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Governo Federal repassou mais de um terço do montante entregue a quadrilha, segundo investigação. Para Ministério Público, falta fiscalização efetiva e controle dos gastos com recursos
Raphael Gomide
O governo federal abasteceu com pelo menos R$ 237 milhões a máfia de OSCIPs “fantasmas” acusada pelos Ministérios Públicos Federal e Estadual do Rio de desviar R$ 700 milhões da Saúde em Duque de Caxias, o iG apurou. Os recursos foram repassados pelo SUS à prefeitura da cidade da Baixada Fluminense, que os gerencia. Para o MPF, porém, cabe ao Ministério da Saúde a fiscalização da aplicação dos recursos repassados.
Levantamento do MPF e do MP do Rio apuraram que um terço do total recebido pelas OSCIPs Associação Marca e IGEPP vieram de repasses federais para a Saúde do município, administrado pelo prefeito José Camilo Zito, réu na ação conjunta de improbidade administrativa, junto com o ex-secretário de Saúde, Danilo Gomes, e o procurador-geral do município, Francisco Rangel.
Nesta quinta-feira, a Polícia Civil fez buscas e apreensões em diversos endereços na cidade e em todo o Estado, inclusive na casa do prefeito Zito.
Como os líderes da quadrilha, o MP aponta Tufi Soares Meres – dono do IGEPP (ou Instituto Informare) e da Salute Social, o grande artífice do esquema e chamado no bando de “o chefe”, –, Rosimar Gomes Bravo e Oliveira e seu marido, Antônio Carlos Oliveira, o Maninho, donos da Associação Marca.
O montante repassado é provavelmente bem maior. Esses dados levantados dizem respeito a apenas o período entre 2009 e 2011, excluindo 2012, que agora se encerra. Nesse período, os volumes de recursos foram aumentando progressivamente.
Para o Ministério Público, "há, assim, inegável interesse federal na demanda, vez que os integrantes do esquema se apropriaram de parcela considerável das verbas do SUS, incluindo-se verbas federais, comprometendo todo o financiamento tripartite da saúde pública caxiense".
Repasses a OSCIPs aumentaram progressivamente desde 2009
Em 2009, foram repassados pela prefeitura às OSCIPs R$ 135,7 milhões, sendo R$ 73,29 milhões verbas federais; em 2010, Caxias entregou às fantasmas R$ 172,8 milhões, dos quais R$ 755,7 milhões eram da União; em 2011, caiu nas contas das OSDCIPs a maior bolada até então: R$ 254 milhões, sendo 88,5 milhões federais.
Pelos dados do MP e o MPF, a Associação Marca receberia, no total, até o fim de 2012, R$ 485,5 milhões, o Instituto Informare (mesma entidade que o IGEPP) R$ 73,4 milhões, e o IGEPP R$ 206,6 milhões, totalizando R$ 765 milhões.
"Empresas de fachada"
Conforme a investigação, essas OSCIPs eram na verdade “empresas de fachada”, como a inicial do MP e do MPF as chama. A investigação concluiu que a “Associação Marca nada mais é que uma empresa privada tendo de OSCIP apenas forma e estatuto para possibilitar contratação diferenciada (com dispensa de licitação) pela administração pública”.
Segundo interceptações telefônicas feitas em outra operação, em Natal-RN – que investigava o mesmo esquema –, a própria Rosimar, conversando com parentes admite que a Marca é “simples empresa travestida de estatudo de OSCIP, se beneficiando de regime diferenciado de licitações e podendo gerir altas cifras de recursos públicos”.
As OSCIPs fantasmas, localizadas todas nos mesmos endereços - meras salas comerciais, sem funcionários -, recebiam recursos de Caxias para supostamente administrar as unidades de saúde do município. O estado, porém, era “caótico”. As notas fiscais são em nome de outras OSCIPs e empresas do mesmo grupo, e o esquema servia apenas para “desviar recursos públicos” para os sócios.
As OSCIPs, de acordo com a legislação, são entidades sem fins lucrativos. No caso de Caxias, porém, os recursos acabavam no bolso dos sócios.
A Justiça suspendeu os contratos e obrigou o município a nomear interventores, supervisionados pelo SUS. O juiz determinou a “suspensão de todo e qualquer repasse de verbas” em favor das OSCIPs, a proibição de Caxias fazer novas terceirizações na saúde em favor de OSCIPs, intimou a prefeitura a depositar em juízo R$ 10,6 milhões e R$ 8,6 milhões.
Na ação, o MP pede ressarcimento ao erário do dinheiro repassado, a inelegibilidade e perda dos direitos políticos dos envolvidos e o impedimento de contratar com o poder público, sanções previstas na lei de improbidade.
O iG enviou e-mail para a Secretaria Municipal de Duque de Caxias, mas não obteve resposta.
Ministério informa que não contrata OSCIPs, só repassa verbas
A reportagem procurou o Ministério da Saúde no fim da tarde desta sexta-feira. A assessoria de comunicação informou que o ministério não é responsável pela contratação das OSCIPs; apenas repassa as verbas para as prefeituras, que as administram e gerenciam.
O Ministério da Saúde informou, ainda, que não analisa notas fiscais de prestação de serviços de empresas terceirizadas por municípios, apenas em auditorias realizadas em casos de suspeitas de fraude, e que o órgão não tinha conhecimento de irregularidades até a deflagração da operação.
A assessoria de comunicação afirmou que, dado o horário em que foi procurada, não foi possível verificar se já houve algum tipo de auditoria em relação aos repasses de R$ 237 milhões a Duque de Caxias e até se, eventualmente, já houve algum ressarcimento.
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