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quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Defensoria tenta reverter decisão de esterilizar mulher com deficiência

O Estado de S. Paulo via blog Saúde Brasil

A Defensoria Pública tenta re­verter uma decisão judicial que determinou a realização de laqueadura em uma mulher de 27 anos, sem filhos, morado­ra de Amparo, no interior pau­lista. A sentença, de 2004, da juíza Daniela Faria Romano, veio após uma ação protetiva do Ministério Público Esta­dual, que levou em considera­ção o perfil socioeconômico e o fato de a mulher sofrer retar­damento mental moderado pa­ra pedir a esterilização. Atual­mente, ela tem namorado fi­xo. E sempre manifestou o de­sejo de, um dia, ser mãe.
Desde que foi alvo da decisão judicial, a mulher se submeteu a um tratamento contraceptivo, tomando injeções e usando um dispositivo intrauterino (DIU) para evitar a gravidez. Foi a for­ma encontrada para evitar a ci­rurgia. O DIU venceu no ano pas­sado e a paciente se recusou a substituí-lo, por temer que seja feita a laqueadura durante o pro­cedimento.
Diante da recusa da paciente em substituir o DIU, a juíza Fa­biola Brito do Amaral, que cuida atualmente do caso, determinou em outubro que fosse cumprida a sentença de 2004. A laqueadu­ra estava prevista para o dia 21 de dezembro, mas a mulher não foi encontrada, porque se escondeu em outra cidade, por temer que a encontrassem e fizessem a cirur­gia que a impediria de se tornar mãe. Uma nova data será marca­da para o procedimento.
Em 2004, não houve recurso e a decisão já transitou em julga­do, dificultando qualquer mano­bra jurídica para contestá-la. Mesmo assim, a Defensoria Pú­blica considerou absurda a sen­tença e apontou que ela contra­ria a Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência, da Or­ganização das Nações Unidas (ONU).
“Ela é capaz segundo a lei e, mesmo que não fosse, os incapa­zes têm direito às escolhas exis­tenciais de suas vidas. A esterili­zação sem critério não encontra fundamento. Na realidade, faz relembrar medidas drásticas de épocas não democráticas. Esteri­lização por pobreza ou por defi­ciência mental moderada não de­ve acontecer. Desrespeita a lei do planejamento familiar”, disse a coordenadora assistente do Núcleo de Direitos Humanos, Daniela Skromov.
A defensora pretende acionar a Justiça em Amparo formalmente, por meio de uma petição, na tentativa de reverter a decisão que, na prática, condenou a mu­lher à esterilidade. “Isso ofende a dignidade da pessoa, ainda mais por ela não ter um filho e manifestar o claro desejo de al­gum dia tê-lo. Ter filho não é pri­vilégio dos normais, senão se par­te para a eugenia.”
No decorrer do processo, a mulher demonstrou angústia, ansiedade e medo de passar pela esterilização, contra a qual se ma­nifestou todas as vezes em que foi questionada pela Justiça. Ain­da em 2004, ela disse que “mais para a frente”, quando arrumas­se um “namorado bom”, preten­dia ter um filho. Também afir­mou que não era “uma cachorra para ser castrada”. Parentes da mulher afirmaram que ela sem­pre teve uma disposição natural para cuidar de crianças.
Justiça. Promotor que respon­de atualmente pelo caso, Rafael Belucci afirmou que precisa sa­ber em que circunstância se deu a decisão na época e que não tinha os detalhes do processo no momento. “Existem novos docu­mentos que foram juntados pela equipe de saúde do município que vão ser analisados para sa­ber da real necessidade da aplica­ão dessa medida.”
O Tribunal de Justiça de São­ Paulo informou que as magistra­das responsáveis pelo caso estão legalmente impedidas de se ma­nifestar, pelo fato de o processo “tratar de interesse de incapaz e de dignidade humana, com trâ­mite em segredo de Justiça”. Se­gundo o TJ, a magistrada que as­sumiu o processo atualmente “está apenas procurando cum­prir a decisão judicial com trânsi­to em julgado referente à prote­ção da incapaz”.

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