teor alcoólico mínimo que afete a capacidade de condução de um veículo, e foi taxativo. "Não existe alcoolemia segura", afirmou. "O álcool interfere de tal maneira, que condena completamente dirigir sob o efeito do álcool em qualquer concentração", defendeu ele.
Segundo Adura, o álcool reduz a capacidade de percepção da velocidade e dos obstáculos, diminui a visão periférica, prejudica a capacidade de dividir a atenção e aumenta o tempo de reação. "O comportamento do álcool vai para euforia, depressão, agressividade, causa sono, fadiga, estimula até uma tendência autodestrutiva. Como pode uma pessoa dirigir neste estado?", questionou.
Especialista no tema, a professora Vilma Leyton representou o Ministério da Saúde e falou, por exemplo, de dados sobre a redução no número de mortes causadas. Citando os números do estado de São Paulo, ela indicou que o número de colisões relacionadas ao consumo de álcool caiu de 45,5% para 28,6% no período imediatamente posterior à edição da lei.
"Ainda falta muita coisa para a gente fazer, mas estamos começando uma luta que tem que ser feita", disse ela. Perita por mais de 30 anos, Vilma disse que só o endurecimento da fiscalização já é um benefício visível da lei. "A maior vitória que já tivemos até hoje foi que a polícia está na rua e teve a oportunidade de comprar etilômetros. Quando eu era perita, não tinha", afirmou.
Expectativa
Já o representante da Associação Nacional da Defensoria Pública (ANADEP), Renato Campos Devitto, questionou a expectativa criada pela lei, e disse que imperfeições técnicas estão prejudicando as condenações. Para ele, a criminalização da direção embriagada não solucionou o problema, e provocou uma frustração social.
"A Defensoria Pública espera que o julgamento dessa ADI [ação] ajude a construir um modelo de gestão de riscos responsável e pé no chão, que não prometa que com varinha de condão resolveremos um problema tão grave", criticou. Ele também defendeu que uma alternativa seria o endurecimento das medidas administrativas, como multa e restrição do direito de dirigir.
Devitto relembrou decisão recente do Superior Tribunal de Justiça, que decidiu que a comprovação da embriaguez necessária para ações penais só pode ser feita por bafômetro ou exame clínico, mas os motoristas não são obrigados a fazer os dois testes. Isso prejudica a comprovação do teor considerado criminoso pela lei.
"Acreditamos sim que é possível a construção de um tipo penal mais inteligente, que não gere uma hiperexpcetativa de que o direito penal resolverá sozinho o problema do trânsito, porque não irá resolver", argumentou.
Para o ministro Fux, as audiências demonstraram a importância do uso do bafômetro nas operações e da chamada tolerância zero no consumo. "Ficou bastante claro que é absolutamente impossível esse binômio álcool e condução de veículo. Ficou também patente que não há critério seguro de alcoolemia e, em terceiro lugar, que é importantíssimo que o teste de bafômetro deve ser obrigatório sob pena de se cometer uma desobediência porque ele tem caráter preventivo muito importante", afirmou o ministro.
Comentário: Uma lei que visa diminuir os assassinatos no trânsito provocados por sociopatas que dirigem embriagados está sendo questionada no STF por ninguém mais do que a associação que representa os donos de bares, lanchonetes e assemelhados.
Seria patético se não fosse trágico e imoral.
O meio de vida dos caras consiste em vender drogas... No caso, uma droga lícita, mas mesmo assim, uma droga perigosa que causa imensos prejuízos à sociedade.
De qualquer forma, parece que o Supremo está caminhando para uma decisão que interessa à sociedade.
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